José Augusto de Castro e Costa*
O que impede a vida de se perder é ainda o pulsar no coração do ser humano o sentido da bondade, a crença na possibilidade da construção do bem-estar generalizado, a visão de um mundo melhor, onde da atmosfera respire-se o ar da generosidade, do bom-humor, da receptividade, da justiça e da beleza. Uma luz viva, através da audição, cintila na consciência com irresistível poder de atração. É uma das principais artes – a música!
Executada em coletividade ou de maneira solo a música abriga-se em todas as culturas, possuindo a capacidade de ilustrar, por sonoplastia, as reações dos seres vivos em seus respectivos ambientes.
Há os conjuntos musicais dançantes (foto), as orquestras de câmara, orquestras sinfônicas, orquestras filarmônicas, orquestras de pau-e-corda e diversas outras organizações musicais. A foto acima é de um dos primeiros conjuntos musicais do Acre, exatamente o grupo que fez uma serenata por algumas ruas de Rio Branco, que ficou conhecida como “seresta de piano”, que contou, inclusive, com a participação do clarinetista Sandoval, com toda sua erudição, sisudez e circunspecção.
A propósito, julga-se oportuno lembrar a diferença entre orquestra sinfônica e orquestra filarmônica, de vez que é normal que muita gente não recorde. A orquestra que é subsidiada por empresas públicas e/ou privadas é denominada de sinfônica, enquanto que a filarmônica subsiste da filantropia, como sugere sua raiz etimológica.
A música é a manifestação artística produzida pelo ser humano e guarda grande afinidade com a profissão militar, surgindo daí, a Banda de Música. São as Bandas de Música que, indubitavelmente, elevam o moral e o ânimo das pessoas e, por que não dizer, dos seres vivos.
Desde os primórdios de nossa existência experimenta-se a empolgação advinda das Bandas de Música, as quais estendem-se, mais tarde, nas atividades escolares, nas paradas cívicas, no cotidiano da cidade, presente na maioria dos eventos – retretas, competições esportivas, procissões religiosas, quermesses, cortejos fúnebres...
A Banda de Música da antiga Guarda Territorial já foi considerada, proporcionalmente, uma das melhores do Brasil, no gênero. Era formada por componentes possuidores do dom musical, a exemplo do que ocorreu no início da década de 50, com a inclusão de remanescentes do conjunto musical do exímio e respeitável Maestro Neves, vindo de Belém e desfeito em Rio Branco, tais como Vitor e Sandoval, mestres dos metais de palhetas, entre outros que vieram juntar-se aos então sargentos Horácio, Roldão, Xolada, Souza, Zuza, Deca, Zé Paulo, Edmundo, Cleomenes, etc.etc.
Eram artistas que, além de dominarem as partituras, improvisavam variações musicais que enlevavam o espírito, sobretudo quando regidos pelos não menos excelentes Tenentes Zeca Torres e Belarmino.
Mas estas características que destacavam-se como maravilhas da Banda de Música de Rio Branco, só poderiam ter sido garimpadas (como joias) e agrupadas, por alguém de soberba sensibilidade musical e elevado espírito de dedicação ao trabalho.
Trata-se do Capitão Pedro Vasconcelos Filho, carinhosamente conhecido como Capitão Pedroca. Ressalte-se que além da música, o Capitão Pedroca foi um exemplar profissional, destacando-se honrosamente em várias frentes de trabalho, literalmente. Isto porque, sob seu encargo foram construídos e concluídos “campos de aviação” nos principais municípios, além de Comandante da Força Pública em Cruzeiro do Sul, Xapurí e Brasiléia. Com efeito, lê-se o texto de um telegrama, datado de 20.10.40, redigido de próprio punho pelo Governador do Território do Acre de então, Epaminondas Martins, recomendando ao Capitão Pedroca que “avião estah partindo para ahi ignorando se pista em condições permitam aterrizar PT Esteja no campo momento chegada para qualquer advertência seja necessária PT Sauds PT Epaminondas Martins – Governador”. Quando responsável pela Segurança Pública de Brasiléia recebeu, entre outros, telegramas aflitos, como o textualmente a seguir: “...elementos partido trabalhista queixam este juízo de que em Brasileia bandos criminosos prestigiados policia infestam cidade espalhando terror et ameaçando eleitorado vésperas pleito com propósito embaraçar exercício do voto. Convicto verdade eleitoral et preocupação governo solicito urgentes providencias contra semelhante atentado liberdades democráticas. CDS SDS (a) Rafael Gondim Juiz Eleitoral 2ª Zona Xapuri PT JUSACRE”.
Não obstante seus mais variados afazeres, Capitão Pedroca sempre encontrava tempo para levar a efeito o exercício da música. Consta que já nos idos de 1916, quando o Acre ainda vivia o período das Prefeituras Departamentais, o nosso bravo comandante, à frente da Companhia Regional da Força de Defesa das Fronteiras, no Departamento do Alto Acre, criava a benfazeja Banda de Música.
Muitos de seus pupilos e mesmo os laicos, o público em geral há alguns anos, tinham a atenção voltada ao noticiário oficial da Rádio Difusora Acreana, atraídos por um dobrado que antecedia a voz marcante do não menos saudoso locutor Índio do Brasil. O dobrado, intitulado Canção do Soldado Acreano era uma contagiante e bonita composição do Capitão Pedro Vasconcelos Filho, o nosso querido Capitão Pedroca.
Potiguar de Ceará-Mirim, esse bravo brasileiro, órfão de pai e mãe, chegou ao Acre no vigor de seus 19 anos de idade, já possuidor dos conhecimentos musicais e domínio dos instrumentos, tanto os de bocais quanto os de palhetas. Crises existenciais levaram-no, não propriamente ao Acre, mas para distante de Ceará-Mirim. O perfume característico exalado das seringueiras (árvores) e a magia inebriante das águas do então rio Acre, alicerçaram-no, ao lado de d. Luciola, em rincões acreanos, propiciando-nos desfrutar da simpatia de sua prole, nas pessoas de Zé Pedroca, Maria José, Dalva, Pedrito e as irresistíveis gêmeas Maria Augusta e Maria Dirce. À ausência de Zé Pedroca, todos ainda nos brindam, pessoalmente, a memória por seus destaques indeléveis, quando ainda residiam no Acre, ressaltando-se Dalva, então Primeira Dama do Território e promotora de eventos culturais e Pedrito, excelente e seguro arqueiro da meta do Rio Branco Futebol Clube e da Seleção Acreana, que certamente faria inveja a qualquer Diego Cavagllieri. Maria Augusta e Maria Dirce, irreverentes, por serem gêmeas continuam a esbanjar simpatias e prestimosidades em dose dupla.
Teria o valor diminuído a referência à Banda de Música do Acre, sem fazer-se citação à eficiência, dedicação e esforço envidados pelo eminente Capitão Pedro Vasconcelos Filho, em fazer da nossa Banda de Música, um dos orgulhos do povo acreano.
Sabe-se que alguns seres humanos consagram suas existências ao bem, à luta a favor da nobreza e do sonho de um tempo menos infeliz para a civilização. Capitão Pedroca, ou respeitosamente, Capitão Pedro Vasconcelos Filho, em meio a uma vida de provações – de derrotas e vitórias, faz parte dessa linhagem de homens que dedicam o melhor de si à vida. Seu itinerário existencial e seu trabalho são um testemunho vívido desse compromisso.
---
*JOSÉ AUGUSTO DE CASTRO E COSTA é poeta e cronista acreano.
Sr. Isaac,
ResponderExcluirAgradecemos e nos sentimos lisonjeados pela homenagem prestada pelo sr. José Augusto e postada no seu blog, sobre a memória de nosso pai Capitão Pedro Vasconcelos.
Ele amava muito o território do Acre e muito trabalhou por esta terra.
Agradecemos,
Maria Augusta e Maria Dirce de Vasconcelos