quarta-feira, 4 de julho de 2012

A CULTURA DE UMA "MORAL" DA EGOLATRIA

PROFª. INÊS LACERDA ARAÚJO


Nossa época vê surgir um novo tipo de personalidade que pode ser analisado de um ponto de vista moral. E de que ponto de vista moral? Sugerimos um contraste com uma moral que propõe uma vida virtuosa no sentido do cultivo de hábitos moderados, como a ética de Aristóteles.

O que um executivo, um profissional hoje em geral cultiva, aprecia e valoriza?

Ele precisa ser empreendedor, seu corpo é seu ego, o estilo de vida depende de mostrar-se, construir um eu e fazer sua vida girar em torno desse ego, bastante inflado. O corpo precisa de músculos, vestir-se requer marcas, conviver exige espaços de prazer imediato, como bares e restaurantes da moda, shoppings e todo e qualquer lugar onde ele possa exibir suas conquistas. Pode ser um automóvel ou um objeto da mais recente tecnologia.

O respeito, o cuidado com relação aos outros, a bela e boa vida interior são deixados de lado. Coisa de fracos ou inferiores.

O ególatra aprecia e tem como objetivos apenas o que pode ser medido, calculado, ranqueado. Escalar degraus na empresa, sucesso profissional, viajar para mostrar para onde foi, aliás, mostrar-se é imperativo. E como é fácil, mil fotos, filmes, eu fiz isso ou aquilo, o menor gesto ou atitude é sempre o de uma conquista de si que é exposta diariamente nas redes sociais. Sua vida gira em torno de si mesmo, a "moral" da egolatria. Valores são todos os que levam ao crescimento ou engrandecimento de si mesmo. Foi publicado recentemente um livro chamado, pasmem, "A anatomia da liderança ética" (sic), auto-ajuda para ter sucesso.

Para que modéstia ou moderação? Para que sinceridade ou autenticidade? Para que desprendimento ou altruísmo?

Essas e outras capacidades como a coragem moral, a justa indignação, a busca da calma e da paz interior, não servem ao ególatra.

Ao passo que contar vantagem, a gabolice, as bravatas, vencer a qualquer preço, isso lhe serve. Por vezes precisa ser subserviente, ele curva a espinha se precisar. O que pode levar ao despeito, ao vazio, sempre insatisfeito, talvez mesmo infeliz.

Entretanto, é possível ser bem-sucedido no trabalho, ser uma boa pessoa na vida familiar, cultivar amizades e atingir certa plenitude e satisfação, mesmo em meios competitivos.

É uma questão de estilo de vida, de escolha de valores, de reflexão e moderação. Buscar o que é justo. Uma vida plena não pode ser medida, ela não cabe em escalas ou rankings.


* INÊS LACERDA ARAÚJO - filósofa, escritora e professora aposentada da UFPR e PUCPR.

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