sexta-feira, 4 de abril de 2014

VÁSSIA SILVEIRA: alguns poemas

A jornalista, escritora e poeta Vássia Silveira nasceu em Belém (PA), em 1971, mas veio com o pai, o nosso grande jornalista acreano Elson Martins, ainda “moleca” para o Acre. Já passou por vários estados, e, agora, vive em Florianópolis (SC). É autora de Braboletas e Ciuminsetos (Letras Brasileiras, 2007); Quem Tem Medo do Mapinguari? (Letras Brasileiras, 2008), ambos infantis; Indagações de Ameixas (Multifoco, 2011); e uma das autoras do Balaio de Ideias (Editora Projeto, 2006). No Acre, Vássia também editou a então revista Outras Palavras.


BORDEL

Ventos e horas
trouxeram-me o nada.
Sorrisos de esquina na boca
gestos pálidos
luzes néon – ainda recendendo a éter e gozo,
matei o amor.


FIM DE CENA

Quando as luzes apagarem-se
E eu ficar a sós,
Dividirei com a dor
Do instante
A silenciosa lágrima
Que teimou
Em não ser vista.

E rasgarei, até o último fio,
As vestes que encobriram
Meu fracasso – empilhando, como peças de dominó,
Sonho após sonho.

Quando as luzes apagarem-se
E eu ficar a sós,
Acenderei o cigarro, quebrarei os copos
E andarei nua,
Sob a tempestade.


DESCOBERTA

O acalanto da noite
Espanta o bisonho pássaro
Abrindo sobre mim as asas
De insanos desejos.

No desalento das horas
O tique-taque do relógio
Invade o último pedaço
De chão e terra de minha alma.

Sobram em mim os devaneios
Da vida e da morte
Um manto singelo
Que esconde a verdade dos demônios.


PARTIDA

Uma pedra vermelha e redonda
Foi jogada no fundo do lago
A sombra em volta espia
Enquanto tua imagem se desfaz.


POESIA SEM NOME

Vísceras amorfas
despertam a ira
dos anjos

E o cheiro de naftalina
emprega o ritmo
das horas

Por todos os cantos
o pó reveste
o que havia de límpido

E enquanto a garganta
engasga o grito,
as folhas sujas do jardim
balançam ao vento.


SAMAÚMA

Quem já viu uma semente
que parece um algodão?
voa longe, voa alto
e se espalha pelo chão.

E raízes de poemas que
parecem teias de aranha?
são chamadas sapopemas
e conseguem uma façanha:

Sustentam no ar os galhos
leves ao vento, pluma
de uma árvore encantada
que se chama Samaúma.


BORBOLETA BRABA

Doce e linda
a violeta
vivia a chamar
borboleta

Mas tão braba
a borboleta
que vivia
a botar banca
pra pousar

na violeta:
- braba, boba, borboleta.


O SONHO AZUL

Eu tive um sonho azul
como as paredes
da casa de minha avó

Azul clarinho
como o vaso da janela
onde pousam as margaridas

Tão azul que o céu pareceu
pequeno e o mar
um risco num papel sem graça

Eu tive um sonho azul
E acordei assim,
todo azulado!


AMOR DE LIBÉLULA

A libélula disse:
que belo
é o libélulo!
Que disse pra
libélula:
que bela
libélula!

E aí voaram
juntos,
num belo par,
as libélulas.

*

Grávida de histórias e sonhos,
ela sustenta o mundo imaginário…
Deixe que caminhe.
Deixe que permaneça inocente,
alheia às sombras, demônios e
vermes que a acompanham.

*

Querendo extirpar
da carne
a lembrança
do outro,
Amanheceu árvore.

*

Sigo buscando
no verbo das lesmas
a escuridão

*

Meu silêncio é feito
grão de areia colorida
- daquelas que escorrem
quietas, na ampulheta.

*

E do teu cheiro
não me recordo
além do éter
Assim também
o fel
das palavras insanas:
tua boca.

Não, tu não habitas os meus sonhos.


Nota: os poemas foram retirados do site Jornal de Poesia, do Blog da Vássia e do site Lima Coelho.

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"Quando se sonha só, é apenas um sonho, mas quando se sonha com muitos, já é realidade. A utopia partilhada é a mola da história."
DOM HÉLDER CÂMARA


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