Que grande noite triste!
Abro o livro de um poeta – e fecho os olhos.
longe,
não sei que torre canta e não sei o que
existe
de tão sentimental na voz longa do bronze...
Fecho os olhos – e deixo
meu pensamento andar fora de mim. E vejo
tudo o que ninguém vê de olhos abertos, tudo
o que o Sonho revela – o meu amigo absurdo
que vem pôr transparências delicadas
nas minhas pálpebras fechadas.
Que grande noite triste!
Fecho o livro do poeta – e abro os olhos. Lá
fora
ouço a saudade andar sobre a areia sonora:
ela é toda harmoniosa e toda moça,
e o vento canta toda a música que existe
em seu manto de seda e em seus dedos de
louça...
E a velhice do luar empoa os seus cabelos...
Que grande noite triste!
Alguém está de joelhos
dentro da minha vida... Os meus dedos
inquietos
desfiam os cabelos loiros do abat-jour...
E o meu cigarro põe uma distância azul
Entre o livro fechado e os meus olhos
abertos...
ALMEIDA, Guilherme de. Encantamento, Acaso,
Você: seguidos dos haicais completos. Campinas: Unicamp, 2002. p.108
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