Profª. Inês Lacerda Araújo
Não há limite nítido nem um critério razoável para se avaliar as motivações que levaram Breivik à matança generalizada em Oslo e na ilha de Utoya.
Fanatismo fruto de uma ideologia de extrema direita, renascimento da direita nazi-fascista em uma Europa que rejeita imigrantes, em especial africanos e muçulmanos, diagnóstico de insanidade (monstro moral incapaz de empatia) - são alguns dos juízos de avaliação/dignóstico para tentar compreender, mas nunca justificar o ato brutal.
Como é possível que uma sociedade avançada e pacífica, democrática, em que o acesso à educação de qualidade é uma conquista de há muito tempo, tenha produzido esse filhote de Hitler?
Se fosse em país pobre, com baixo índice de desenvolvimento humano, social e econômico, provavelmente essas seriam as justificativas. Não é o caso da Noruega.
Foi por ideologia? Breivik escreveu livremente um compêndio de 1500 páginas, espécie de diário on line insuflando uma revolução da direita contra o marxismo, contra o islamismo, contra os imigrantes, contra os governantes do partido trabalhista, contra a democracia.
Ideologias são formações políticas baseadas em ideias e propostas às quais é preciso aderir e pelas quais é preciso lutar, de alguma maneira, e também propagar. Breivik seguiu todos os passos dessa cartilha. A ironia da situação é que diferentes ideologias podem e devem contrapor-se no cenário democrático. Quer dizer, se não houvesse uma esfera pública com liberdade e que assegura a representatividade, seriam todos prejudicados. Não se pode impedir o livre acesso aos meios para a mobilização política.
O autor dos massacres pode ser incluído no rol de cidadão com direitos? E quando cultivou e propagou uma ideologia predadora, e nenhuma voz se ouviu que o criticasse? Controle e censura, até que ponto são aceitáveis e/ou necessários?
Terrorista loiro em uniforme militar, sem véus ou turbantes... |
Quanto ao renascimento do nazi-facismo na Europa e nos EUA por meio de partidos de direita extremista, sabe-se que Breivik foi filiado a um deles. Portanto, mais um vez, a própria sociedade democrática não tem meios legais de barrar a implantação e o crescimento desses partidos. Cabe informar o eleitor para que, pelo seu voto e opinião, exclua o extremismo, seja de direita ou de esquerda.
E que dizer das análises do advogado do sorridente Breivik? Em declaração para a imprensa, o advogado afirma que após horas de reflexão resolveu aceitar a defesa do criminoso que não demonstra nenhum arrependimento, e até mesmo não estava suficientemente satisfeito com o resultado. Queria mais, as mortes eram "necessárias". É difícil explicar esse tipo de comportamento, afirma o advogado, "ele se considera um combatente, e em guerra é isso mesmo que se faz, mata-se o inimigo". Ele acha que Breivik pode ser considerado louco, "mas ainda é cedo para saber"...
O inimigo no caso foram jovens escolhidos estrategicamente, ilhados e indefesos. A polícia fora mobilizada duas horas antes para atender a explosão no centro de Oslo, demorou para agir, tal o inusitado dos pedidos de socorro. Vestido com uniforme da polícia, o matador tinha farta e devastadora munição, seu objetivo era matar o máximo de jovens para ter a mesma fama de Hitler, disse ele.
Lição 1: fanáticos podem surgir em qualquer tipo de sociedade.
Lição 2: não há como prever seus ataques.
Lição 3: paradoxo da liberdade: se democracias barrarem a livre representação, deixam de ser democráticas. Se não punirem, vigiarem e aumentarem a segurança põem em risco a vida de inocentes, mas perdem enquanto sociedades abertas.
Lição 4: psiquiatrizar o criminoso, diagnosticá-lo como louco e incapaz de julgamento moral não deve servir como parâmetro para julgar, pois desse modo se anula a responsabilidade das "escolhas" cruéis do fanatismo que acabam neutralizadas pela psiquiatria forense.
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* INÊS LACERDA ARAÚJO - filósofa, escritora e doutora em Estudos Linguísticos. É professora aposentada da UFPR e PUCPR.
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