João Veras
Eu sou estúpido!
Descobri isso aos poucos.
Tinha sei lá que idade.
A saudade aqui não importa.
Todos eles, mas um tipo de estúpido de cada
vez.
Ao mesmo tempo não caibo.
Um daqueles estúpidos que cada um escolhe
para si.
De cupido a cuspido.
Os estúpidos não são assim facilmente
compreendidos.
Principalmente se respiram.
Um bom estúpido é um estúpido que não tem
narinas.
As vezes sinto dor, mas, na maioria do tempo,
prazer.
Como vês, ser estúpido não é tão mal assim,
tirando o incômodo de não ser aceito.
Que equívoco esse meu agora! Coisa de
estúpido!
Não ser aceito não é nada mal para um do
tipo.
Sou se ofereço, sou se não ofereço.
Sou se dou, sou se não.
Sou se rio, sou se choro.
Todo estúpido é um passeio pela cidade do
velho com a criança e o burro.
Ambos sob o animal, um ou outro, nenhum,
qualquer posição.
A estupidez não aceita unanimidade.
São os olhos doidos do burro olhando os
humanos em crise.
Por isso, poeto.
Por isso rumino.
04.12.16
MUNDO CANE
João Veras
Um deles substitui o outro
que substitui o outro
que substitui o outro
que substitui o outro
(a outra também)
que substitui o outro
semelhantes.
E nós,
orai nós!,
recalcitrantes!
01.12.16
O PESAR INDÍGENA, A PELÍCULA
João Veras
Para Isaac Melo, um
índiozin de Tarauacá,
Eurilinda Figueiredo
Guarani Kaiowá, de Xapuri,
e Eliana Castela, de
Rio Branco.
Eu assisti um tirar o jeans e se pintar.
Então se reenfeitou manso, se reexotizou
bravo
e shopinizou a aldeia com créditos de
liquidação transcendental.
Em fila bem educada, consumidores brancos se
divertiam.
Numa mão um ingresso comestível à prova de
imitação e na outra
o menu dos produtos de carbono sustentáveis e
suas miçangas coloridas.
Chuveiro quente, hospitalidade da melhor e
miração a três dólares a hora e meia.
De amostra grátis, uma selfie com um bebê
mamando, quatro meninas de seios nus sorrindo, uns trinta guerreiros jovens
mais dois pajés anciãos sentados a fumar.
O diretor filmava tudo em plano sequência.
Alucinado gritava: very beautiful, txai!
A cena enquadrava os visitantes modernos com
as suas cartas baixadas na rede. Ao fundo, vitrines, umas mil.
Tudo parecia remeter à plantação no sul do
velho mundo de 1500.
Tudo parecia hoje em invisível, como é.
Daí, vi a fumaça da paz queimando em câmera
lenta a floresta.
Não ficou um.
E quando acordou,
esse um vestia paletó cinza com gravata
vermelha,
trazia um punhado de votos no bolso da
direita e uma ideia fixa na cabeça: sonhava esplêndido tal qual um candidato à
descoberta do Brasil.
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"Quando se sonha só, é apenas um sonho, mas quando se sonha com muitos, já é realidade. A utopia partilhada é a mola da história."
DOM HÉLDER CÂMARA
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