Emily Dickinson (1830-1886) viu apenas sete
de seus poemas publicados, em vida, dos mais de 1500 que escreveu. “Sua poesia possui uma liberdade sintática única, muito próxima do uso oral da língua, é densa e paradoxal como sua vida. Em sua enigmática literatura, criou um idioma poético próprio, desprezando as fórmulas ou a regularidade convencional.”
***
Morri pela beleza e mal estava
Ao túmulo ajustado
Alguém veio habitar a sepultura ao lado.
(Defendera a verdade.)
Baixinho perguntou: “Por que morreste?”
“Pela beleza”, respondi.
“E eu pela verdade. São ambas uma só.
Somos irmãos”, me disse.
E assim como parentes que à noite se
encontram
Entre os jazigos conversamos,
Até que o musgo alcançou nossos lábios
E cobriu nossos nomes.
***
Não com um bordão um coração se parte.
Nem com uma pedra.
Um açoite
Tão pequenino que você não vê,
Eu o vi ferir,
Até a enfeitiçada criatura
Sucumbir.
Nobre demais é o nome deste açoite.
Não o digo jamais.
Magnânimo o pássaro
Visto pelo menino.
Cantou
Para a pedra que o matou.
***
Dizem que o tempo ameniza.
Isto é faltar com a verdade.
Dor real se fortalece
Como os músculos, com a idade.
É um teste no sofrimento
Mas não o debelaria.
Se o tempo fosse remédio
Nenhum mal existiria.
***
Esta poeira quieta foi outrora,
Senhoras, cavalheiros e crianças;
Foi talentos, foi risos e suspiros
Blusas, batinas,
tranças.
Este lugar foi vívida mansão
De jardins bem-cuidados,
Onde flores e abelhas perfaziam
Circuitos de verão. Hoje é passado.
DICKINSON, Emily. Poemas. Tradução Idelma
Ribeiro de Faria. São Paulo: Hucitec, 1986. p.23, 59, 87, 95.
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