trechos do poema de Fernando Pessoa (Alberto Caeiro)
Ilustração: Pulika |
Um dia que Deus estava a dormir
E o Espírito Santo andava a voar,
Ele foi à caixa dos milagres e roubou três.
Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido.
Com o segundo criou-se eternamente humano e menino.
Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz.
E deixou-o pregado na cruz que há no céu
E serve de modelo às outras.
Depois fugiu para o sol
E desceu pelo primeio raio que apanhou.
Hoje vive na minha aldeia comigo.
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz ao braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedra aos burros,
Rouba a fruta dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas
Que vão em ranchos pelas estradas
Com as bilhas às cabeças
E levanta-lhes as saias
A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as coisas.
Aponta-me todas as coisas que há nas flores,
Mostra-me como as pedras são engraçadas
Quando a gente as tem na mão
E olha devagar para elas (…)
Fernando Pessoa. Obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992, p. 209-210.
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Fonte: Instituto Humanitas Unisinos
Olá Isaac
ResponderExcluirAdoro Fernando Pessoa, e não conhecia esse poema. Tão lindo, como é lindo tudo que ele escreveu.
Abração