Homenagem póstuma a
dois grandes amigos de minha família: o Delegado Dr. Manoel Ribeiro (Sargento da
Guarda do ex-Território Federal do Acre). Ele foi esposo da Jornalista Maria
Otacília Ribeiro;
E ao funcionário
público, muito querido por todos conhecidíssimo como (vulgo), ‘Gato’, por estar
sempre de bom humor.
Foi caminhando
pelas inesquecíveis e belas praias às margens do rio Tarauacá, recolhendo com
uma latinha de banha vazia, ‘piabinhas’ (depois bem fritinhas, crocantes e
farofa bem quentinha era só saborear), que eram jogadas nas areias pelo
banzeiro das águas, que eu comecei a me interessar pela pescaria.
Tarauacá era uma
cidade pequena e quase todos se conheciam. O Prefeito Municipal era o Sr.
Arnaldo Farias.
Eu era um menino,
ativo. Gostava de participar das peladas de futebol mirim; soltar pipa (o mesmo
que papagaio de linha) e de me aventurar, nas pescarias realizadas nos açudes e
poções próximos de casa; mais à frente já adolescente, também em igarapés e até
de canoa no rio Acre.
Já nesse novo
período, eu pescava com, além de caniço, de espinhel e de tarrafa.
Mas, foi na cidade
de Tarauacá em 1953/4, em companhia de um amigo da família, que eu participei
pela primeira vez de uma pescaria.
Nesse dia, essa
atividade foi realizada só com ‘boias’, por ser o ambiente, um ‘lago’ (sem correnteza),
lugar propício para esse tipo de pescaria por possuir águas paradas.
Boia = Equipamento
de pesca para ser usado em águas paradas (sem correntezas). Objeto de plástico,
madeira ou cortiça (que flutua na água) atado a uma linha de pescar para evitar
que o anzol desça ao fundo do leito.
Na época, a
referida grande extensão de água, pertencia aos ‘Higino’, família tradicional
de Tarauacá.
Por ser ainda um
menino, fazia só companhias aos adultos (meus parentes). Ia apenas como passeio
e divertimento.
Porém, de dentro da
canoa, eu ajudava a jogar o material de pesca (as boias) na água.
Enquanto isso, o
meu parceiro de pescaria (já adulto), direcionava no remo a leve embarcação,
aos pontos das boias.
Se fisgava muitas
arraias. Mas Ele devolvia-as à água, quando elas ainda estavam com vida, sem
levar ferroadas.
Nesse mesmo lago,
os profissionais locais de pesca com arpões, capturavam os fortes Pirarucus.
Era uma luta
colossal e feroz, entre o homem e o animal pela sua sobrevivência. Um momento
fantástico.
Mas foi,
aproximadamente, de 12 aos 13 anos de idade já em Rio Branco, o tempo em que eu
mais participei de pescarias em minha vida.
Minha predileção
era o igarapé São Francisco. Meu ponto fixo era bem próximo ao quartel do
Exército (antiga 4ª Cia de Fronteira); não me afastava muito (não saia dalí).
Tinha um pouco de
medo, do que pudesse me acontecer.
Falavam vários
boatos (disse me disse de boca em boca), sobre visagem (fantasma ou
assombração), cobra grande ou mapinguari.
Às vezes, eu ia
sozinho mesmo, sem autorização, às escondidas de minha mãe e também de meu pai.
Mas, na maioria das
vezes, eu ia sempre acompanhado em conjunto com outros amigos, especialmente,
quando era de espinhel, tarrafa ou à noitinha nas águas das olarias em busca de
traíras.
Gostava de levar
comigo para me alimentar, uma boa farofa de carne seca (a famosa e gostosa jabá
ou charque); aipim cozido (macaxeira); bananas e água.
Meu pai, não era de
acordo com esse meu hobby e muitas vezes me proibia de pescar.
Ele era rígido em
alguns pontos. Não permitia ler muitos gibis, jogar futebol e por precaução de
segurança nem pescar. Mas, às vezes, eu desobedecia essa regra citada.
A maioria das
minhas pescarias foram realizadas quando ele (meu pai) estava fora de Rio
Branco; ele convivia mais em Tarauacá, cuidando dos seus negócios particulares.
Eu sempre trazia
pescados de minhas pescarias. Gostava de um Cará (Acará) na farofa ou um cozido
de mandi.
Impressionante é
que, em minha rua, moravam os dois maiores pescadores do bairro: O Gato
(funcionário público), gente boa, e o seu parceiro de pescaria, o Sargento Dr.
Manoel Ribeiro (militar) da antiga Guarda do ex-Território do Acre.
Os dois sempre
estavam juntos nas pescarias; uma dupla que ficou famosa nas redondezas, por
trazer sempre no retorno das pescarias muitos peixes.
A dupla de
pescadores mantinha segredos sobre o local de suas façanhas no caniço.
Todos queriam saber
o local de tanto pescados em abundância. Eu me incluía (era um), entre os
curiosos, doido para descobrir o lugar da piracema.
O Dr. Manoel
Ribeiro, era um dos nossos vizinhos (ao lado da casa de minha família).
Era amigo da
família desde o tempo de Tarauacá, e ex-colega de meu pai da primeira turma da
faculdade de Direito; o Gato era conhecido dos meus pais e também morava perto
de nossa residência, uns 100 metros de distância.
Meu maior desejo
era um dia conseguir ir pescar com essa famosa dupla de pescaria.
Às vezes, sonhava
pescando com eles. Porém, como realizar essa proeza, pois era apenas um menino.
Eu sabia que o meu
pai, gostava muito de pescados; ele adorava esse tipo de alimentação. Pirarucu,
Tambaqui, Pacu, Dourado, piau, mandi, traíra e também aqueles peixes secos que
eram vendidos no mercado Municipal e mercearias adjacentes. (Diziam até, que se
comessem muitos deles, morriam de uma enfermidade incurável).
Num belo dia ele (o
meu pai), chegou de Tarauacá de surpresa em casa, e encontrou na cozinha de
casa uma bacia cheia de peixes e foi logo exclamando!
[Meu pai] – Que
maravilha! Quantos peixes!...
[Minha mãe] – Foi o
Gilberto que pescou!
[Meu pai] – Foi,
hein?
[Minha mãe] – Foi!
Mas não vai brigar com o menino, ok?
[Meu pai] – claro
que não! Ele é um bom pescador! Hummm!...
A partir dessa
pescaria, meu pai não se importou mais, deixando de me proibir de pescar.
Dissera que eu já estava grandinho.
Ele, tomando
conhecimento do meu desejo, de querer um dia, pescar com essa dupla de
pescarias famosas, meu pai, resolvera falar com o Dr. Manoel, solicitando ao
amigo que um dia me levasse, “era o meu desejo de acompanhá-los numa pescaria”,
disse o meu pai para ele.
Prontamente o Dr.
Manoel Ribeiro atendeu o pedido do amigo (meu pai), e marcou que, já na próxima
pescaria eu iria com eles.
Eu fiquei feliz da
vida e me preparei do jeito como eles iam (no vestuário) à pescaria.
No dia marcado,
cedinho, antes do dia clarear, lá estava eu já pronto para partir: caniço (vara
de pescar) na mão; uma bolsa de pano à tira colo com uma lata cheia de farofa
de carne seca (a famoso jabá), bananas, água e o samburá (o cesto para colocar
os pescados).
Ficamos aguardando
o Gato aparecer.
Quando ele chegou
foi logo perguntando!
[Gato] – O que o
menino faz aqui tão cedo?
[Dr. Ribeiro] – Ele
vai conosco!
[Gato] – Conosco?
[Dr. Ribeiro] –
Sim, é filho do nosso amigo e vizinho, o Professor Levy Saavedra!
O Gato ficou com
uma cara (de pouco amigo) de quem não gostou da ideia de levar um garoto para
um lugar hostil, mas acatou (acabou concordando), essa situação inusitada, de
levar com eles, um moleque para suas cobiçadas pescarias.
Partimos para o
igarapé São Francisco. Foi um estirão longo.
Depois de mais de
duas horas de caminhada e igarapé (adentro), finalmente, chegamos aos primeiros
locais da famosa pescaria.
Eles sabiam de tudo
em relação à pesca: a melhor hora de se pescar; uma boa isca; e um bom ponto de
fisgar mais peixes.
O lugar era
inóspito; um local impróprio para um menino; muita lama (barranco escorregadio),
mata cerrada e muitos mosquitos.
Mas fui bem
protegido usando um vestuário igual ao da dupla: camisa de mangas compridas,
calça e chapéu de palha.
A pescaria ia bem.
Eu sempre ficava um pouco próximo de um dos dois. Almoçamos e tiramos uns
minutos para o descanso.
Já, lá pela
tardinha, depois de muitos deslocamentos (de vez em quando), em busca de
pescados; uma trajetória de mais de um quilômetro, andando e sentando na beira
do igarapé (eu já sentia uma exaustão), finalmente, o momento do retorno, com
um excelente resultado de pescados, de mais uma boa pescaria, principalmente,
de piaus e mandis, onde todos estavam satisfeitos.
Mas, antes da gente
ir embora, do outro lado da margem do igarapé, o inesperado!
Um vulto começou a
se mexer entre as folhagens, bem em frente de minha direção.
De repente, ‘meu
Senhor’, sai de dentro das moitas (do mato), silenciosamente, uma baita de uma
onça-pintada para beber água; o animal fica de frente para mim, mas não percebe
a minha presença, pois estou no meio das folhagens.
Eu fiquei com tanto
medo, (com um cagaço) que não mexia nem um olho; fiquei imóvel, mas em minhas
mãos o caniço, tremia mais do que vara verde.
A fera começou a se
deslocar de barranco abaixo em direção ao igarapé para saciar sua sede.
O Dr. Ribeiro
estava um pouco mais afastado, por isso não notou o momento da chegada do
animal; o Gato bem mais próximo de mim, já tinha também percebido (como eu) à
distância, o selvagem quadrúpede.
O animal começou a
beber à água e eu me tremendo ainda mais.
De repente, ‘seu
menino’, o Gato (o homem pescador), no intuito de assustar (de surpresa) o
animal, deu um tremendo grito (um berro), digo um miau ou um esturro como de um
tigre!
A onça também se
assusta! Salta de lado, também esturra forte, e numa velocidade incrível (com
medo), escafedeu-se!
Eu, que estava em
cima de pequenos e finos galhos próximo à água, com o medo que tomei ao ver o
feroz animal, e logo em seguida os gritos do Gato e o forte esturro do bicho,
me desequilibrei dos galhos e caí acidentalmente dentro do igarapé, no mesmo
instante em que o animal fugia.
O Dr. Ribeiro ao
notar eu caindo, correu em minha direção de arma em punho (tinha porte de arma,
ele era militar), para me socorrer, pois nesse tronco do igarapé havia uma
pequena correnteza de águas.
Porquanto, tudo
sanado (já nadava desde os 5 anos de idade), tudo salvo! Mas, eu, todo molhado,
igual a um pinto calçudo. O importante é que não aconteceu nada de grave,
graças ao grito de guerra do amigo Gato.
Porém, ele o Gato,
após o episódio, caiu em gargalhadas.
Eu e o Dr. Ribeiro
também caímos em gargalhadas. O Gato veio rindo (gozando de mim) até chegarmos
a nossa casa.
Depois desse
incidente inusitado, ele o (Gato) sempre que passava em frente de minha casa,
exclamava!
[Gato] – Gilberto
Saavedra! Amanhã tem pescaria novamente. Vamos?
(Eu) – Fui?...nunca
mais! Jamais! Kkkkkkkk!
Depois dessa lição,
me lembrei dos conselhos de meu pai.
Deu preferência no texto ao nome do peixe “MANDI” (mas, também existe o ‘MANDIM’, como nós pronunciamos no Acre) Há os dois nomes de peixes, mas não sei se é somente uma espécie.
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