Caso ocorrido no
Estado do Acre, na cidade de Tarauacá.
Escrita em versos
pelo poeta e compositor José Gomes Fontinele, vulgo Cafuringa.
I
Amigo preste
atenção
A todos quero
contar
Uma história mui
horrível
No Estado do Acre
Que fica neste
lugar
II
No ano de cinquenta
e sete
Cheguei neste lugar
Era soldado da
Guarda
Fui transferido pra
lá
Cheguei até muito
alegre
Sem nada adivinhar
III
Este caso
acontecido
Botou todo horrorizado
Morreram três
filhos da terra
Ficou um
encarcerado
Era o guarda Zé
Pereira
Era filho de outro
estado
IV
O caso que
aconteceu
Foi d Aurélio e
Aldenor
Aurélio tinha um
irmão
Menor e namorador
Se achava em uma
festa
Quando entrou
Aldenor
V
Este irmão de
Aurélio
Era ainda Menor
Mas era muito
valente
Tinha o sangue no
gogó
Entrava em todos os
perigos
Mas de ninguém
tinha dó
VI
A história eu vou
contar
Muitos anos já faz
Tinha um rapazinho
novo
Veio tomar benção a
s/ pais
E não sabia se
vinha
E não voltava nunca
mais
VII
Adauto chamava-se
ele
Com vinte anos de
idade
Vivia sempre
estudando
Não tinha a menor
maldade
Não sabia se caia
Na tamanha
crueldade
VIII
Adauto chegou no
Acre
No meio de seus
parentes
Acompanhado de sua
irmã
Uma menina decente
Não sabia da sorte
Se morria
instantaneamente
IX
Esta história eu
vou contar
Não sou homem
falador
O culpado foi o
Aurélio
E também o Aldenor
Quando chegou no
Salão
O menor ele
empurrou
X
Audenor entrou no
salão
Não soube se
expressar
Todo soldado tem
ordem
Para saber
trabalhar
Com calma se vence
tudo
Não precisa se
afobar
XI
Audenor entrou no
salão
Vinha um pouco zuó
Chegou e empurrou o
menino
Sai pra fora que é
melhor
O menino se alterou
E quis lhe pegar no
gogó
XII
Chegou e empurrou o
menino
Jogou fora do salão
Aurélio que estava
de parte
Vendo aquela
confusão
Foi ajudar o menino
Porque era seu
irmão
XIII
Aurélio não
resolveu nada
No meio da
escuridão
Foi esperar o
Audenor
Distante da
multidão
Não podendo ir a
peito
Fez a mesmo a
traição
XIV
Audenor ia passando
Aurélio se
apresentou
No mei da escuridão
Com uma faca lhe
furou
Viram logo um
alarme
O Aurélio se matou
XV
Furou e depois
correu
Só se via a
confusão
Audenor teve
coragem
Puxou a faca com a
mão
Foram atrás de
Aurélio
Para por na prisão
XVI
Aurélio saiu
correndo
Procurando a se
livrar
Na casa de uma
família
Ele logo pode
entrar
Escondeu-se dentro
do quarto
Pra polícia não
pegar
XVII
Aurélio estava
escondido
Não queria aparecer
A polícia toda
embalada
Pela rua
percorrendo
Estava escondido na
casa
Querendo se
arrepender
XVIII
Aurélio resolveu
logo
Disse aqui não fico
mais
Vou sair
diretamente
Lá pra casa de meus
pais
E lá ninguém vai
atrás
XIX
Chegando a casa do
pai
Ficou logo
escondido
Matar por
preversidade
Um dia vai ser
punido
Até mesmo no
pensamento
Por Deus será
ouvido
XX
O delegado teve
notícia
Que ele estava na
casa do pai
A pobre da mãe de
Aurélio
Já tinha dado um
desmaio
O pai sempre
dizendo
Meu filho daqui não
sai
XXI
O pai do dito
criminoso
Era muito educado
Mesmo naquela
cidade
Tinha sido delegado
Continuava ainda
No posto de
advogado
XXII
Ubaldo se chamava
ele
Tomou outra decisão
Resolveu deixar o
filho
Seguir para a
detenção
Ainda não viu mundo
A rua dos valentão
XXIII
Foi Aurélio pra
cadeia
A polícia corrigiu
Vigiando a noite
toda
Com medo dele fugir
A sorte era esta
Tinha mesmo que
cumprir
XXIV
Ficou a mãe de
Aurélio
Não tinha
consolação
Ficou banhada em
prantos
Que rolava pelo
chão
Vendo seu filho
seguir
Pra casa de
detenção
XXV
Agora deixo o
Aurélio
Vou falar de
Audenor
Sua chegada em Rio
Branco
No dia que viajou
Depois de dois ou
três dias
Sua vida terminou
XXVI
Audenor era um
praça
Cumpridor de seu
dever
Andava sempre
direito
Pra ninguém
aborrecer
Ficou sua mulher
viúva
E os filhos a
sofrer
XXVII
No mesmo jeito se
passa
Com a mulher de
Aurélio
Este também morreu
A casa é o
cemitério
Ela recebe a mesada
Se for mulher de
critério
XXVIII
Audenor além de
tudo
Era de disposição
Morreu mas deixou
saudade
A toda corporação
Ainda deixou
saudade
Para mãe e os
irmãos
XXIX
Da mulher dele eu
não falo
Ela quer ter sua
razão
Mas dizem que foi a
culpada
Do começo da
questão
Para o meio desta
história
Daria explicação
XXX
O povo conta uma
história
Que às vezes sai
mal contada
Dizem até que
Aurélio
Fingia-se de
camarada
Saia junto com
Audenor
Com as suas
namoradas
XXXI
Audenor ficou atrás
Mas não prestou
atenção
Se o Aurélio lhe
esperava
Para fazer a
traição
Tinham se criado
juntos
Na mais completa
união
XXXII
Não tinha havido
questão
Entre Aurélio e
Audenor
E Audenor seguiu na
frente
E o Aurélio voltou
Debaixo de um
beija-min
Aurélio se
acautelou
XXXIII
Audenor estava no
centro
Não sabia da
traição
Não sabia se
Aurélio
Se achava de
prontidão
Quando Aurélio lhe
furou
O sangue pulou no
chão
XXXIV
Debaixo do
beija-min
Foi grande a revolução
Audenor puxou a
faca
Nesta mesma ocasião
Viajou o Rio Branco
Na triste situação
XXXV
Aurélio matou
Audenor
Não havia precisão
Eram filhos do
mesmo lugar
Não estavam de
questão
Não sei se foi por
família
Ou se foi pelo
irmão
XXXVI
Chorava todos os
parentes
Com a morte de
Audenor
Dizem que sua
mulher
Até luto não botou
Dizem que ficou
alegre
Quando Aurélio
matou
XXXVII
Audenor além de
tudo
Era muito resolvido
Tinha bom
comportamento
Com seus colegas
era unido
O caminho da
miséria
Ensina quem está
perdido
XXXVIII
Foi o caminho de
Aurélio
Enfrentou o
desespero
Foi tentado pelo
laço
Do inimigo
traiçoeiro
Matar um guarda em
praça pública
Sendo leal
companheiro
XXXIX
Não falo mal de
Aurélio
E de Audenor também
Eram filhos da
mesma terra
Não seio o mal de
onde vem
Conto a história
todos
Mas não maltrato
ninguém
XL
Aurélio era
empregado
No banco desta
cidade
Morreu ainda tão
novo
No meio de sua
idade
Não devia ter
praticado
Esta tamanha
crueldade
XLI
Matou o moço colega
Sem ter dó nem
paixão
Podia ter ido a
peito
Não fingisse
traição
Assim ficou
mostrando
O papel de um
ladrão
XLII
Ladrão porque
roubou
A vida de um
soldado
Um mantedor das
ordens públicas
Vivia sempre
mandado
Matou inocentemente
Sem mal ter
praticado
XLIII
Aurélio era casado
Com dona Iza
Barbosa
Era muita delicada
Também era
caprichosa
A família de
Aurélio
Sendo quase toda
bondosa
XLIV
Somente o pai de
Aurélio
Que tinha
delicadeza
Todo mundo da
cidade
Diviam grande
fineza
Castigava os
errados
Socorria a pobreza
XLV
Não sei qual o motivo
Começou esta
questão
Não sei se foi por
família
Não sei quem tem
razão
Sei que morreram
três
Ficou um na
detenção
XLVI
O que vive na
detenção
É o guarda José
Pereira
É filho da Paraíba
Aquela terra
brejeira
Queria matar o
Aurélio
Resolveu fazer asneira
XLVII
Asneira posso
explicar
A ninguém eu não
maltrato
Matasse só o
Aurélio
Mas não mataste o
Adauto
Morreu tão inocente
Por causa de um
peralta
XLVIII
Chamo ele de
peralta
Também vou
esclarecer
Dizem que o Aurélio
Só vivia de beber
Para ver um rapazinho
novo
Tão inocente morrer
XLIX
Amigo eu ainda digo
Cada qual sabe o
que sente
Deus não despreza
ninguém
É um pai Onipotente
Só sinto à morte de
Adauto
Por que morreu tão
inocente
L
Com a morte de
Audenor
Todos queria
vingança
Aurélio se achava
preso
Da sair nem
esperança
Aurélio também
morreu
Os mortos são quem
descansa
LI
Audenor tinha
morrido
Todo mundo se
vingava
Quando encontrava o
Aurélio
A coragem lhe
faltava
Quem matou foi o Zé
Pereira
Ninguém nunca
esperava
LII
O guarda Francisco
Batalha
Comprou logo um
armamento
Para matar o
Aurélio
Mais só tinha
fingimento
A pessoa que matou
Não se tinha o
pensamento
LIII
Com a morte de
Audenor
Mudou tudo de
repente
O pai do mesmo era
Um velho
impertinente
A gente pensa uma
cousa
Mas depois dá
diferente
LIV
O velho pai de
Audenor
Era filho de Ceará
Deixou a barba
crescer
E não queria raspar
Só faço o cabelo e
a barba
Se um dia me eu me
vingar
LV
O tempo sempre
passando
Todo mundo à se
pabular
Que a morte de
Audenor
Precisa se vingar
Todos diziam isto
Nada da coragem
chegar
LVI
Aurélio se achava
preso
Mesmo no Quartel da
Guarda
A pessoa sem razão
De tudo de acovarda
Quem tirou sua vida
Foi mesmo gente de
farda
LVII
Quem assassinou
Aurélio
Foi o guarda Zé
Pereira
Se dava com Audenor
E é ordem
justiceira
Defender seu colega
E à farda
Brasileira
LVIII
À lei de nossa
terra
Em toda corporação
O povo todo é unido
Não há decepção
O Soldado ser unido
Faz a sua obrigação
LIX
A lei de nosso
Brasil
É a lei da
democracia
Em nossa terra se
vive
Com prazer e alegria
Se tivesse cadeira
elétrica
Quem matasse também
morria
LX
Quem morre vai
sossegar
Quem mata vai pra
cadeia
Eu também andando
errado
Pode me bater de
peia
Acho que seja um
erro
Se falar da vida
alheia
LXI
Eu não maltrato a
ninguém
Com minha rimação
Entre Aurélio e
Audenor
Eu não sei quem tem
razão
Alguns que moravam
perto
Sabe da situação
LXII
Peço que não se
aborreça
Com minha rimação
Vou contar outra
parte
Do começo da
questão
Vou contar o jeito
de Aurélio
Quando estava na
prisão
LXIII
Foi primeiro para o
Quartel
Todo direito eu vou
contar
A sua mulher
chegava
Não queria mais
voltar
Os que sofriam
Sempre sempre a
reparar
LXIV
Ele vivia no
quartel
Já pensando em
morrer
Pedindo a todos os
Guardas
Que viviam à
guarnecer
Que tivesse pena
d’ele
Não deixassem ele
sofrer
LXV
Ele se achava preso
Mais já estava
arrependido
Não podia esquecer
Do que tinha
cometido
Vivia banhado em
pranto
Mas tudo sendo
perdido
LXVI
O Aurélio que eu
falo
Não tinha bom
coração
Talvez não fosse
seu pai
Que desse esta
criação
Morreu por ser
valente
Mora debaixo do
chão
LXVII
Praticou esta
maldade
Não havia prisão
O povo diz que o
Aurélio
Só vivia de questão
Dizem que insultava
todo mundo
Só pra ver a
confusão
LXVIII
Amigo o Audenor
Dizem que era
decente
Trabalhou em
diligências
E nunca foi
insolente
Não quero ser
falador
Cada qual sabe o
que sente
LXIX
Audenor morreu
novinho
E o Aurélio também
Hoje vivem lá no
céu
Sem dar trabalhos a
ninguém
Cada qual faça por
si
Faça jeito de viver
bem
LXX
Aurélio se achava
preso
Parece que tinha
azar
Vinha a mulher e os
filhos
Todo dia visitar
Ficavam dia inteiro
Não queriam mais
voltar
LXXI
Falaram com o Juiz
Todo mundo
censurando
Falando contra o
Aurélio
O que estava se
pensando
Depois todas
pessoas
Da rua tavam
matando
LXXII
Aurélio lá no
quartel
Queria ter regalia
Dizendo pra todo
mundo
Que pra cadeia não
ia
Mais sim que a sua
sentença
Tinha que chegar o
dia
LXXIII
O tempo estava
passando
Ele não queria ir
A sua sorte era
esta
Tinha mesmo que
cumprir
Tava ficando mal
visto
Por todo povo d’ali
LXXIV
Ele não queria ir
Maginando em morrer
O medo de última
hora
À ninguém pode
valer
Ele tinha que ser
preso
Para cumprir o
dever
LXXV
A gente pensa uma
cousa
Mas tudo dá o
contrário
Uma parte eu estava
vendo
E a outra me
contaram
No dia deste desastre
Eu estava de
aniversário
LXXVI
Vou contando a
história toda
Sem faltar nem um
pedaço
Eu nasci em
vinte-cinco
No dia quinze de
março
Faço meu
aniversário
Ano nem um fracasso
LXXVII
No dia deste
desastre
Eu me achava
folgando
Acabei de almoçar
Fiquei logo
pensando
Parece que no
quartel
Tinha gente me
esperando
LXXVIII
Eu me levantei da
mesa
Fui logo me fardar
Soldado nunca tem
folga
Faz tudo que se
mandar
Vou agora lá no
quartel
Ver o que aconteceu
por lá
LXXIX
Quando cheguei já
pertinho
Vi uma mulher
gritar
Acudam o meu marido
Este homem vai
matar
Nesta hora me vexei
Fui ligeiro até lá
LXXX
Quando cheguei no
quartel
Não tive quase
demora
Vi gritar lá na
cadeia
Valha-me Nossa
Senhora
Mataram meu marido
Que será de mim
agora
LXXXI
Esta passagem eu
não vi
Não estava na
ocasião
Vi quando chegou Zé
Pereira
Com grande
satisfação
Dois guardas
trazendo ele
E uma faca na mão
LXXXII
Chegou foi logo
dizendo
E não mudou o
sembrante
Quero garantia de
vida
Para falar com o
comandante
Respondi logo a ele
Demore aí um
instante
LXXXIII
Fui falar com o
comandante
Este mandou me
preparar
Ficasse de
prontidão
Não deixasse nada
encostar
A vida do Zé
Pereira
Era preciso guardar
LXXXIV
Eu peguei logo o
fuzil
Fiquei de prontidão
Fiquei até amarelo
Com pouca disposição
Maginando toda hora
Receber uma traição
LXXXV
Ainda conto a vocês
Da forma que eu
fiquei
Passei mais de
quinze dias
Eu não vi como
passei
Durante estes
quinze dias
Cinco noites não me
deitei
LXXXVI
Depois do crime
passado
Mudou tudo de
sentido
Era grande a
multidão
E os dois caídos
Zé Pereira muito
alegre
Não ficou
arrependido
LXXXVII
Amigo eu fiz este
verso
Todos sem pontuação
Foi feito por uma
pessoa
Que ninguém dava
atenção
Mas conta a
história toda
Até o fim da
questão
LXXXVIII
Era um dia de quinta-feira
Dia de todos
visitar
E os planos de Zé
Pereira
Ninguém ia
adivinhar
Se ele entrava na
cadeia
Com instinto de
matar
LXXXIX
José Pereira era
guarda
Ninguém podia
empatar
O que ele ia fazer
Ninguém ia
adivinhar
Com instinto de
matar
XC
José Pereira foi ao
cubículo
Pegou Aurélio na
mão
Tirou o filho dos
braços
Com ódio jogou no
chão
Fez o que tinha
vontade
Nesta mesma ocasião
XCI
Zé Pereira escondeu
a faca
Oculto sem ninguém
ver
Era soldado tamém
Ninguém ia corregir
Não tinha quem
adivinhasse
O que ele ia fazer
XCII
Ele pegou o Aurélio
Deu uma grande
punhalada
Nesta hora estava
louco
Não estava
enxergando nada
Estava feito uma
serpente
Que esperava na
emboscada
XCIII
Zé Pereira lhe
disse
Tu parece um doutor
Tu já estás
arrependido
Do crime que praticou
Foi logo empurrando
a faca
E nada mais lhe
falou
XCIV
Tu mataste meu
colega
Sem ter dó nem
compaixão
Vás passar na mesma
pena
Não tem quem te
livre não
Você também
morrendo
Vinguei minha
paixão
XCV
Adauto era um
rapazinho novo
Com vinte anos de
idade
Disse seu Zé
Pereira
Lhe peço por
caridade
Foi pedir morreu
também
Tá na Santa
eternidade
XCVI
Quando o Aurélio
foi furado
O Adauto foi falar
Saíram de Porta a
fora
Não puderam mais
andar
Depois chegou Zé
Pereira
E acabou de matar
XCVII
Os dois guardas de
serviços
Ficaram sem se
mexer
Ficaram fazendo
cálculo
Como podiam prender
Zé Pereira disse à
eles
Mandou cumprir o
dever
XCVIII
Agora estou
satisfeito
Fiz minha obrigação
Vinguei a morte do
colega
Matei minha paixão
Posso até me acabar
Na casa de detenção
XCIX
Zé Pereira foi ao
quartel
Depois veio pra
detenção
Não tinha
arrependido
Vivia com
satisfação
Sempre foi disposto
Na nossa corporação
C
Adauto estava
inocente
Não pensava em
morrer
Lutando fortemente
Para o primo
defender
Zé Pereira com
raiva
Nada quis atender
CI
Nesta hora estava
louco
Não via o que se
passava
Tava passando de
ódio
Nada também
enxergava
Se tivesse um que
pedia
Mais a faca ele
enfiava
CII
Ficaram todos com
medo
Não queriam dizer
nada
Os corpos no meio
da rua
A rua em sangue banhada
Todo mundo
entristeceu
Com esta cena
desastrada
CIII
Foi três para o
cemitério
Ficou um sem
liberdade
Sujeito a mulher e
os filhos
Ir sofrer
necessidades
O povo todo dizendo
Que tamanha
barbaridade
CIV
Esta cena se passou
Foi um dia de
tormento
Ficando filhos sem
pai
No mundo do
esquecimento
Talvez atrás de
outro
Para lhe dar o
sustento
CV
Ficou as duas
viúvas
No mundo a
perambular
Não podem ficar
sozinhas
Precisa de se casar
É difícil achar um
bom
Que viva sem
maltratar
CVI
Se encontrar um
marido bom
Que tenha educação
E se encontrar um
malvado
Que não tenha
coração
Quer trazer os
entiados
Debaixo de mexicão
CVII
Muitas vezes as
viúvas se casam
Não tem jeito de se
unir
Muitas tem filhas
moças
O marido quer
perseguir
Começa a desavença
De casa tem que
sair
CVIII
Ficou a mulher de
Aurélio
E também a de
Audenor
Ficou filhos sem
pai
Duas luz se apagou
Ficaram sem seu
abrigo
Alegria se acabou
CIX
Aurélio com Audenor
Como já viram eu
falar
Nasceram e se
criaram juntos
Naquele mesmo lugar
Não havia precisão
De eles se
esburduar
CX
Morreram por causa
de festa
De cachaça também
Todos dois
funcionários
Viviam até muito
bem
Todos dois estavam
vivendo
Sem ser a custa de
ninguém
CXI
Muitas pessoas
dizem
Que a cachaça é
insolente
Deus dá o nosso
juízo
Ela tira de repente
Foi por isto que os
dois
Morreram
instantaneamente
CXII
Talvez se os dois
não bebessem
Não tinha se
acabado
Morreu um inocente
Ficou outro
encarcerado
As duas mulheres
viúvas
Com os filhos
abandonados
CXIII
A cachaça
desequilibra
A vida das
criaturas
Bebem o rico bebem
o pobre
Pensando que é
ventura
Mas que a cachaça
Também leva à
sepultura
CXIV
Foi o que se deu
com os dois
Viviam de beber
cachaça
O dinheiro que
ganhavam
Lá todo na fumaça
Por causa da
cachaçada
Aconteceu esta
desgraça
CXV
O povo era que
falava
Que ele gostava de
beber
A pessoa sendo
errado
Faz todo mundo
sofrer
Dizem que suas
mulheres
Queriam aborrecer
CXVI
Eu não falo de
Aurélio
Não falo também de
Audenor
Estou contando a
história toda
De forma que se
passou
Este caso todo eu
vi
Não foi ninguém que
contou
CXVII
É certeza que
aconteceu
Causou admiração
Só se via o povo
correr
O sangue molhando o
chão
O povo da rua
dizendo
O homem sem coração
CXIII
José Pereira
indignado
Valente igual um
leão
Não teve um que
pedisse
E tivesse compaixão
A mulher de Aurélio
chorando
Também caída no
chão
CXIX
O velho pai de
Aurélio
Ficou um pouco
sentido
Meu filho praticou
um crime
Hoje veio a ser
punido
Quem com ferro fere
Com o mesmo ferro é
ferido
CXX
Foi que o pai de
Aurélio disse
E depois se retirou
O mal que tu
praticaste
Passaste a mesma
dor
Ninguém pode
desmanchar
Que Deus na terra
deixou
CXXI
Deus deixou todos
caminhos
Deixou todos por
igual
Uns não compreende
Só querem fazer o
mal
Depois não ganha
lugar
Na corte celestial
CXXII
Ubaldo enterrou o
filho
Começou a se
arrumar
Liquidou tudo que
tinha
Saiu de Tarauacá
Baixou de águas
abaixo
Não fala mais em
voltar
CXXIII
O que Deus faz é
bem feito
Ninguém pode
desmanchar
Ainda mais uma vez
De Zé Pereira vou
falar
O que ele imaginava
Ninguém ia
adivinhar
CXXIV
Todo mundo reclama
José Pereira calado
Não dizia a ninguém
O que tinha
planejado
Até que chegou o
dia
Todos viram o
resultado
CXXV
José Pereira como
guarda
Sempre prestou bons
serviços
Enfrentava o que
viesse
Não tinha nada difícil
Qualquer um para
lhe vencer
Encontrava
sacrifício
CXXVI
José Pereira em
alvo
Filho de boa
família
Andava sempre
direito
Com ninguém
aborrecia
O povo é que fala
certo
Tudo tem seu dia
CXXVII
Quando o rapaz
senta praça
Tem que jurar à
bandeira
Defender o seu
colega
E a farda
Brasileira
Brigar em defesa da
Pátria
Até a hora
derradeira
CXXVIII
Com a morte de
Audenor
Ele ficou
contrariado
Todo mundo
comentava
Mas ele sempre
calado
Que tinha de fazer
Com cego estava
guardado
CXXIX
Todo mundo
lamentava
Aquela situação
José Pereira calado
Nunca dava opinião
Até que chegou o
dia
De vingar sua
paixão
CXXX
Disseram que estava
louco
Eu não posso
afirmar
Não existia doutor
Que pudesse
examinar
Sei que está preso
E não pode se
soltar
CXXXI
No dia deste
desastre
Não ficou ninguém
calado
O povo todo dizendo
Zé Pereira foi
fechado
Se ele tivesse
esperado
O pai dele tinha
vingado
CXXXII
Dizem que o pai de
Audenor
Tinha vindo de
Vitória
Para matar Aurélio
E chegou fora de
hora
Tava fazendo a
barba
Quando soube da história
CXXXIII
O velho nesta hora
disse
Morreste cabra da
peste
Morreu porque matou
Pagaste o que tu
fizeste
José Pereira só
matou
Porque nada lhe
disseste
CXXXIV
Isto era para mim
Já estou no fim da
idade
Zé Pereira se
fechou
Não havia
necessidade
Ele sendo um rapaz
novo
Privar sua
liberdade
CXXXV
O velho na mesma
hora
Com lágrima seu
rosto banhou
Eu queria era
vingar
Só a morte de
Audenor
Magino naquele
inocente
Quem sem motivo se
acabou
CXXXVI
O que Deus faz é em
feito
Ninguém pode
desmanchar
O que faz aqui na
terra
Aqui mesmo vai
pagar
No Céu não existe
briga
Para ninguém vingar
CXXXVII
Disse o velho
contrariado
Só sinto da morte
de Adauto
Matasse ao menos o
Aurélio
O outro foi um
assalto
Queria só o Aurélio
Não tinha raiva do
Adauto
CXXXVIII
Aquele era bom
morrer
Aquele tal de
Aurélio
Aquele era bom ser
plantado
No meio do
cemitério
Ele indo para o
inferno
É somente o que eu
quero
CXXXIX
Malvado matou meu
filho
Não havia precisão
Um ente daquela
forma
Não merece a salvação
Mercê no outro
mundo
Ainda faz confusão
CXL
Zé Pereira errou
Ter matado um
inocente
Ter feito tamanho
crime
No meio de tanta
gente
Adauto nora no céu
Junto com Deus Onipotente
CXLI
Adauto era um rapaz
bom
Não devia ter
morrido
Zé Pereira
indignado
Já se achava sem
sentido
Foi só este o
motivo
De todo o
acontecido
CXLII
José Pereira foi
preso
Depois foi excluído
Matou um tão
inocente
Por não tá no seu
sentido
Só a morte de
Aurélio
Não ficou arrependido
CXLII
José Pereira está
preso
Dizem que vive bem
Sabe que Aurélio
morreu
E não mata mais
ninguém
José Pereira
trabalha
Não pede nada a
ninguém
Referência
FONTINELE, José
Gomes (Cafuringa). História verídica de Aldenor, Aurélio e Adalto e a prisão de
Zé Pereira (cordel). Sem data.
Nota: quanto à grafia,
o autor usa as duas formas Aldenor/Audenor e Adalto/Adauto. Seguimos o autor.
QUE SAGA, AMIGO!
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