Jaider Esbell
Terá como praça de
parimento, lugar de reivindicação a uma pseudo-invenção a floresta encantada
circum-acreana essa moda definitiva – o Txaísmo?
Salvem os donos da
origem, os guardiões, os representantes, o que viram isso vazar e os que veem
isso avolumar-se sem a menor noção de efeito e dimensão.
ARTE INDÍGENA
CONTEMPORÂNEA EM TEXTO-PENSAMENTO
– O que vem a ser o
Txaísmo?
Pergunta uma
samaúma à outra numa tarde sufocante e turva cheia de material suspenso no ar
que tudo parecia só uma grande cortina de fumaça na Amazônia geral mas abaixo,
em suas sombras havia uma longa-eterna cantoria. As duas árvores-entidades
puxaram esse assunto e tão fora de si estavam que não mediram os tons de suas
palavras e o assunto-assuntos ecoou certeiro como uma flecha de revelação
banhada de vida e morte. Continha em si todo o espetáculo e tudo veio dúbio, no
mínimo plural, meta-trans….. e reticências ou et …all, o sem termo geral de
cada cultura.
O assunto ecoou com
o feito do encanto e o primeiro lugar que resvalou foi em Brasília nos espelhos
dos prédios de vidro que poderia ser e é qualquer lugar, de qualquer mundo.
Resvalou nos espelhos d’água da capital federal de onde igualmente evapora e
seca a água da vida com a grande seca mundial da qual todos padecemos ante a
grande agonia do local.
– O que vem a ser o
Txaísmo?
Riam as
árvores-vovós sobre o tema do momento e dito estava também, nesse farto
gargalhar tão pertinente, que a indagação nunca poderia perder o bom humor,
visto que; entre as coisas mais simbólicas e autênticas que nós, os Taxístas
temos, é essa capacidade de rir antes do fim. Rir por fim, rir por mim, rir por
sim, por não ou por talvez, rir de si, rir daquilo ali, rir daquele outro, rir
do ontem, rir do amanhã, rir da falta de comida, rir da dor, rir da beleza, rir
do desemprego, rir da feiúra, rir do roubo, rir da trairagem, da sacanagem, rir
da apelação, rir da aberração, rir do deboche, rir da pussanga, rir do feitiço,
rir da magia, rir da cor, rir da putaria, rir da ciência, rir da colocação, rir
do Curriculum lattes, do latido do cachorro, rir do mestre, da mestra, rir até
sumir, rir e a ordem é sorrir e sorrindo todos os bichos estavam pois talvez o
Txaísmo seja uma forma extravagante de felicidade descabida, coisa mesmo de um
transe-transitório, uma transitoria para um mundo logo ali dentro da gente.
– O que vem a ser o
Txaísmo?
Um assunto
relevante para um monte de gente envolvida, assunto de gente evoluída, gente
devolvida, gente vomitada, gente inventada, gente despejada, gente ameaçada,
gente curada, gente cagada, gente mijada, gente cortada, gente costurada, gente
morta, gente ressuscitada, gente suscitada, gente excluída, gente incluída, gente
vigiada, gente dentro d’água, gente no caucho, gente trepada na castanheira,
gente coberta de folhas secas, gente enfeitada de folhas verdes pequenas, gente
de pé descalço, gente-fogo, gente-luz, gente em cada canto do infinito, gente
do pé virado para trás, gentes fumando tabaco, gentes fumando outras folhas,
gentes que não fumam nada, gente que prefere chá, gente que não toma nada,
gente sem vergonha, gente sem casa, gente sem amor, gente sem pastor, gente
reprovada, gente aprovada com louvor, gente doutor, gente pião, gente trans,
gente sã, gente possuída, gente serva, gente incomum, gente-bicho, gente
planta, gente ateu, à-toa, gente de boa, gente que sente calor e gente que
sente frio estando ambos no mesmo lugar quando tem um que pega piolho e o outro
que não pega nada pois é panema. Gente que não é mais gente, gente que nunca
foi gente. Gente nascendo, gente decadente, gente inteligente, gente!
– O que vem a ser o
Txaísmo, pai?
Segurava em suas
mãos trêmulas o pai de família um boleto. Estava tão descabido em seu vazio
avassalador aquele homem cheio de desesperança que assustou-se com a pergunta
do filho a quem nem reconheceu pois o menino que antes era bonito chegou todo
arrepiado da escola decadente e o pai teve um passamento e caiu desmaiado de fome
e o boleto ficou suspenso serpenteando no vento. Ficou no ar assim como caiam
calmamente as folhas das embaúbas quando ainda havia equilíbrio, quando ainda
havia floresta, quando ainda havia tempo, quando ainda havia amor, quando ainda
havia compaixão, quando ainda havia pureza, quando ainda havia respeito, quando
ainda havia peito, quando ainda havia malícia, quando ainda havia polícia,
quando ainda tudo era uma delícia, quando ainda havia limites, quando ainda
havia fronteiras, quando ainda havia porteiras, quando ainda havia ortografia,
grafia, quando ainda havia deusas invisíveis, quando ainda existia magia,
quando ainda havia portais, quando ainda havia bons jornais, quando ainda havia
trens, quando ainda havia bichinhos de pedras, quando ainda havia diamantes nos
rios, quando ainda havia araras voando alto e cantando para simplesmente
cantar.
A filha chegou toda
contente da escola e a merenda escolar havia sido:
– Crianças, hoje
não teremos merenda. (Disse a merendeira corroída por dentro pois sabia que
aquilo era a parte mais dolorida da corrupção, ter de ver as crianças com fome
pois o desvio se estabeleceu, o tempo mudou e fome é fome em qualquer tempo)
– De volta à
realidade a criança menina chegou em casa e para a mãe disse:
– Mãe, hoje tenho uma
tarefa especial!
A mulher sonhadora,
sofrida e feliz refez o seu astral e se entregou toda em amor para saber o que
de novidade havia trazido a filha de casa para a escola.
– Maínha, a
professora passou como tarefa de casa hoje fazer uma redação.
A mãe segurava um
agulha pois estava costurando a barra de seu próprio vestido que estava se
soltando e toda vez que ia no roçado ficava se enroscando nos espinhos do
caminho.
– E foi minha
filha? E o sobre o que a professora pediu para escrever?
– Maínha, a professora,
é uma professora nova, ela chegou agora, é uma professora que veio trabalhar na
escola. Ela veio de São Paulo e ela escutou falar sobre o Txaísmo e ficou tão
curiosa que passou esse tema de redação para toda a turma.
– Maínha, eu não
sei como escrever. A Senhora pode me ajudar a entender e a escrever sobre o que
é o Txaísmo?
Antes da menina
terminar de falar a mãe de tão nervosa furou o dedo com a agulha e o vermelho
vivo do sangue de mais aquela violência foi descendo lentamente e ganhando
volume indo aos poucos preenchendo de um tipo especial de vida os riachos e foi
indo dar nos igarapés até passar no centro de Rio Branco, por onde passa o rio
Acre e indo embora no rumo do mar onde entrou o sangue da mulher no mar e foi
assim que o assunto Txaísmo ganhou o mundo todo depois de evaporar no
aquecimento global foi para o infinito. O assunto, os feitos, os defeitos, os
entre-termos, os deslocamentos, os fluxos sobre os gêneros, as distâncias de
mundos, os ambientes de fala, os ângulos de perspectivas, as submissões, as
missões, admissões, as demissões as di,bi,tri-polimensões e as fotografias
culturais da imagem do homem e da mulher, da imagem das transgenias, das
filosofias, dos estudos mais avançados sobre a redação, sobre o que se coloca
nas folhas de papel e como isso é lido. Sobre o que se ensina e sobre o que se
fala, sobre o que se canta, de como se encanta, coisas sobre o caráter, coisas
sobre a falta dele, coisas sobre passar fome, coisas sobre ganhar dinheiro às
custas dos outros, sobre os segredos e sobre as sociabilizações, socialidades,
ausências, preenchimentos e não-lugares coisas sobre as origens das coisas,
coisas sobre os segredos e mistérios, sobre religiões e espiritualidades, sobre
empoderamento, coisas sobre intrigas tribais, sobre amores divididos, sobre
inteireza do ser, sobre a visão-ação da mulher, sobre esse ser-poder e seu
efeito central no equilíbrio mundial e da família, sobre o modo de plantar a
banana, sobre o tempo de colher a banana, como a temperatura do fogo na panela,
sobre as coisas ideais a se botar nos livros, sobre a nova juventude, sobre a
nova inquietude, sobre a nova nomenclatura, sobre antigas queixas, tudo sobre
os queixadas, sobre os macacos, as macacas, sobre os filhos e netos dela, sobre
tudo e sobre nada foi escrito na redação da menina e o mundo, aquele mundo
específico se acabou por si só mais uma vez e outro mundo veio em ressurgência
com a miçanga, com a escultura, com a arte do silêncio regenerador e por si só
foi para os livros e tudo voltou em outra forma, de outro modo e outro jeito de
ser e lá vinha a mesma novela-ladainha da vida grandiosa feito vidinha de poder
e preenchimento para nunca acabar o põe-tira da vida esse puxa-encolhe
enganador maravilhoso.
– Mas de fato, o
que é o Txaísmo?
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"Quando se sonha só, é apenas um sonho, mas quando se sonha com muitos, já é realidade. A utopia partilhada é a mola da história."
DOM HÉLDER CÂMARA
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