Paul Géraldy (1885-1983)
Podíamos jamais nos conhecer talvez!
Meu amor, imagine, pois,
tudo isso que a Sorte nos fez
para estarmos aqui, para sermos nós dois!
“Nós fomos feitos um para o outro” – diz
você.
Mas pense no que foi preciso se interpor
de coincidências, para que
pudesse haver apenas isto: o nosso amor!
Que antes de unir nosso destino vagabundo,
vivemos longe um do outro, e sós, e
separados,
e que é tão longo o tempo, e que é tão grande
o mundo,
e a gente era capaz de não ter-se encontrado.
Você nunca pensou, meu romance bonito,
e que este amor correu de risco e indecisões
quando, ao encontro um do outro, em torno do
infinito,
gravitavam à toa os nossos corações?
Você não sabe então que era incerta essa
estrada
que conduziu nossos ideais,
e que um capricho, um quase nada
podia não nos ter juntado nunca mais?
Nunca lhe confessei esta coisa esquisita:
quando avistei você pela primeira vez,
a princípio nem vi que você era bonita...
Não reparei quase em você.
Sua amiga me atraiu bem mais, com seu
sorriso.
Foi só muito depois que cruzamos o olhar...
Nós podíamos não ter lido nada disso:
Você, não compreender, e eu, nem sequer
ousar.
Que seria de nós se, aquela noite, alguém
viesse buscar você antes? Ou
se, entre luzes, você não corasse também
quando eu quis ajudar a pôr o seu “manteau”?...
Pois foram essas razões, lembra-se ainda?...
Um atraso, um impedimento,
e nada existiria deste encantamento,
desta metamorfose linda!
Nunca aconteceria o amor que aconteceu.
Você não estaria agora em minha vida...
Meu coração, meu coração, minha querida!
Penso naquela doença ainda
de que você quase morreu...
CHANCE
Paul Géraldy
Et pourtant, nous pouvions ne jamais nous connaître !
Mon amour, imaginez-vous
tout ce que le Sort dû permettre
pour que l'on soit là, qu'on s'aime, et pour que ce soit nous ?
Tu dis : "Nous
étions nés l'un pour l'autre." Mais pense
à ce qu'il a dû
falloir de chances, de concours,
de causes, de
coïncidences,
pour réaliser ça,
simplement, notre amour !
Songe qu'avant d'unir
nos têtes vagabondes,
nous avons vécu
seuls, séparés, égarés,
et que c'est long, le temps, et que c'est grand, le monde,
et que nous aurions
pu ne pas nous rencontrer.
As-tu jamais pensé,
ma jolie aventure,
aux dangers que
courut notre pauvre bonheur
quand l'un vers
l'autre, au fond de l'infinie nature,
mystérieusement
gravitaient nos deux coeurs ?
Sais-tu que cette course était bien incertaine
qui vers un soir nous conduisait,
et qu'un caprice, une migraine,
pouvaient nous
écarter l'un de l'autre à jamais?
Je ne t'ai jamais dit
cette chose inouïe :
lorsque je t'aperçus
pour la première fois,
je ne vis pas d'abord
que tu étais jolie.
Je pris à peine garde
à toi.
Ton amie m'occupait bien plus, avec son rire.
C'est tard, très tard, que nos regards se sont croisés.
Songe, nous aurions pu ne pas savoir y lire,
et toi ne pas comprendre, et moi ne pas oser.
Où serions-nous ce
soir si, ce soir-là, ta mère
t'avait reprise un peu plus tôt ?
Et si tu n'avais pas
rougi, sous les lumières,
quand je voulus t'aider à mettre ton manteau ?
Car souviens-toi, ce furent là toutes les causes.
Un retard, un empêchement,
et rien n'aurait été du cher enivrement,
de l'exquise
métamorphose !
Notre amour aurait pu
ne jamais advenir !
Tu pourrais
aujourd'hui n'être pas dans ma vie !...
Mon petit coeur, mon coeur, ma petite chérie,
je pense à cette
maladie
dont vous avez failli mourir...
GÉRALDY, Paul. Eu e você. Tradução Guilherme
de Almeida. São Paulo: Editora Nacional, 1983. (18.a edição) p.40-43
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Paul Géraldy, pseudônimo de Paul Lèfevre, parisiense
nascido em 1885, apesar de ser muito conhecido como dramaturgo era também
poeta. Seu trabalho mais conhecido é “Toi et Moi”, Eu e Você,
publicado em 1912. No Brasil, a obra foi traduzida por Guilherme de Almeida
(1890-1969), o príncipe dos poetas brasileiros, que sobre a obra ressaltou: “O ‘Toi
et Moi’ (...) é, todo ele, um ‘tête-à-tête’, uma conversa íntima de namorados
falada e escrita, em verso livre, na língua mais própria para a familiaridade
amorosa: em francês.”
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