segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

O SERINGUEIRO E A BALANÇA

 Vini du Mont.


Desde o dia em que o Pinheiro me passou um quilo de pregos de 700 gramas, eu fiquei conhecendo o peso da terra, que segundo me informou este comerciante pesa........6.595.000.000.000.000.000.000 de toneladas, tendo sido pesada pelo Dr. Heyl, físico americano, pelo sistema de atração e gravidade.
À medida que a estupefaciente lição do matemático, brotava em ensinamentos profundos, de seus lábios cheios de erudição, senti que o pacote de pregos que sustinha, aumentava sensível e gradativamente as suas 300 gramas faltosas e me internei na convicção, de que as 700 gramas deveriam ser mesmo 1 quilo, bem pesado.
Mas, diz a sabedoria popular, que: “não hai primeiro sem segundo.” Foi partindo deste princípio axiomático, que o Pinheiro foi dar a mão a palmatória a certo seringueiro do Tarauacá.
Subia no “Palhoça” tocado da mais risonha das sortes; os “princípios” choviam, o regateio auspiciava-se rendoso. O Montefusco vendia ao rendeiro ou o George e o Pinheiro recebia a borracha sempre pesada pela célebre balança regulada, pelo sistema da atração. Às praias tantas, encostou em uma barraca não tardando que o seringueiro aparecesse.
– Então amigo, não tem nada para mim?
– Um princepesim...
Daí a momentos o seringueiro trazia uma borracha que no seu cálculo, pelos “frascos”, daria alguma coisa. Foi posta na balança mas oh! surpresa... – 10 quilos!
– “Seu” Pinheiro num haverá engano? disse o seringueiro coçando a orelha e desconfiado com o mérito do princípio em relação com o vulto.
– Você não está vendo?... e mal pesado!
– Tá déreito “seu” Pinheiro, nem hai dúvida, vamos liquidá. Dê-me uma garrafa de cachaça, um litro de sal, uns metros de pano e um quilo de bolachas.
– Pois não, respondeu o Pinheiro, botando as bolachas numa balança que retirou dum caixote.
– Não “seu” Pinheiro, adiscurpe... eu vendi nesta outra balança só compro se fô na mesma.
– Mas...
– Não sinhô, me faça o biséque de pezá nesta onde pezamo a burracha...
Não havia remédio, as bolachas foram transferidas para a outra balança e o seringueiro arregalou os olhos no rumo do ponteiro.
E haja o Pinheiro a botar bolachas e mais bolachas. Esvaziou o conteúdo de uma caixa. Raspou o fundo de uma barrica, lançou mão dum bocado que levava como rancho, e o ponteiro nada! mandou que o Theófilo retirasse nova barrica do porão, despejou um montão na balança, foi quando, o ponteiro afinal, alcançou a meta...
– Pronto “seu” Pinheiro, chegou... 1 quilo! Disse o seringueiro radiante, ao mesmo tempo que botava a cabeça na direção da barraca e gritava:
“Meu fio, traz daí dois saco p’ra carregá bolacha!”


O MUNICÍPIO, Tarauacá-AC, 8 de março de 1931, Ano XXII, N. 822, p.1
* Título nosso. No original CONVERSAS DA FELIPÉA.

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