terça-feira, 15 de junho de 2010

FELICIDADE POR DECRETO

Profª. Inês Lacerda Araújo


Há um movimento na Câmara dos Deputados em Brasília para aprovar legislação sobre o direito à felicidade como dever do estado.

Ora, nem os filósofos têm uma noção aproximada ou unânime sobre o que seja felicidade, nem se a cada pessoa do mundo for perguntado sobre o que entendem por felicidade daria uma resposta satisfatória para si e para os demais.

Pode-se chegar a algumas definições, nas quais certamente entram os conceitos de bem-estar, de saúde, de realização profissional, seguir uma vocação, gostar daquilo que faz, paz de consciência, estabilidade emocional, sólidos laços de família e de amizade. É provável que incluam a noção de que as alegrias são passageiras e de que a felicidade é duradoura

Nada disso, a meu ver, pode ser garantido por legislação!

O estado provedor vem se transformando em estado arrecadador. Os brasileiros trabalham mais de três meses ao ano apenas para pagar impostos e recebem muito pouco em retorno, como todos sabem.

Imagine a burocracia para fazer funcionar o decreto da felicidade. Quem cuidará disso? Uma secretaria especial da presidência da república? As assembléias estaduais teriam um auditor para medir o grau de felicidade de seus diletos eleitores? Ou quem sabe a felicidade seria monitorada a partir das câmaras de vereadores ou pelas prefeituras, e haveria em cada município um responsável pela felicidade de seus cidadãos.

Cartazes seria espalhados pela cidade, dentro dos ônibus, nos espaços públicos: "Todos têm direito à felicidade"; "A felicidade ao seu alcance"; "Programa 'Cidadão feliz'", e outras sandices do gênero.

Vejamos o que os filósofos dizem. A boa vida, a vida conforme a virtude, o equilíbrio traz felicidade, segundo Aristóteles. Para isso é preciso esforço, hábitos que vêm da educação.

Para Sêneca, basta a tranquilidade da alma, "caminhar numa conduta sempre igual e firme, sem se afastar da calma, sem se exaltar, sem se deprimir".

Sobre a busca da felicidade, diz Sto Agostinho: "Como procurar a vida feliz? Não a alcançarei enquanto não exclamar: 'Basta, ei-la'. Mas onde poderei dizer estas palavras? Como procurar essa felicidade?... Feliz é aquela vida que todos desejam, não há absolutamente ninguém que não a queira? Onde a conheceram para assim a desejarem? Que possuímos tal desejo, é certo. Agora, o modo é que eu não sei. Há uma maneira de ser feliz, quando cada um possui a felicidade em concreto. Mesmo aqueles que não têm a felicidade e nem sua esperança, devem experimentá-la, pois, do contrário não desejariam ser felizes".


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**INÊS LACERDA ARAÚJO, filósofa, autora, entre outros, de Foucault e a crítica do sujeito (Curitiba: Ed. da UFPR, 2008)

3 comentários:

  1. É só no Brasil mesmo que um parlamentar tem uma idéia tão escabrosa quanto essa. Será que vamos pagar impostos sobre o quanto somos felizes. Provavelmente sim, porque aqui pagamos até para respirar.
    Grande abraço

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  2. Olha amigo, realmente dá pano pra manga ficar raciocinando sobre as divagações dos parlamentares. Estava agora mesmo comentando no blog da Mari (indignada com a euforia desmedida que não se estende aos outros setores como ocorre na copa do mundo) que está praticamente em cima da hora de elegermos nossos representantes(sic)e quem se importa??? Isso depois dá uma senhora ressaca... eu vou te contar, se eles se preocupassem em assegurar pelo menos a dignidade da pessoa humana, cantada em verso e prosa no texto constitucional, aí veríamos a felicidade manifesta nos rostos, vidas e atitudes de nossos compatriotas. Beijoca. estava com saudade.

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  3. Sabe o que é? Nossos queridos legisladores não trabalham.. Aí em vez em quando eles lembram que tem que fazer algo.. É nessa hora que saem essas aberrações aí... Ninguém merece hein!
    Na verdade bastava cumprir o que está na nossa Constituição, com certeza nosso povo seria muito mais feliz com educação e saúde de qualidade e segurança pública decente.. Mas nisso ninguém mexe né..
    []s

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