Américo Antony |
“Cromos Amazônicos”
é o mais denso, talvez, de todos os livros inéditos de Américo Antony, somente
comparável ao seu irmão mais próximo intitulado “Crisóis”, seguido de perto
pelo “Grinaldas Selvagens”, “Canções Perdidas e outras dispersas” “A Alma do Silêncio”,
entre vários ainda não classificados para uma titulagem definitiva.
Polariza este livro o já nosso familiar acento melancólico do poeta que se busca encontrar, após anos de ausência, com o berço nativo de seus legítimos antepassados e uma profunda nostalgia, possivelmente cósmica, diante de um mundo lacerado pelos equívocos da História.
Confirma-se, no entanto, que ninguém soube, como ele, Américo Antony, desvendar as queixas do verde, os mínimos segredos telúricos da selva desconhecida, ainda hoje, por quantos se aventuram no empenho de conquistá-la. A metáfora do poeta, contudo, transcendentaliza-se, mas nunca se hermetiza. Ou quando se hermetiza, ainda mais clara se torna. Pode-se até dizer que o seu vocabulário afetivo se concentra, quase sempre, em torno de núcleos temáticos na aparência repetitivos; mas isto é ilusório: seu estilo e sua linguagem emanam da simplicidade que rejeita o supérfluo, colando-se deste modo singular ao fluxo natural de sua dicção predileta.
Américo Antony, embora dono de vasto léxico regionalista, não refoge à tradição poética: cita os deuses das mitologias grega e romana, em sinal mais que evidente de que os tempos primeiros de Jurupari cederam, ou cedem, às pressões externas; e que o futuro já deverá ser pensado como um novo sol que está vindo em contrapartida daquele que nos fugira.
A obra inédita de Américo Antony é bastante volumosa, perfazendo um total de 600 ou mais poemas, devidamente selecionada, ou seja, dando-se por temporariamente “excluído” um volume de páginas ainda não classificadas e tituladas, com inúmeros sonetos d’occasion, mais o “Dardos de Fogo” e a confusa miscelânea de poemas e sonetos a que o poeta não chegara a dar os devidos títulos de sátiras e epigramas, uma espécie de variante que discrepa sobremodo da verdadeira saga poética do autor.
Poeta solitário, contando apenas com poucos amigos, dentre eles alguns jovens que seriam, anos depois, fundadores do Clube da Madrugada, Américo Antony, talvez por este motivo, tudo fazia para conservar seus escritos marcados pela gratidão do artista aos raros, porém fiéis, admiradores que em nenhum momento de sua vida deixaram de acompanhá-lo, rendendo-lhe os merecidos tributos.
Daí nossa alegria em descobrir, já desbotados pelo bolor das intempéries, velhos papéis manuscritos pelo mestre; num destes, ainda intacto, uma epígrafe de Alencar e Silva retirada de um artigo sob o título “Clarões da Selva”, com data de março de 1953, no qual o poeta de “Território Noturno” fala sobre a poesia de Américo; e, como parte do livro “Canções Dispersas”, emerge um soneto dedicado a Jorge Tufic, a quem caberia, em 1987, como presidente do Conselho Estadual de Cultura, a iniciativa de publicar seu longo poema amazônico “Conory”.
Prosseguindo na reunião da obra dispersa do famoso “Ermitão da rua Japurá” daí resultara a formação de mais dois tomos da obra antonyana, além das já referidas “Cromos Amazônicos”, “Crisóis” e “Grinaldas Selvagens”. São eles: “Alma do silêncio”, “Dardos de fogo” e a confusa miscelânea de poemas e sonetos a que o poeta não chegara a dar os devidos títulos gerais.
Em “A alma do silêncio”, o poeta como que apura e intensifica a sua ojeriza pelo terrorismo sociopático da urbe moderna ou modernosa; contrapõe-se a ela assumindo uma atitude de suprema indiferença aos valores mundanos em favor do eu espiritual que só se revela ao contato dos elementos primários, como a água e a pedra das cachoeiras, a flor e o cântico soturno das aves nascidas da luz e do mistério que alimenta as raízes do sonho. O mundo do poeta já não é mais o mesmo. Torna-se incompreendido.
Em “Crisóis”, tanto quanto nos “Cromos Amazônicos”, o poeta sente-se à vontade em dar expansão ao estro temático que o liga às nascentes perpétuas do amor telúrico e da fábula racionalista. Mais neste, porém, do que naquele, o vate amazônico “pensa” tanto quanto se inclina e se rende aos encantos da natureza.
Em “Grinaldas Selvagens”, com surpreendentes “aquarelas” como este soneto que ele intitula “O sorriso da montanha”, o símbolo da flor já contrasta com os primeiros movimentos articulados à destruição das florestas. Sintomático o uso do plural quando a floresta, a biota, é una pelo simples fato de constituir-se um todo, mas que, obviamente, formado por segmentos, ou seguimentos orgânicos, partes, enfim, da totalidade, sem cujas partes nada representa. Daí, florestas. Saber, sabença, conhecimento lúcido de pajé. O soneto deste livro sob o título “Contra a destruição da floresta” é um grito, como há outros no texto, cuja mensagem atualiza, pari passu, qualquer oportuníssima vontade para rever e para reler Américo Antony à luz das estrofes que se fizeram (e ainda se fazem) nas várias moradas de Jurupari.
Enfim, tudo neste opus corre por conta de uma incurável paixão pelos motivos da mata amazônica, de um, quem sabe, enigmático deslumbramento estético pelo todo que se junta às partes e das partes que celebram a totalidade inexaurível do próprio mito.
A primeira incursão pela obra de Américo Antony se dera por iniciativa do Conselho Estadual de Cultura, com base na Resolução s/n, DE 1975, que resultara neste ensaio de Jorge Tufic – “Américo Antony – O último cisne” (aqui reproduzido sob o título de “Conteúdo e visão geral da poesia de Américo Antony” – publicado na edição n.º 04, ano I, em julho de 1978, do LIVRORNAL (o livro em jornal).
Fazer o inventário e levantamento do acervo, quer inédito ou édito deste grande poeta amazônico, seria essa, com certeza, a preocupação do colegiado, por mais árduo e tardio que fosse o resgate de mais de 600 manuscritos de sonetos e poemas aleatoriamente reunidos em caixas de papelão, pastas e cadernos deixados por ele.
A inclusão do estudo feito por mim, espécie também de relatório apresentado ao Conselho Estadual de Cultura, tem, portanto, a finalidade maior, 1.º de informar sobre as dificuldades encontradas no decurso da pesquisa destes valiosos documentos, e 2.º acolher o referido trabalho que tem forma mais de relatório da comissão designada pelo CEC, do que propriamente de ensaio crítico sobre a poesia de Américo Antony.
Polariza este livro o já nosso familiar acento melancólico do poeta que se busca encontrar, após anos de ausência, com o berço nativo de seus legítimos antepassados e uma profunda nostalgia, possivelmente cósmica, diante de um mundo lacerado pelos equívocos da História.
Confirma-se, no entanto, que ninguém soube, como ele, Américo Antony, desvendar as queixas do verde, os mínimos segredos telúricos da selva desconhecida, ainda hoje, por quantos se aventuram no empenho de conquistá-la. A metáfora do poeta, contudo, transcendentaliza-se, mas nunca se hermetiza. Ou quando se hermetiza, ainda mais clara se torna. Pode-se até dizer que o seu vocabulário afetivo se concentra, quase sempre, em torno de núcleos temáticos na aparência repetitivos; mas isto é ilusório: seu estilo e sua linguagem emanam da simplicidade que rejeita o supérfluo, colando-se deste modo singular ao fluxo natural de sua dicção predileta.
Américo Antony, embora dono de vasto léxico regionalista, não refoge à tradição poética: cita os deuses das mitologias grega e romana, em sinal mais que evidente de que os tempos primeiros de Jurupari cederam, ou cedem, às pressões externas; e que o futuro já deverá ser pensado como um novo sol que está vindo em contrapartida daquele que nos fugira.
A obra inédita de Américo Antony é bastante volumosa, perfazendo um total de 600 ou mais poemas, devidamente selecionada, ou seja, dando-se por temporariamente “excluído” um volume de páginas ainda não classificadas e tituladas, com inúmeros sonetos d’occasion, mais o “Dardos de Fogo” e a confusa miscelânea de poemas e sonetos a que o poeta não chegara a dar os devidos títulos de sátiras e epigramas, uma espécie de variante que discrepa sobremodo da verdadeira saga poética do autor.
Poeta solitário, contando apenas com poucos amigos, dentre eles alguns jovens que seriam, anos depois, fundadores do Clube da Madrugada, Américo Antony, talvez por este motivo, tudo fazia para conservar seus escritos marcados pela gratidão do artista aos raros, porém fiéis, admiradores que em nenhum momento de sua vida deixaram de acompanhá-lo, rendendo-lhe os merecidos tributos.
Daí nossa alegria em descobrir, já desbotados pelo bolor das intempéries, velhos papéis manuscritos pelo mestre; num destes, ainda intacto, uma epígrafe de Alencar e Silva retirada de um artigo sob o título “Clarões da Selva”, com data de março de 1953, no qual o poeta de “Território Noturno” fala sobre a poesia de Américo; e, como parte do livro “Canções Dispersas”, emerge um soneto dedicado a Jorge Tufic, a quem caberia, em 1987, como presidente do Conselho Estadual de Cultura, a iniciativa de publicar seu longo poema amazônico “Conory”.
Prosseguindo na reunião da obra dispersa do famoso “Ermitão da rua Japurá” daí resultara a formação de mais dois tomos da obra antonyana, além das já referidas “Cromos Amazônicos”, “Crisóis” e “Grinaldas Selvagens”. São eles: “Alma do silêncio”, “Dardos de fogo” e a confusa miscelânea de poemas e sonetos a que o poeta não chegara a dar os devidos títulos gerais.
Em “A alma do silêncio”, o poeta como que apura e intensifica a sua ojeriza pelo terrorismo sociopático da urbe moderna ou modernosa; contrapõe-se a ela assumindo uma atitude de suprema indiferença aos valores mundanos em favor do eu espiritual que só se revela ao contato dos elementos primários, como a água e a pedra das cachoeiras, a flor e o cântico soturno das aves nascidas da luz e do mistério que alimenta as raízes do sonho. O mundo do poeta já não é mais o mesmo. Torna-se incompreendido.
Em “Crisóis”, tanto quanto nos “Cromos Amazônicos”, o poeta sente-se à vontade em dar expansão ao estro temático que o liga às nascentes perpétuas do amor telúrico e da fábula racionalista. Mais neste, porém, do que naquele, o vate amazônico “pensa” tanto quanto se inclina e se rende aos encantos da natureza.
Em “Grinaldas Selvagens”, com surpreendentes “aquarelas” como este soneto que ele intitula “O sorriso da montanha”, o símbolo da flor já contrasta com os primeiros movimentos articulados à destruição das florestas. Sintomático o uso do plural quando a floresta, a biota, é una pelo simples fato de constituir-se um todo, mas que, obviamente, formado por segmentos, ou seguimentos orgânicos, partes, enfim, da totalidade, sem cujas partes nada representa. Daí, florestas. Saber, sabença, conhecimento lúcido de pajé. O soneto deste livro sob o título “Contra a destruição da floresta” é um grito, como há outros no texto, cuja mensagem atualiza, pari passu, qualquer oportuníssima vontade para rever e para reler Américo Antony à luz das estrofes que se fizeram (e ainda se fazem) nas várias moradas de Jurupari.
Enfim, tudo neste opus corre por conta de uma incurável paixão pelos motivos da mata amazônica, de um, quem sabe, enigmático deslumbramento estético pelo todo que se junta às partes e das partes que celebram a totalidade inexaurível do próprio mito.
A primeira incursão pela obra de Américo Antony se dera por iniciativa do Conselho Estadual de Cultura, com base na Resolução s/n, DE 1975, que resultara neste ensaio de Jorge Tufic – “Américo Antony – O último cisne” (aqui reproduzido sob o título de “Conteúdo e visão geral da poesia de Américo Antony” – publicado na edição n.º 04, ano I, em julho de 1978, do LIVRORNAL (o livro em jornal).
Fazer o inventário e levantamento do acervo, quer inédito ou édito deste grande poeta amazônico, seria essa, com certeza, a preocupação do colegiado, por mais árduo e tardio que fosse o resgate de mais de 600 manuscritos de sonetos e poemas aleatoriamente reunidos em caixas de papelão, pastas e cadernos deixados por ele.
A inclusão do estudo feito por mim, espécie também de relatório apresentado ao Conselho Estadual de Cultura, tem, portanto, a finalidade maior, 1.º de informar sobre as dificuldades encontradas no decurso da pesquisa destes valiosos documentos, e 2.º acolher o referido trabalho que tem forma mais de relatório da comissão designada pelo CEC, do que propriamente de ensaio crítico sobre a poesia de Américo Antony.
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"Quando se sonha só, é apenas um sonho, mas quando se sonha com muitos, já é realidade. A utopia partilhada é a mola da história."
DOM HÉLDER CÂMARA
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