Com o assassinato de Plácido de Castro, a intranquilidade assolara de vez as plagas acreanas, sobressaltando a todos, ante o regime de violências, com o fim de instigar os seringueiros contra os patrões.
Nessa política de conturbação generalizada,
os gerentes de seringais não tinham, naturalmente sobre o seu pessoal, a mesma
ascendência que o dono, o que propiciava a rebeldia de ambiciosos “aviados”,
pequenos comerciantes, que dispunham de muitos seringueiros, com quem
trabalhavam por conta própria, supridos pelo barracão de que eram fregueses, e
em parte locatários.
Em francas e constantes desavenças, alguns
seringueiros (capangas), instigados, escondidos atrás de “sapopemas” de enormes
samaúmas, emboscavam, fatalmente, os gerentes ou donos de seringais.
Havia fase em que o sentimento de segurança e
tranquilidade consolidava-se e parecia permanecer por algum tempo, porém, logo
o sintoma da desestabilização manifestava-se, levando autoridades a abandonar
seus postos, a exemplo do Juiz de Direito, Dr. João Rodrigues do Lago e, a
seguir, o Juiz Preparador, Dr. Silvio Gentil de Lima, que, igualmente ameaçado
de morte, também tivera que desertar, indo relatar minuciosamente os fatos ao
Presidente da República, Nilo Peçanha.
Dizem que em face de tanta coação, passara a
reinar no Acre a “paz de Varsóvia”.
Era sob essa opressão psicológica e física que se encontrava a terra acreana. A
própria história do assassínio de Plácido de Castro era contada em segredo.
Quando se esperava um desafogo geral com o
advento de um novo Prefeito, eis que agravava-se ainda mais a situação, com a
medida de algum militar, quando entendia de revigorar o regime de violência,
provocando o renascimento de discórdias entre prefeito e militares e
seringueiros e autonomistas. Era de se supor que o procedimento do grupo
autonomista do Alto Acre, não secundando o movimento verificado nos outros dois
Departamentos, tranquilizasse as autoridades federais, quanto à manutenção ali
da ordem pública. Parece, entretanto, que essa atitude incrementara as
desconfianças e temores dos agentes do governo em todos os Departamentos
acreanos, onde a turbulência política era uma constante, e generalizada era a
discórdia.
Os militares reforçavam as medidas de
precaução na defesa de sua Companhia Regional. Mais receoso e menos controlado,
o Prefeito passava a hostilizar os principais elementos autonomistas, afastando
dos cargos administrativos os poucos que os ocupavam, e cercando-se do grupo de
adventícios, intrigantes e bajuladores, que iludiam a confiança e exploravam os
favores de todos os prefeitos.
Segue-se nesse impasse até 1920, quando, pelo
Decreto nº 14.383, de 1º de outubro, o governo federal unificou a administração
do território, o qual passou a ser dirigido por um Governador, tendo sido
nomeado para exercer a elevada função, o médico Epaminondas Jácome, militante
ativo em prol da autonomia desde 1909, e membro do Clube Político “24 de Janeiro”,
presidido pelo coronel Antonio Antunes Alencar, um remanescente revolucionário.
Ao Governador Epaminondas Jácome competiu
organizar a estrutura administrativa do território, no período de 1920 a 1923,
cabendo aos seus dois sucessores apenas, ao que se sabe, custodiar os recursos
financeiros.
O quarto governador do Acre, porém, o
advogado Hugo Ribeiro Carneiro, firmou sua capacidade administrativa, ao concretizar,
no período de 1927 a 1930, as primeiras edificações em alvenaria, tais como o
atual Palácio Rio Branco, sede do governo, o Mercado Municipal, os três
pavilhões do atual Quartel da Polícia Militar, a instalação da primeira agência
do Banco do Brasil no Acre, a construção da primeira Maternidade em Xapurí,
além de ativar o exercício da Instrução Pública, instituindo, no “curriculum”
escolar, a aplicação de disciplinas relacionadas às atividades cívicas,
artísticas e conhecimentos gerais, impondo, como costumava dizer, o uso do
“uniforme que pôs termo aos excessos e inconvenientes da moda no Acre”.
Depois de vivenciar as crises diplomáticas e
políticas, vira-se o Acre envolvido com a crise constitucional, quando a
Constituição Brasileira de 16.7.1934, preceituara em seu artigo 16, §
1º, que “logo que tiver 300.000 habitantes e recursos suficientes para a
manutenção dos serviços públicos, o território poderá ser, por lei especial,
erigido em Estado”, e em seu §3º, do mesmo artigo, “o território do Acre será
organizado sob o regime de Prefeituras autônomas, mantida, porém, a unidade
administrativa territorial, por intermédio de um delegado da União, sendo
prévia e equitativamente distribuídas as verbas destinadas à administração
local e geral”.
Fora porém o décimo primeiro governador, José Guiomard dos Santos, quem
dera ao Acre, de 1946 a 1950, os méritos almejados por aqueles que lutaram pela
terra que aprenderam a amar, transmitindo-lhes um sonhado sentimento de
segurança e tranquilidade.
Mineiro de Perdigão, era o Major Guiomard
dotado de certa experiência, adquirida no período de 1940 a 1943, quando
exercera o cargo de Governador do Território Federal de Ponta Porã.
No Acre, o governador Guiomard dera ênfase à
sua administração, promovendo a modernidade do Território, ao pavimentar suas
ruas, utilizando tijolos, em vista da completa ausência de pedras no solo
acreano. Para facilitar suas visitas aos demais municípios, em número de seis,
além da capital, foram adquiridas sete lanchas modernas, com acomodações para
seis passageiros, em três camarotes com beliches, distinguindo, cada uma, com a
denominação da respectiva sede: Rio Branco, Xapurí, Brasiléia, Sena Madureira,
Feijó, Tarauacá e Cruzeiro do Sul.
Eram destaques do governo a conclusão de
obras até então inacabadas, como escolas públicas e hospitais, e a implantação
das primeiras monoculturas, levadas a efeito em locais devidamente inaugurados,
na capital acreana, para os respectivos fins, como a Fazenda Sobral, a Estação
Experimental e o Aviário.
Em
junho de 1954, o então Deputado José Guiomard dos Santos, líder do PSD acreano,
apresentara à Câmara dos Deputados o projeto destinado a elevar o Território do
Acre à categoria de Estado, pleito que se tornou uma constante até sua
concretização, oito anos depois.
Por essa época, no Acre, destacavam-se dois
partidos: O PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), liderado pelo Deputado
General Oscar Passos e o PSD (Partido Social Democrático), comandado pelo Deputado
General José Guiomard dos Santos. Ambos, contemporâneos desde a Academia
Militar, haviam governado o Território do Acre, cabendo ao então Major Oscar
Passos, o nono a ser nomeado, exercer a administração acreana por um curto
período, de 30 de agosto de 1941 a 22 de agosto de 1942.
Em 7 de setembro de 1961, dada a renúncia de
Janio Quadros, assumira a Presidência da República o Vice-Presidente João
Goulart, do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), opositor ao PSD, a que
pertencia o Deputado José Guiomard dos Santos.
Ruy Lino |
Um dos principais pleitos do Governador Ruy
Lino era com vistas ao bem estar social dos funcionários do governo que, desde
os primórdios da administração acreana, não possuíam a menor estabilidade
empregatícia, nem direitos a quaisquer benefícios que os demais funcionários brasileiros
já possuíam, sobretudo após a era Presidente Vargas.
Logo após tomar posse, o governador Ruy Lino,
acompanhado do seu chefe de Gabinete, Geraldo Brasil e do Deputado Oscar Passos,
líder do PTB acreano, apresentou ao Presidente João Goulart a situação reinante
entre os funcionários acreanos, conhecidos como extra-numerários mensalistas,
que além de não possuírem salário fixo, não usufruíam de direitos a férias, nem
a licenças trabalhistas.
Inteirando e sensibilizando o Presidente da
República, o governador Ruy Lino promoveu o enquadramento dos funcionários
públicos do Território do Acre, efetivando-os e garantindo-lhes honrosa
estabilidade, assegurando-lhes todos os direitos oferecidos através do Estatuto
dos Funcionários Públicos Civis da União (Lei 1711, de 28.10.1952),
outorgando-lhes, enfim, dignidade e cidadania, vinculados ao Quadro de Pessoal
do Ministério da Justiça e Negócios Interiores.
Correio da Manhã 25 outubro de 1961 |
Para não fugir às curiosidades do Acre, sua
elevação a estado deu-se, justamente, com o beneplácito do Presidente da
República, membro do partido opositor ao do autor do projeto, demonstrando
respeito ao anseio da maioria dos acreanos. E José Ruy da Silveira Lino, o
último governador fora, em toda a história do Território do Acre, o primeiro e
único governador acreano de nascimento.
Em 15 de junho de 1962, finalmente, era
sancionada a Lei nº 4.070, que elevara Território do Acre à categoria de
Estado, vindo a revelar o brilho “de um astro em nossa bandeira, que foi tinto
no sangue de heróis”.
"Adoremos a estrela altaneira, o mais belo e
o melhor dos faróis”, a guiar o único Estado que é brasileiro por opção.
F
I M
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BRASILEIRO POR OPÇÃO
* José Augusto de Castro e Costa é cronista e poeta acreano. Mora em Brasília e escreve o Blog FELICIDACRE.