Jacques Prévert (1900-1977)
Uma cidade escuta desolada
O canto de um pássaro ferido
É o único gato da cidade
E foi o único gato da cidade
Que o devorou pela metade
E o pássaro deixa de cantar
O gato deixa de ronronar
E de lamber o focinho
E a cidade prepara para o pássaro
Funerais maravilhosos
E o gato que foi convidado
Segue o caixãozinho de palha
Em que deitado está o pássaro morto
Levado por uma menina
Que não para de chorar
Se soubesse que você iria sofrer tanto
Lhe diz o gato
Teria comido ele todinho
E depois teria te dito
Que tinha visto ele voar
Voar até o fim do mundo
Lá onde o longe é tão longe
Que de lá não se volta mais
Você teria sofrido menos
Só tristeza e saudades
É preciso nunca fazer as coisas pela metade.
LE CHAT EL L’OISEAU
Un village écoute désolé
Le chant d’un oiseau blessé
C’est le seul oiseau du village
Et c’est le seul chat du village
Qui l’a à moitié
dévoré
Et l’oiseau cesse de
chanter
Le chat cesse de
ronronner
Et de se lécher le
museau
Et le village fait à l’oiseau
De merveilleuses
funérailles
Et le chat qui est
invité
Marche derrière le petit cercueil de paille
Où l’oiseau mort est allongé
Porté par une petite fille
Qui n’arrête pas de pleurer
Si j’avais su que cela te fasse tant de peine
Lui dit le chat
Je l’aurais mangé tout entier
Et puis je t’aurais
raconté
Que je l’avais vu
s’envoler
S’envoler jusqu’au bout du monde
Là-bas où c’est tellement loin
Que jamais on n’en
revient
Tu aurais eu moins de
chagrin
Simplement de la
tristesse et des regrets
Il ne faut jamais
faire les choses à moitié.
PRÉVERT, Jacques. Poemas. Introdução, seleção e tradução de Silviano Santiago. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. p.24-25
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