segunda-feira, 30 de outubro de 2017
sexta-feira, 27 de outubro de 2017
MEU TEMPO DE CRIANÇA NOS SERINGAIS DO RIO MURU (Parte 1)
Txai Antônio Macedo
Crônicas Indigenistas
Crônicas Indigenistas
Começa aqui, a
partir deste texto, uma série de memórias que marcaram este personagem que vos
escreve. Acompanhe as travessuras desse amigo de todos vocês através deste
espaço de crônicas indigenistas...
O que penso da palavra saudade? Bem, meu tempo
de criança às vezes me dá saudades... Ás vezes não. Na minha concepção, saudade
é palavra triste do ponto de vista da perda ou distância de alguma coisa
infalível, ou uma maneira de lembrar com alegria, pessoas ou momentos vividos.
Se assemelha a faca que corta nos dois gumes.
Abro essa conversa
aqui falando de mim mesmo, e dos meus tempos vividos de infância nos seringais
do Aquiry. Graças a Deus, não perdi um grande amor, nesta estrada longa da
vida, e mesmo assim, vou chorando a minha dor, igual uma borboleta, vagando por
sobre a flor.
Nasci na colocação
Bagaceira do Seringal Transval da bacia do Rio Muru, no Município de Tarauacá –
Estado do Acre. Antes mesmo de fazer o primeiro aniversário, fui me banhar de
cinzas do fogão de lenha que minha mãe jogava debaixo do jirau de lavar pratos.
A gente nem sabia que se chamava de 'louças'. Minha mãe é quem servia os pratos
de todos e a mesa da nossa casa era o chão da casa, o assoalho como falamos no
seringal.
Muita cinza debaixo
do jirau. Eis um atrativo forte para experimentar um banho nas cinzas. Estava
todo lambuzado de cinzas, quando minha mãe viu e gritou comigo. Claro que me
assustei e sai correndo, tentei pular uma cerca, mas, segundos depois - segundo
me contaram minhas irmãs mais velhas - cai por cima do braço direito, o que me
fez quebrar o braço.
Minha mãe ficou extremamente aflita e correu
para floresta, indo buscar 'leite' de Janaguba. Essa árvore produz um látex na
casca, que funciona como gesso. Assim, rapidamente ela envolveu meu braço com
algodão da nossa lavoura empapado com aquele leite da árvore e emendou o meu
braço.
Naquela época,
crianças não brincavam na presença dos adultos. Não tomavam parte nas conversas
e nem ficavam andando 'pelo meio' deles, enquanto os adultos conversavam.
Crianças não podiam ter opinião e muito menos destacar propostas.
Um belo dia,
segundo o que as minhas irmãs me contaram, eu quebrei toda ordem da casa,
lançando um protesto sutil e pertinente. Eu ainda contava somente um ano de
idade. Minha mãe colocou a panela de comida perto dela e foi aos poucos
servindo os pratos de todos, no chão da casa. No entanto, ela esqueceu de
colocar carne no meu prato, que problema! Eu olhei a mesa toda reunida então
falei as seguintes palavras, que nem sei de onde tirei: "Você vai pirão sem
carne, sem carne mesmo mais você vai". - Nossa! Isto virou motivo de muita
alegria por parte da minha mãe, que sensibilizada e até emocionada, serviu meu
prato pedindo mil desculpas. Esse acontecimento serviu de graça e ficou na boca
de nossa família por muitos anos.
Mas temos as lembranças ruins e tristes...
Numa certa noite de
festa, que se realizava em outra colocação do mesmo seringal Transval, um
sujeito chamado Pedro Elias assassinou o meu irmão Francisco Manuel. Foi por
ciúmes, porque meu irmão era bem aceito pelas moças com quem ele sempre dançava
por ocasião das festas naquele seringal.
Sua morte foi a
gota d’água para que meu pai e minha mãe se mudassem com toda família daquele
lugar. E assim nos mudamos para a cidade de Tarauacá, onde fomos morar numa
casa improvisada na rua da Anhinga. Não sei se atualmente ainda é este o nome
daquela rua, talvez ainda seja o mesmo.
Dessa época me
recordo de poucas coisas. Lembro do botequim do seu Antonio Sabino, onde meu
pai comprava mantimentos, e de poucos outros incidentes fortes que, enquanto
criança, me envolveram. Relembro alguns...
Eu criava um macaco
prego. Ele se chamava Miguel. Ele mexia muito em tudo: comia o açúcar e
derramava outras coisas, e o povo da família me enchia o saco por causa dele.
Infelizmente aconteceu uma fatalidade, que nem sei se devo contar. Enfim... De
tanto reclamarem do macaco, numa daquelas vezes que mexeu no açúcar da lata, e
por causa das reclamações contra ele, fiquei totalmente perdido e bati na
cabeça do Miguel, que não obedecia e não largava de mexer nas coisas. Ele
escapou mais depois morreu. Nossa! Guardo até hoje o meu sofrimento por ter
sido levado a espancar o coitado do macaco, como eu via os adultos fazerem com
os animais, que merda.
Uma outra lembrança
envolveu o senhor Antonio Sabino, que tinha uma filha moça que se chamava Maria
Sabino. Eu era uma criança mesmo, mas, quando aquela moça falava ali perto de
mim e até me acariciava, eu sentia fortes emoções. Aquilo era mesmo muito forte
em mim. Eu ainda não conhecia a palavra paixão, mas, hoje entendo que me
apaixonei antes mesmo dos meus primeiros três anos de idade. E a moça comigo o
tempo inteiro e dizia coisas que ficavam cantarolando na minha cabeça, mas,
para ela tudo era uma brincadeira mesmo.
Eu ainda não havia
completado meus primeiros três aninhos e já queria ser grande, digo, ser
adulto. Ainda com essa idade, certo dia, brincando, encontrei um canivete
inoxidável daqueles que abre e recolhe a
lâmina de forma manual. Lembro que minha sede de vingança foi aguçada em
questão de instantes e ai veio-me a mente o famigerado Pedro Elias, o homem que
tinha assassinado o meu irmão. Ele estava preso na cadeia da cidade de Tarauacá
e minha cabeça repetia, a todo momento, as palavras de minha mãe e minhas irmãs
sobre a morte de meu irmão, que na verdade, nem cheguei a conhecer.
Assim, sem que
minha família percebesse, peguei o canivete e me dirigi à Delegacia, que era a
cadeia como se chamava ali. Sabia que lá estava o homem que matou o meu irmão,
e eu com aquele canivete no bolso tinha uma boa oportunidade de vingar a morte
do meu irmão. Com tal intenção parti para a cadeia, e ao chegar lá, logo à
porta, fui surpreendido pelo Cabo Joaquim, um Policial da Guarda Territorial e
amigo da minha família. O cabo, ao me ver ali, e daquele tamanho, veio ao meu
encontro. Me abraçou, colocou-me em seus braços, tirou o canivete do meu bolso
e foi me deixar em casa, me levando em seus braços. Ao chegar à nossa casa ele
entregou o canivete ao meu pai, e procurou recomendar aos meus familiares que
não me deixassem sair de casa. Vi minha tentativa de vingança frustrada, e
notei que meu pai também ficou preocupado com aquilo que fiz na minha infância
matutina.
Naquela época meu
pai, Raimundo Batista de Macêdo, mantinha a família ali na cidade e trabalhava
no seringal. Ele comprou do Cícero Kaxinawá a colocação Foz do Igarapé do
Caucho. E aí, aos três anos de idade, fui levado pela família a morar junto com
o povo Kaxinawá. Essa colocação, hoje em dia, é a Terra Indígena Kaxinawá do
Igarapé do Caucho.
Para mim, viver
ali, ainda em idade tão tenra, não foi fácil. Bem no inicio de nosso
relacionamento com os 'caboclos' - como os não índios os tratavam - dava para sentir
que tudo ali era muito diferente da vida que eu levava na minha casa: as
comidas, as bebidas, a maneira de preparar os alimentos, a forma de plantio das
lavouras, a maneira como os indígenas tratavam seus mortos, como se dava suas
festas. - Naquela época não me lembro de ter visto um Mariri.
Naquele tempo, os
Huni Kuin (Kaxinawá) do Caucho já faziam festas dançantes tocadas com
instrumentos, como: acordeão, cavaquinho, violão, pandeiro e maracá. Eles trabalhavam na diária para os brancos da
redondeza e contratavam dois irmãos cearenses e tocadores de acordeão, Isídio e
Simão, que moravam na cidade de Tarauacá, para tocar em suas festas na aldeia.
Mesmo ainda uma
criança dancei naquelas festas, que, por sinal, muito animadas. Isso quando não
aconteciam brigas entre índios e não índios, o que, graças a Deus, nunca
aconteceu com nossa família, afinal, meus pais eram amigos dos índios.
Lembro que numa
dessas festas, realizada na aldeia Kaxinawá do Seringal Tamandaré, houve uma
briga, e um senhor de nome José Berto Lino matou a facadas o 'caboclo' Serrano
Kaxinawa. Da nossa família não tinha ninguém naquela festa e ainda bem que não
estávamos, pois nos falaram que a briga foi feia.
Os Huni Kuin sempre
se mostraram muito animados, gostavam muito de festa, naquela época, tempo dos
seringais. Embora guardassem com eles muito de seus saberes tradicionais,
viviam como os seringueiros regionais, e não me lembro que eles tenham nos
mostrado a época festas de sua própria cultura, o que atualmente se observa, está
bem recuperada e praticada conforme a tradição deste povo.
Antônio Batista de Macêdo, o Txai Macêdo, é sertanista da FUNAI e uma
figura importantíssima para o indigenismo e para os povos indígenas no Acre.
Juntamente figuras como com Txai Terri, Dedê Maia foi (e continua sendo) uma
memória viva do que foram os anos de luta, desafios, vitórias, alegrias e
tristezas em prol das questões indígenas nesse rincão da Amazônia. Vivas a esse
grande txai, cuja história merece ser contada e recontada por quem admira e conhece o seu trabalho. (Jairo Lima)
quarta-feira, 25 de outubro de 2017
"COELHO NETTO E SUA OBRA" DE PÉRICLES MORAES - em e-book
“COELHO NETTO E SUA OBRA” DE PÉRICLES MORAES -
em e-book - O MAIOR LIVRO DA LITERATURA AMAZONENSE DE TODOS OS TEMPOS, COM
PREFÁCIO DE ROGEL SAMUEL.
terça-feira, 24 de outubro de 2017
O PROBLEMÁTICO CONCEITO DE IDEOLOGIA
Inês Lacerda Araújo
Filosofia de todo dia
Filosofia de todo dia
Quais
são as raízes de nosso pensamento?
São
várias e diversas: carga genética, experiências de vida, emoções, aprendizado,
influência do meio social e familiar, escolarização, entre outras; cada uma
delas, a seu modo, influenciará o modo de pensar e de ver o mundo, desde a
infância e em especial na idade adulta.
E
quanto à ideologia?
Mas
antes, o que vem a ser "ideologia"?
Em
um sentido positivo, são as ideias e conceitos que moldam a produção
intelectual, as visões políticas, inclusive as metáforas e a simbolização da
linguagem, e até mesmo certas utopias.
Vista
dessa maneira, trata-se de um conteúdo formado basicamente por ideias que podem
ajudar partidos e sistemas políticos a formular e a aplicar um ideário que pode
e deve ser aberto às discussões, ao aperfeiçoamento dos objetivos políticos e sociais,
e, principalmente, a leitura de sua época, às exigências de seu tempo.
Em
flagrante contraponto a essa modo de ver e de usar as ideologias, prepondera a
radicalização.
Em
primeiro lugar, a imposição de um conjunto de propostas que não passam pelo exame
crítico, pelo contrário, iludem, mascaram, seu objetivo é se transformar em
única bandeira de luta, com prévios acertos sobre o que entendem ser a
realidade social e política, capaz de produzir o que Marx chamara de
"falsa consciência".
Essas
ideologias visivelmente tendenciosas, conduzem aos extremismos de direita e de
esquerda. Os de direita distorcem a realidade em prol do conservadorismo, da
resistência às mudanças que a própria vida em sociedade produz. Se a sociedade
evolui em direção à tolerância religiosa, por exemplo, os ideólogos de direita
consideram que há um só credo "verdadeiro", o seu!
E
as ideologias de esquerda consideram que o capital, que a burguesia, que a
classe dominante também domina ideologicamente e impõe de cima a baixo seus conceitos,
ideias e concepções políticas. Não conseguem pensar a realidade social fora do
esquematismo "burguesia x trabalho". Que o socialismo é o único
regime que resolverá a contradição, que acabará com o lucro ("mais
valia") do capitalismo, intrinsecamente mau. Os olhos se fecham para a
realidade histórica.
***
Em
seu último boletim, a ANDES traz um artigo sobre o legado do direito soviético,
como "a obrigatoriedade do trabalho, o que fez da URSS o primeiro lugar do
mundo em que toda a população teve garantidas as condições para reprodução de
sua vida" (...) e, paulatinamente, reduzir a jornada de trabalho, ao
contrário do que acontece nas sociedades capitalistas, onde o Direito do
Trabalho tem como foco garantir a extração da mais-valia" (p. 16). É um resumo
da pesquisa do professor docente de Direito da Universidade Federal de Lavras,
Gustavo Seferian.
É
um caso evidente de distorção ideológica, só para ilustrar o direito do
trabalho surgiu na Europa, nos EUA e também no Brasil sem nenhuma lei que promova
o lucro. Mais adiante nesse artigo, reconhece que Stálin foi um
contrarrevolucionário. Mas que felizmente também o "Direito é passível de
alterações (sic), não só as favoráveis à burguesia, mas também alterações que
são reflexo das ofensivas e resistências dos trabalhadores".
Esse discurso ideológico eivado de conceitos que nem Marx usaria,
predomina ainda em vários setores da inteligenzzia
universitária.
sexta-feira, 20 de outubro de 2017
ORAÇÃO À SANTÍSSIMA RUÍNA DA CULTURA ACREANA
(para o dia da
cultura fora de época)
João Veras
19.10.17
João Veras
alimente mais os
cupins do teatro hélio melo
não deixa apagar as
labaredas do museu da borracha
esconda ainda mais
o quadrilhodromo que escafedeu-se
ligue o ventilador sobre
o centro de florestania que virou pó
ponha mais tapumes
no espaço kaxinawá
destroce ainda mais
a casa de leitura da gameleira
afaste mais ainda o
leitor da biblioteca da floresta
ajude a trocar o
nome da usina de artes
alague ainda mais o
teatro recreio
suma com os
escombros aquáticos do barco da afundação municipal
alimente os bichos
da madeira do parque capitão ciríaco com os restos da finada igrejinha de nossa
senhora da seringueira
instale mais split
no teatrão nesse eterno verão sem teatro
jogue as chaves dos
cadeados nas dragas de areia da ex praia do amapá
escureça ainda mais
a casa dos povos da floresta
auxilie ainda mais
para que o seringal bom destino possa se tornar como tanto deseja apenas um
destino mal-assombrado
sistematize mais
ainda o sistema estadual de cultura fantasma
aconselhe ainda
mais o conselho de cultura mudo
tombe mais ainda o
conselho do patrimônio cultural de vistas grossas
ofereça mais
emprego de estátua para o movimento cultural bobo
cale ainda mais a
boca da lei de cultura
muito mais que o
nosso canto,
nossas expressões
cênicas, literárias, plásticas, cinematográficas...
nossas memórias
artísticas, nossos presentes ignorados
enterre ainda mais
o “artista da terra” no fundo do poço escuro
e o promova à
galeria dos esquecidos mortos célebres
jogue mais praga
sobre o que não existe nos demais municípios
e não esqueça de
derrubar o que ainda resta em pé
aproveite a ocasião
e festeje esse governo sem graça
- esse da agência
cultural dos amigos
e da ruína cultural
do resto, dos demais
até que as eleições
e suas licitações as reinaugurem
e tudo volte ao
nosso paraíso de dante.
Amém.
P.S.: Não esqueça
de juntar tudo isso e colocar no Museu da Ruína dos Povos Acreanos.
terça-feira, 17 de outubro de 2017
MITO DE MACUNAÍMA O DESOBEDIENTE*
Quando Macunaíma ainda era criança seus
irmãos sempre lhe estavam dizendo:
– Nunca espies o sexo de mulher. É horrível. É perigoso. Foge dele.
– Nunca espies o sexo de mulher. É horrível. É perigoso. Foge dele.
Mas isso só servia para excitar mais a
curiosidade do menino e o desejo de desobedecê-los.
Uma vez, andando pelos matos, Macunaíma
encontrou uma árvore muito alta, mas seca, de tronco bastante grosso e
escorregadio.
De um dos galhos daquela árvore, separado do
corpo, pendia um sexo de mulher.
E mesmo seco e mirrado era tão horrível
aquilo que Macunaíma viu logo não ser fruto enluado ou uma velha pele de
morcego.
– Lá está um sexo de mulher!
Macunaíma então se transformou imediatamente
num macaco-prego. E tentou escalar a árvore. E espiar de perto aquele sexo.
Mas o tronco era muito grosso e escorregadio.
E seus braços de macaco eram muito curtos. E Macunaíma não conseguiu escalá-lo.
Transformou-se, por isso, num quati. E não
conseguiu escalá-lo.
Transformou-se, ali mesmo, numa cobra. E também
não conseguiu.
Transformou-se numa lagartixa. E nada
conseguiu.
Transformou-se numa formiga. E, caminhando em
zigue-zague, pelo tronco acima, bem devagar, chegou perto do sexo de mulher e
pôde espiá-lo como queria.
Mas o sexo de mulher o descobriu. E, rápido,
o engoliu.
Muitos dias depois os irmãos de Macunaíma,
procurando-o pelos matos, ao passar por aquela árvore, viram o sexo de mulher,
que conheciam, gordo e viçoso.
Desconfiaram. Puseram a árvore abaixo. Abriram
aquele sexo. E ali acharam o corpo de Macunaíma. Sopraram sobre ele. E Macunaíma
acordou, rindo, rindo.
PEREIRA, Nunes.
Moronguêtá: um Decameron indígena (Vol.1). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira;
Brasília: INL, 1980. p.73
*Mitos, lendas, Estórias e Tradições dos Índios Taulipangue, Macuxi,
Uapixana e Xiriana, do Vale do Rio Branco, Roraima.
segunda-feira, 16 de outubro de 2017
MEMÓRIA MUSICAL: CÉSAR ESCÓCIO
César Escócio é natural
de Sena Madureira. Cantor e compositor, formado em Direito pela Universidade
Federal do Pará, passou a morar em Belém, onde além de exercer a advocacia,
dedica-se a compor e a cantar, especialmente na afirmação da cultura amazônica.
Entre seus trabalhos, destacam-se o LP Caranã (1991) e o CD Omami Omami – Lutas
populares na Amazônia (Coletiva) (1997).
O Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira traz os seguintes dados sobre Escócio: “Tem
participação em movimentos e eventos artístico-musicais no Acre e no Pará,
desde os anos 1970. Com diversas participações em gravações coletivas, lançou o
LP solo “Caranã”, em 1995. Em 1997, produziu, em Belém, o CD “Omami Omami -
Lutas populares na Amazônia”, do qual participaram compositores e músicos do
Pará. Em 2000, participou do songbook “Canções Acreanas”, com a composição “Sou
Fronteira”, parceria com o também acreano Océlio de Medeiros. O songbook, que
foi publicado sem fins lucrativos, e que faz parte do Projeto “Caderno de
Músicas Acreanas”, teve apoio de empresas oficiais como o Banco do Brasil, além
de outras, de iniciativa privada, tendo por objetivo tornar pública a produção
musical acreana. O compêndio é o registro fonográfico, através de um CD, e
gráfico, contendo melodia, letra, harmonia e arranjos instrumentais, além de
pequena biografia dos compositores e, também, avaliações de personalidades
acreanas, como João Veras, que o idealizou e produziu, Francisco Dandão, Silvio
Margarido, Romualdo Silva Medeiros e Danilo de S'Acre.”
O LP Caranã foi
gravado e mixado entre março e junho de 1991, nos estúdios “TRANZATAPE”, 16
canais, em Belém do Pará. A ilustração da capa é uma pintura de Jorge Eiró,
concebida especialmente para o LP, que contou com músicos como Sagica, Zé Luiz
Maneschy, Silvana de Faria, Alcir Meireles, Ricardo Dias, Marianne, Paulo Levi,
Luiz Pardal, Joba, Suelene e Nicinha, etc.
Capa de Caranã (1991) |
Contracapa de Caranã (1991) |
Cartaz da apresentação Made in seringal de César Escócio com a Banda Látex em Rio Branco em 1989. |
Detalhe folder de Made in seringal |
Folder do show Made in seringal (1989) |
Letras de algumas
músicas que se encontram no LP Caranã:
CARANÃ
César Escócio
Caraná
É o verão se
achegando
Natureza afora
É um povo migrante
Que foge do tédio
Que foge do vício
Da cidade
Que busca o sopro
do mar
Nas delícias da
água
Na malícia das
ondas
Nas crinas de um
sol vermelho
Nas denguices de
uma noite enluarada
Caranã
É a rosa das dunas
originando as fontes
Despertando os
cânticos
É Atalaia numa
tatuagem viva
Trançada de gente
Que nem o arco-íris
à beira do mar
Caranã
É o farol vermelho
vagalumeando
No avisar da rota
ao bom pescador
Que vem de tão
longe
De dentro da noite
De volta pro seu
amor
Caraná
É um tapiri de
palha
Perto da ladeira,
onde se dança
De onde se vê o
verão
De onde se avista o
porto
E o maçarico
E a gaivota
E a ponta de areia
que entra no mar
Caraná
Somos nós e uma lua
a brilhar
Somos nós e o sopro
do mar
São as veias da
terra a jorrar
Cristalinas salinas
Ah minha amada!
São promessas de
amor
No olhar.
NORTEANDO
César Escócio
Norte andei
Selvamar
No reflorir do ipê
No dia da luamar
No céu fumacê
Pintou de novo a
maré
Cunhã foi pro
igarapé
Traçando seus
tucumãs
Mirando-se nas
manhãs
Nas águas de abaeté
Num barco faz sua
fé
Pra retornar – Marajó
E não ficar assim
tão só
Na linha do equador
Pensando no seu
amor
Além de lá
O rio
O cheiro-ribeira
Cavalo do rio
Canoa ligeira
Eh, canoa!
Repique da maresia
Saudade agonia
Cuíra
Remanso de lua
Corações se buscam
Sem distância de
amar
Em cada
porto-cidade
Há uma
espera-miragem
Em avidez,
liberdade
Trabalho, fé e
coragem
Em refazer o pão
Atravessando o
verão
CÉU DO AQUIRY
César Escócio
Mirei
Mirei muchacha
Mira tu rambém
O cintilar das
estrelas
Lindas no céu do
aquiry
Canta toda essa
beleza
Esse cheiro de mato
Que navega no ar
Canta pela natureza
E saúda os povos
Dessa floresta
acesa
Pela luz da lua
Fogo do prazer
Mirei...
SOPRO AMAZÔNICO
César Escócio
Vociferar
A mata e seus
mistérios
O verdejar desponta
Na ponta do olhar
Tanto chão
Quanta distância
pra vencer
O céu e suas nuvens
Entre galhos e
espinhos e rios
As vozes da mata
Numa canção
selvagem
O sopro amazônico
Num verde forte
refrão
Filhos desse
império
Aldeias e tabocais
Tapuias e curumins
Araras e paxiubais
Serpentes e
jacamins
RAINHA DA FLORESTA
Pia Vila, Felie
Jardim e Txai Terry Aquino
Senhora rainha da floresta
Dai-me a força da
ayawuasca
Pra cantar nessas
malocas
Pros índios desse
lugar
Quero beber caiçuma
E tomar muito cipó
Quero bailar o
mariri
Nas aldeias do aquiry
Dai-me a força do
jagube
Na luz do lampião
Iluminando todas as
veredas
Que dão pro meu
coração
Como é grande essa
floresta
É maior a solidão
Dessa vida
passageira
Desse verde sertão
Vou seguindo pela
vida
Varejando de ubá
Todos os rios dessa
terra
Unidos chegarão ao mar... Nossa homenagem ao artista César Escócio e o nosso agradecimento ao amigo João Veras.