Antigamente tudo
era diferente para os índios Yawanawá.
Os índios caçavam,
pescavam e não tinham terra demarcada.
Hoje já está
diferente, os índios Yawanawá não podem mais caçar, pescar
fora das suas
terras demarcadas.
Tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente os
índios Yawanawá moravam
todos juntos num
Kupixawa só.
Hoje já está tudo
diferente.
Cada família em
suas casas.
Tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente os
Yawanawá não tinham rádios,
toca fitas e nem
rádio de comunicação.
Hoje já todos os
índios compram, usam, gravadores e toca fitas.
Tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente os
índios Yawanawá não dormiam
na cama nem nas
redes industrializadas.
As redes eram
feitas por mão própria, confeccionados com fibras de
tucum e algodão
Hoje todos os
índios já usam e compram redes e cobertores.
Tudo já mudou, tudo
já está diferente.
Antigamente os índios Yawanawá não tinham motores
Antigamente os índios Yawanawá não tinham motores
e nem o conheciam.
Para viajar de
barco só usavam remo e varejão.
Hoje já tem motores
yamar, moto-serra.
Tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente os índios Yawanawá não falavam
Antigamente os índios Yawanawá não falavam
a língua
portuguesa, todos falavam língua nativa.
Hoje já está tudo
mudado.
Os jovens, as crianças
Os jovens, as crianças
falam a língua
portuguesa.
Tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente os
Yawanawá usavam somente arcos e flechas para caçar.
Hoje já mudou, os
índios já usam espingarda e munição para caçar.
Tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente as
mulheres Yawanawá faziam muitos vasos de barro.
Hoje os vasos todos
são de alumínio, de plástico, etc.
Tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente as
caças eram mais fáceis de matar:
veado, porquinho,
anta, tudo era fácil.
Hoje cachorros,
armas de fogo, fizeram
a maior desgraça,
distanciou tudo.
Tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente tudo
tinha controle.
Hoje em dia tudo
está mudando.
O verão não chega
mais no mês esperado,
as flores não
chegam mais junto.
Quando o verão vai,
as flores vem chegando.
Tudo mudou, tudo
está diferente.
Os rios mudaram
muito.
Onde na década de
30 chegavam barcos que carregavam
40 toneladas de
borracha,
hoje até para
chegar barcos de 10 toneladas é difícil.
Para perceber que
tudo mudou, tudo está diferente,
o rio não tem mais
grandes volumes de água, ficou raso.
Tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente, na
época do verão, os índios Yawanawá
faziam as caçadas,
as pescarias, era tudo junto.
Mas hoje tudo é
individual, cada pessoa vai para qualquer
direção que quer.
Por isso eu digo:
tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente tinham
muitos tracajás no rio Gregório.
Se arrancava covas
de ovos de tracajá com facilidade.
Hoje não se vê mais
nem a trilha.
Tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente os
índios Yawanawá não sabiam o que era aposentadoria do
INSS.
Hoje vão a cidade,
os velhos se aposentam, ficam preocupados
e vivem viajando no
trecho da aldeia à cidade,
quase não tendo
mais tempo para fazer as suas
atividades na
comunidade.
Hoje tudo mudou,
tudo está diferente.
Antigamente as
mulheres faziam muita caiçuma
de macaxeira,
caiçuma de milho.
Hoje não querem nem
ser índias.
Hoje só querem
fazer café.
Tudo já mudou, tudo
está diferente.
Antigamente um
grupo era comandado por um só chefe.
Hoje em dia, se tem
10 pessoas morando numa colocação,
já querem formar
uma comunidade independente do chefe.
Por isso, eu digo:
tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente o chefe
tinha de 3 a 6 mulheres para cuidar
do povo e fazia as
suas obrigações com facilidade.
Hoje, as mulheres
do chefe, em vez de cuidar do povo,
fazem espantar todo
mundo.
Hoje tudo mudou,
tudo está diferente.
Antigamente os
índios Yawanawá não se preocupavam
com o
desenvolvimento e nem com projetos econômicos na aldeia.
Hoje já sentem a
necessidade de eles próprios trabalharem
para o
desenvolvimento da comunidade.
Hoje já está mudado
e tudo está diferente.
Antigamente os
índios Yawanawá davam conselho aos seus filhos e filhas.
Hoje se as filhas e
filhos fazem algum erro, são apanhados
pelos pais e começa
o desrespeito.
Hoje tudo mudou,
tudo está diferente.
Antigamente um
grupo indígena não se dividia por qualquer besteira.
Hoje as coisas dos
nawá ficou tão forte dentro dos grupos indígenas
que hoje só basta
um chefe não dar um bom dia
para o seu parente
que a divisão está feita.
Por isso eu digo:
hoje tudo mudou,
tudo está diferente.
Antigamente não
tinha eleição para escolha de chefe,
mas hoje tem
eleição.
Tudo é na base do
nawá.
Hoje está mudado.
Tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente os
genros do povo Yawanawá tiravam lenha
para as sogras e
sogros,
caçavam, pescavam
para os sogros.
Hoje em dia se
casam como os nawás e não têm
aquele grande
respeito como antigamente.
Hoje tudo mudou, tudo
está diferente.
Antigamente os
índios Yawanawá não sabiam ler nem escrever,
mas eram mais
educados e tinham mais respeito.
Hoje quase todos
sabem ler e escrever.
Mas a ignorância
ficou maior.
Hoje tudo mudou,
tudo está diferente.
Antigamente os
índios mais velhos acreditavam
nas crenças do seu
povo.
Mas hoje falam que
tudo é mentira.
Hoje se baseiam
mais nas coisas escritas na Bíblia
e esquecem que os
nossos antepassados viveram sem conhecer esse livro
sagrado.
Eu não estou
dizendo que o que está na Bíblia são mentiras, não é isso.
Hoje as pessoas usam
mais a Bíblia para falar
da vida dos outros
e discriminam outras crenças.
Hoje usam a Bíblia
para aprender a ser pão duro.
A ignorância ficou
maior às custas da Bíblia.
Por isso digo: hoje
tudo mudou, tudo está diferente.
Antigamente as
mulheres Yawanawá não usavam
bermudas e nem
calças de homem.
Antigamente as
mulheres vestiam casacos
e saias compridas
cobrindo o joelho.
Mas hoje as
mulheres estão muito mais parecidas
com homem de que
com mulher.
Hoje tudo mudou,
tudo está diferente.
Antigamente os
índios Yawanawá não tinham nenhuma preocupação.
Só viviam de caça e
da pesca e fazendo as suas festas.
Hoje em dia quase
não têm mais tempo nem para caçar
e nem pescar porque
há muito trabalho.
Hoje tudo mudou,
tudo está diferente.
Antigamente as
mulheres indígenas não namoravam
os nawás (brancos)
com medo de pegarem doenças.
Hoje as mulheres
indígenas casam com os nawá (brancos), pegam
doenças graves que
nem os pajés curam e nem os médicos sabem que
doença é.
Por isso eu digo:
hoje tudo mudou,
tudo está diferente.
Antigamente as
crianças indígenas não passavam
na frente dos mais
velhos, não davam gargalhadas
na frente dos mais
velhos,
não cuspiam na
frente dos mais velhos.
Hoje é diferente,
hoje as crianças usam e abusam dos velhos.
Por isso eu digo:
hoje tudo mudou,
tudo está diferente.
Antigamente os pais
indígenas chamavam
seus filhos com
nomes próprios.
Mas hoje os nomes
indígenas foram trocados por João,
Raimundo, Manoel,
Zé e Napoleão.
Hoje tudo mudou,
tudo está diferente.
Antigamente todos
trabalhavam sem pensar em dinheiro.
Hoje quando dá o
primeiro dia de trabalho
já é para receber
dinheiro.
Hoje os olhos ficam
grandes e os braços se encompridam.
Tudo só é grana.
Hoje se não for com
dinheiro nada se pode fazer.
Por isso, eu digo
tudo mudou e tudo ficou diferente.
Antigamente os
sobrinhos indígenas chamavam
os tios de Kukã,
mas hoje só é tio, tio!
Hoje as crianças
indígenas se esqueceram de falar Kukã,
porque a palavra
Kukã é para ser chamada
de maneira muito
respeitosa.
Hoje tudo mudou,
tudo está diferente.
Antigamente os
velhos chegavam a idade de 80 a 110 anos,
hoje em dia quase
não estão chegando nos 50 anos.
O tempo está
mudado, o tempo velho não volta atrás.
Hoje tudo mudou,
tudo está diferente.
Antigamente os
homens indígenas se casavam,
tinham muitos
filhos, filhas e era difícil se deixarem.
Mas hoje as coisas
mudaram, deixar mulher virou moda.
Hoje tudo mudou,
tudo está diferente.
Antigamente tudo
era diferente.
Tudo era fácil e
tudo era difícil.
Hoje as coisas
mudaram muito.
Cada macaco no seu
galho.
Por isso, continuo
dizendo
tudo mudou, tudo
está diferente.
10 de maio de 1997
Poema e imagem retirados
do livro:
Vinnya, Aldaiso
Luiz. Ochoa, Maria Luiza Pinedo. Teixeira, Gleyson de Araújo. (Orgs.) Costumes
e Tradições do Povo Yawanawá. Comissão Pró-Índio do Acre / Organização dos Professores
Indígenas do Acre. Rio Branco, 2006. p.46-52