terça-feira, 10 de novembro de 2015

Série A Poesia Acreana > RAIMUNDO RODRIGUES

“Raimundo acende a chama da sabedoria e, como tudo na vida, é uma oficina de sonhos.[...] Tenho, inclusive, de chamá-lo de enciclopédia ambulante. [...] Sonetos e outras poesias, é sobretudo, uma lição sobre como se tornar um ser melhor.”
Hermes Elias de Moura



Raimundo Rodrigues (Raimundo Acreano Rodrigues de Albuquerque), nasceu em Tarauacá (AC), no dia 26 de outubro de 1919, e faleceu em São Paulo, no dia 03 de outubro de 2010. Foi professor, jornalista, romancista, poeta, cronista e trovador. Foi verbete na Enciclopédia de Literatura Brasileira, edição MEC, 1990; verbete em Estudos Literários de Autores Goianos, de Mário Ribeiro Martins, 1995; está presente em A Poesia em Goiás, de Gilberto Mendonça Teles; em Estudos da Literatura do Triângulo Mineiro, etc. Idealizou e foi um dos fundadores da Academia de Letras do Triângulo Mineiro, onde ocupou a cadeira 11, cujo patrono é Bernardo Guimarães. Idealizou também a Academia Paulista Maçônica de Letras. Iniciou sua vida literária em Goiás, quando a “Bolsa de Publicações Hugo de Carvalho Ramos” publicou o seu romance “Riachão”, sendo considerado o o iniciador do romance social em Goiás. Têm vários livros publicados entre ficção, poesia, trova e didáticos. Morava em São Paulo desde 1965.


GOTÍCULAS DE AMOR
Raimundo Rodrigues

A poesia desabotoa de mim
como o perfume desabrocha da rosa...

No jardim das musas de minha alma,
o roseiral da poesia se cobre de rosas
brancas, vermelhas e rosas cor-de-rosa.

Há flores e perfumes
e há espinhos também
no jardim da minha poesia.

O sereno da noite estrelada da minha vida
deixa gotículas de amor
nas pétalas olorosas
das rosas
da minha poesia.


TORRÃO NATAL
Raimundo Rodrigues
(Para Tarauacá, a terra onde nasci)

Tudo passa na vida, tudo vai,
as nuvens do céu, as águas do rio,
o dia que nasce, o raio que cai,
a chama da vela, o calor e o frio.

O vento que avança rápido ou lento,
as ondas do mar que morrem na areia,
o amor, a alegria, a dor, o lamento,
o inseto que cai, da aranha na teia.

O urro da fera, a ave que voa,
o pó que o vento levanta no espaço,
o troar do trovão que longe ecoa,
a nostalgia, a tristeza, o cansaço.

A chuva, o sereno, a intempérie, a neve,
o outono, o inverno, a primavera, o estio,
o vagalume que voa tão leve,
o canto, a palavra, o grito, o assovio.

Tudo passa na vida, é tudo um instante,
só não passa a saudade, esta não corre,
de quem longe está da pátria distante,
oh! esta saudade, eu juro, não morre!


MARIA
Raimundo Rodrigues

Que divinal prazer eu sinto, quando,
Ao morrer melancólico do dia,
Escuto o bimbalhar suave e brando
De um sino que soluça – Ave Maria!

E a noite desce, e o céu se iluminando
Com brinquinhos de ouro – quanta magia –
Tenho a impressão, o céu, assim fitando,
De estar fitando o manto de Maria.

Meu coração, alegre, se levanta,
Ante tanta beleza e força tanta,
Fico estático, então, pensando nela...

Enquanto o pensamento ao céu subindo,
Entre as constelações do céu fulgindo,
U´a prece leva à Mãe de Deus, tão bela!


PARAÚNA
Raimundo Rodrigues

Nos contrafortes de uma linda serra,
Por onde a brisa, sussurrante, passa,
Ergue-se, majestosa, a minha terra,
Tão cheia de belezas e de graça.

Se pelo azul do céu, a lua erra,
E a sua luz a minha terra abraça,
Um panorama divinal encerra,
Dignificando um povo e uma raça.

Esta cidade que em meu peito mora,
De lindas moças, de crianças lindas,
É grande, hoje, como foi outrora...

Pois o seu povo sabe, com ternura,
Que sua honra e sua glória infindas
Escudam-se no amor pela cultura.


POR QUÊ?
Raimundo Rodrigues

Juquinha,
aquele garotinho,
magrinho,
fraquinho,
Que catava papel velho
nos sacos de lixo,
                        morreu...
                                   tão magrinho...
                        tão fraquinho...

O céu escuro
parece uma mortalha,
amortalha a noite.
O vento é um açoite.

A chuva, renitente, dá tapas na vidraça,
e lá fora, na rua lamacenta,
o nevoeiro tudo embaça.

Poucas pessoas velam o corpo da criança:
término de um martírio,
fim de uma esperança.

Lá fora, o nevoeiro tudo embaça,
parece que a noite se arrebenta
e que seu coração se despedaça.

E os pingos de chuva, renitentes,
Continuam dando tapas na vidraça.


AO CAIR DA NOITE
Raimundo Rodrigues

Passa tranquila a tarde, em seu andar constante
Ao esmorecer da luz, vendo o morrer do dia,
Enquanto o sol poente, ao longe, bem distante,
De cores enche o céu, que os olhos extasia.

E, aos poucos, lá em cima, um brilho coruscante...
Gotículas de fogo, em mágica porfia,
Surgindo aqui, ali, ao norte, no levante,
Vão pintalgando o azul de encanto e de magia.

Logo, um clarão mais forte, ao longe se insinua...
Num esfuziar de luz, eis que aparece a lua
Atrás da serrania, em doce claridade.

E ouve-se, além da serra, um doloroso canto,
Tão magoado e triste, envolto em tal encanto,
Que deve ser o sol, chorando de saudade.


SUPREMO AMOR
Raimundo Rodrigues
(Para Lazinha)

Este soneto que escrevo agora,
Ouvindo o coração, tranquilamente,
É para dizer-te, amor, que te adoro,
E que te adorarei eternamente.

Quando te zangas, eu me desarvoro,
Quando me falas terna e suavemente,
As tuas lindas frases eu decoro
Guardando-as, com carinho, em minha mente.

És, para mim, a estrofe cristalina,
Vazada em versos da mais pura rima,
Fazendo da poesia um primor...

É, para mim, a vida, a alegria,
A beleza, a candura, a harmonia,
Tu és, enfim, o meu supremo amor.


TROVAS
Raimundo Rodrigues


Um carro-de-bois gemendo
nos longes do meu sertão,
é um lamento entretendo
o meu velho coração.


A saudade é a lembrança
de coisa distante, ausente,
é um gemer de criança
dentro do peito da gente.


O trovador é um artista
que faz trovas com primor,
romântico ou realista,
é mensageiro do amor.


Enquanto a felicidade
é coisinha passageira,
a malvada da saudade
nos aflige a vida inteira.


Se não houvesse saudade,
Ou se a saudade acabasse,
Talvez que a humanidade
Só de saudade chorasse.


Ela sorriu, eu sorri,
Olhei-a, ela me olhou,
Dobrou a esquina, na frente,
Só a saudade ficou.


Teus lábios são assassinos,
Posso afirmá-lo, bem sei,
Pois comecei a morrer,
Quando tua boca beijei.


ROGRIGUES, Raimundo. Sonetos e outras poesias. São Paulo, 2009.
RODRIGUES, Raimundo. Trovas do ontem e do hoje. São Paulo: s/d.

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