segunda-feira, 20 de novembro de 2017

HISTÓRIA DE “CARRAPICHO” E OS DESBRAVADORES HOMENS DO CAN NOS CÉUS DO ACRE E DA AMAZÔNIA, NAS ASAS DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA

Gilberto A. Saavedra – Rio de Janeiro

TARAUACÁ – AC (Palco da escrevedura)
Município brasileiro do Acre com o nome de origem indígena, com o significado de “rio dos paus e das tronqueiras”.

HISTÓRIA DE “CARRAPICHO” E OS DESBRAVADORES HOMENS DO CAN NOS CÉUS DO ACRE E DA AMAZÔNIA, NAS ASAS DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA.

Esta é, apenas, um pouco da história de José Galera dos Santos; homem do povo que, ficou carinhosamente conhecido no município de Tarauacá – Acre, como “CARRAPICHO”, personagem folclórico da cidade.

Um cidadão brasileiro simples, que deu o seu nome ao aeroporto dessa hospitaleira cidade acreana.

Há 40.139 habitantes em Tarauacá (Ano – 2017 – estimativa IBGE).

A distância entre Tarauacá e Rio Branco, capital do Acre é 409 Km (por estradas) e 384 Km em rota aérea (linha reta).

Mas o que fez esse brasileiro de tão relevante em Tarauacá e, em que época, para que merecesse ter o seu nome (ele tinha o afeto do povo) no aeroporto da cidade?

Sabe-se que, ele chegou ao município para uma apresentação circense, mas que, resolvera ficar nesse novo lugar.

Para melhor entender esta época, contarei essa história desde o seu início, com todos os seus coadjuvantes importantes que, conviveram esse período.

Eu, tive o aprazimento de participar desse memorável tempo, em meados dos anos de 1950, durante os meus 6/7 até os 8 anos de idade em Tarauacá.

Por isso, eu me considero, uma testemunha ocular que (depois de adulto), pesquisei para melhor entender, o que eu na qualidade de uma criança, jamais poderia compreender uma parte dessa bela história patrocinada pelo legendário “Carrapicho”.
Carrapicho. Foto: Blog Tarauacá Notícias
Mas, para falar desse famoso personagem de Tarauacá e de sua história, eu não poderia deixar de fora a imprescindível atuação da aviação aérea (civil e militar) no Acre.

Em especial à FAB (Força Aérea Brasileira) e suas tripulações do CAN (Correio Aéreo Nacional), pois foi o desvelo de Carrapicho (durante anos e anos), a esses bravos aviadores nos céus acreanos, em especial ao da FAB que, fez nascer essa marcante história.


AMAZÔNIA E O TRANSPORTE FLUVIAL

Todos nós sabemos que, o Brasil é um país de dimensão continental; o espaço de norte a Sul é de leste a oeste é imenso.

O isolamento de um lugar distante, a um centro mais desenvolvido, sempre foi, e ainda é, um grande problema, principalmente àquelas pessoas que vivem na Amazônia isoladamente em povoações ribeirinhas.

Nessa região, por exemplo, em uma grande parte dessa imensa extensão de terras, na data atual (2017), ainda predomina essa exclusão social.

O transporte fluvial, como o único meio de interligação, foi e é ainda essencial para essa região, através de sua gigantesca bacia de hidrovias, porém, muito lento e sem o amparo vital à navegação.

Em muitos casos, há um transporte sem conforto (a maioria); sem privacidade; capacidade de passageiros acima do permitido, ocasionando incontáveis vezes o naufrágio da embarcação.

Devido o gigantesco tamanho da Amazônia, chegar ao destino era e continua (não mudou nada) um sacrifício para quem precisava viajar.


ISOLAMENTO DO INTERIOR DO ACRE COM RIO BRANCO - CAPITAL

Antes da criação de campos de aviação no Acre, todo o interior do estado era completamente isolado da cidade de Rio Branco, capital acreana.

O único meio de transporte daquela época era o que lhe fora dado pela mãe Natureza, o fluvial.

Mas como os rios acreanos (a maior parte), correm entre si paralelamente em seus leitos, em direção ao rio Solimões, a longinquidade entre capital e interior, torna-se difícil e longa.

Esse empecilho fluvial, criado pela geografia da natureza do Acre, provoca um transtorno ao estado.

Exceto aos municípios de Brasileia, Xapuri, Epitaciolândia, Porto Acre e Assis Brasil, todos banhados pelo rio Acre, o mesmo da capital.

Havia escassez de gêneros de primeiras necessidades.

Alimentos importados, remédios; além de não ter como deslocar rapidamente um paciente enfermo para um centro mais desenvolvido.

O abastecimento fluvial lento procedente de Belém (mas fundamental), era, e é ainda realizado durante às cheias dos rios.

A implantação de um transporte aéreo (tão sonhado pelos acreanos), era necessário para o escoamento de produtos básicos ou à remoção rápida de pessoas doentes que careciam de um tratamento de saúde mais prudente em Rio Branco ou no Sul do país.


TAQUARY – PRIMEIRO AVIÃO EM RIO BRANCO

Só a partir de 1936, o primeiro avião chega ao Acre.

Era um hidroavião (equipado com dois botes); ele realizou uma amerissagem (pouso de aeronave em superfícies aquáticas) no rio Acre, na capital acreana.

Seu nome: TAQUARY (batizado pelo povo), um avião monomotor modelo Junkers-W-34 de fabricação alemã.

Na chegada da aeronave, houve uma grande recepção por parte das autoridades locais e o povo, em geral, já ansioso, por causa de frustrações anteriores, quando um avião anfíbio da Panair, programado para amerissar no rio Acre, mas não o fez.

Passou duas vezes voando bem baixinhos por cima das cabeças das pessoas que, estavam às margens do rio à espera do avião.

A aeronave ganhou altitude, seguiu um estirão no espaço e sumiu no horizonte, para decepção de todos os presentes ao ato. (Fonte jornal “O Acre” da época - 1936.)

Embora o avião Taquary da Condor tenha chegado primeiro ao Acre, mas quem inaugurou a primeira linha aérea com roteiro fixado (de 15x15 dias) de Rio Branco ao sul do país foi a Companhia da Panair.

A Condor depois da Segunda Guerra Mundial passou a se chamar Serviços Aéreos Cruzeiro do Sul com grandes serviços prestados ao nosso estado, Amazônia e ao país, juntamente com a Panair e Vasp.

Um ano depois (em 1937) do avião Taquary chegar ao Acre pela primeira vez, é inaugurada a primeira pista de pouso de Rio Branco pelo o novo interventor Manoel Epaminondas Martins, sonho que Martiniano Prado não conseguiu concretizar (já tinha ido embora do Acre) pois até então, só os aviões do tipo anfíbio chegavam a Rio Branco, capital do Acre.

Os trabalhos iniciais desse campo de aviação, foram executados por um mutirão de acreanos que, atenderam de livre e espontânea vontade ao chamado, ainda (em 1935) no governo do interventor federal Martiniano Prado.

Tempo depois, foram implantadas várias pistas de pouso pelo o interior do estado do Acre.

Foi um grande acontecimento naquela região do Acre, trazendo proveitosos benefícios para o povo interiorano com tamanha rapidez, até então considerados impossíveis sem o avião.

Mas o maior benefício para o acreano, estava por vir.


CAN (CORREIO AÉREO NACIONAL NO ACRE)

No ano de 1947, o CAN inicia os seus voos para o então Território Federal do Acre.

O roteiro da linha faz ligar as seguintes cidades: iniciando pelo Rio de Janeiro - São Paulo - Três Lagoas - Campo Grande - Cuiabá - Cáceres - Vila Bela - Forte Príncipe - Guajará Mirim - Porto Velho - Rio Branco - Sena Madureira - Feijó - Tarauacá - Cruzeiro do Sul - Xapuri e Basileia.

Com o surgimento do CAN (Correio Aéreo Nacional) ao Acre, o interior ficou ligado quinzenalmente a Rio Branco e ao Sul do país, graças ao então Major Eduardo Gomes, depois, Marechal do Ar e, como Brigadeiro, um dos mentores dessa idealização (do CAN), sendo proclamado pelo elogiável feito, como o “Patrono da FAB”.

Os aviões que chegavam faziam uma escala de 15 em 15 dias, pelo o interior do Acre, transportando cargas (de qualquer tipo); remédios; assistência médica e livros para os municípios, além de passagens grátis para os mais desprovidos de recursos.

Atualmente (2017), a maioria dos municípios estão interligados entre si pelos tráfegos aéreo e rodoviário.

Aproveito essa narrativa, para chamar a atenção, de novos brasileiros (jovens), que desconhecem os importantes serviços prestados à “Pátria”, por esses valorosos homens do ar.

Imbuídos dos melhores propósitos deram às suas vidas durante muito tempo, uma missão de valor na sociedade (ajudando os mais necessitados), sem sombra de dúvidas, numa causa nobre que merece o reconhecimento dos brasileiros.

Muitos foram acometidos de patologias endêmicas da região (malária; infecções associadas à água como hepatite ou febre tifoide; verminoses e a leptospirose); além das mortes em acidentes aéreos, nas quedas dos aviões durante essa espinhosa missão de desbravar o interior brasileiro.

Um lugar sempre esquecido pelo poder público da União, voltado somente, sempre para a extensa costa marítima (litoral), deixando a gigantesca Amazônia num abandono total.

Mesmo com poucos recursos (instrumentos) técnicos de bordo, esses aviadores cumpriram essa grande façanha de integração nacional nas asas da FAB, tendo como orgulho da aviação, um brasileiro - Alberto Santos Dumont, “O pai da aviação”.

A Aeronáutica através de suas aeronaves da Força Aérea Brasileira prestou um fundamental serviço aos irmãos brasileiros do interior de nossa nação, com os voos dos seus aviões anfíbios PBY Catalina – o ‘pata choca’ (desde 1958) e o Douglas C-3 e 47 do CAN (Correio Aéreo Nacional) num trabalho incessante e primordial, de extrema essencialidade ao Brasil, principalmente à nossa gigantesca Amazônia.

O povo acreano no gesto de agradecimento à FAB, pelos seus voos nos céus do Acre, homenageou os homens do CAN com a seguinte frase.

 “CORREIO AÉREO NACIONAL:
GLÓRIA PACÍFICA DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA.”

Também foi de suma importância para o Acre e Amazônia os serviços aéreos das extintas companhias da Cruzeiro do Sul, da Panair do Brasil e Vasp, as quais também operavam em suas linhas os Catalina e os DC-3 e C47.

CARRAPICHO E OS DESBRAVADORES AVIADORES DO CAN NOS CÉUS DO ACRE

Um homem brasileiro, modesto, chamado de José Galera dos Santos que, com sabedoria, reconheceu logo o grande e espinhoso trabalho dos bravos homens do CAN.
Carrapicho. Foto: Blog Tarauacá Notícias
Um artista de cenas circenses, desses muitos que vagueiam pelas plagas interioranas, mostrando o seu trabalho para sobreviver e angariando plateias, principalmente dos mais jovens ou crianças.

José Galera ao chegar a Tarauacá, conseguira tudo isso: carinho; amizade e o respeito do taraucaense, pela sua despretensiosa arte como artista de circo, mas de profícua relevância cultural para o município.

José Galera, apaixonou-se tanto pela cidade que, resolvera ficar.

Ficou e não foi mais embora do novo lugar.

Rapidamente se tornara uma pessoa querida em Tarauacá, pelo seu modo reverencioso com todos.

Já como funcionário do aeroporto de Tarauacá na função de guarda campo da pista de pouso, carinhosamente chamado de ‘Carrapicho’.
Com o seu jeito alegre, brincalhão e inteligente, não perdeu o ensejo de homenagear os aviadores do CAN quando de suas chegadas em Tarauacá de quinze em quinze dias.

Com o mínimo de tempo de estadia da tripulação no aeroporto, Carrapicho, sagazmente, fazia a festa no próprio ambiente, durante o tempo necessário do desembarque e embarque das cargas da aeronave.

Eu como testemunha ocular, de uma parte dessa bela história em meados dos anos de 1950/2/3, ainda criança, tive o prazer de conviver com uma parte desse magnífico tempo patrocinado pelo carismático ‘Carrapicho’.

Na data da chegada do avião, lá estava eu (ainda garoto), mas me recordo como se fosse hoje, das brincadeiras do Carrapicho com suas pernas de pau, o megafone ou sua corneta, cantando e brincando com o público; às vezes com o seu tradicional uniforme da Aeronáutica, com suas medalhas no peito.

O aeroporto, também ficava repleto de pessoas para saber quem chegava e quem partia; a recepção aos aviadores era calorosa.

Tarauacá era governada pelo o então Prefeito Municipal Arnaldo de Farias; esposo da professora Creusa.

Ainda me lembro dos nomes de algumas famílias tradicionais: muitos árabes (turcos, sírios, libaneses), etc. Nagip, Said Bachir da Casa Samaritana; F Baima; Muni Bissot; Raimundo e Humberto turco; Jose Higino; Jofre Catão e sua farmácia; Leal; Pedro Correia; família do Jonas Lopes (da padaria) B. Roque; Baima, etc.

José Galera preparava um grande banquete à tripulação da FAB.

Uma farta mesa de refeição com doces e o cardápio da cidade, além das mais variadas frutas da região, incluindo o gigante e gostoso abacaxi de Tarauacá; uma grande bancada cheia de iguaria apetitosa que, dava água na boca de qualquer um dos visitantes ao evento.

Com o calor dos participantes ao ato de boas-vindas, todos se envolviam nessa festa quinzenal.

Carrapicho sendo um atendente solícito, logo ganhou uma grande admiração das tripulações da FAB que, dirigiam o CAN no Acre.

E assim, durante anos e anos, ele foi estimado por todos do CAN na passagem por Tarauacá.

Carrapicho, no decorrer de sua vida, foi condecorado várias vezes pela tripulação da FAB.

Foi homenageado com a Comenda (medalha) Brigadeiro Eduardo Gomes, pelo seu tratamento cordial com os homens do CAN no município de Tarauacá.

Tempo depois, a Força Aérea Brasileira prestou uma homenagem ao Carrapicho, pelo seu elogiável trabalho e o carinho aos integrantes do Correio Aéreo Nacional, o que lhe rendeu uma medalha de “Amigo da FAB”.

Numa demonstração de mesura ao Carrapicho, a FAB resolvera trazer ao Acre os aviões da Esquadrilha da Fumaça.

As aeronaves fizeram emocionantes acrobacias nos céus de Rio Branco e em Tarauacá.

O espetáculo aéreo contou com a participação de Carrapicho de dentro de uma das aeronaves da FAB.

Nessa época da Esquadrilha da Fumaça, a minha família já estava em Rio Branco, mas do chão, eu presenciei as piruetas aéreas da FAB.

Jose Galera dos Santos o Carrapicho, é considerado, como o maior incentivador cultural de Tarauacá. Nunca deixou de anunciar os espetáculos (arte e cultura) com o seu megafone.

Em 2009, a rádio Nova Era – FM, de Tarauacá, instituiu em sua homenagem o prêmio Carrapicho de cultura, agraciado aos que mais se destacam nas artes no município.
Carrapicho em desfile cívico. Foto: Blog Tarauacá Notícias

Um comentário:

  1. Boa noite, morei em Tarauacá entre 1973 e 1975, qdo meu pai foi gerente do Banco da Amazônia, somos em 5 irmãos, sendo que meu pai Luiz Rodrigues da Cruz, faleceu em 02/2005 de parkinson e alzheimer, minha mãe Lélia Rodrigues da Cruz, também já é falecida, desde 02/2020 de alzheimer, atualmente moro em Curitiba-Pr, e me lembro como se fosse hj, do saudoso José Galera dos Santos (carrapicho). Lendo essa histório me veio na lembrança muitas coisas que vivemos nessa época que moramos ai, são meus irmãos (Luiz Rodrigues da Cruz Júnior, Domingos Soriano da Cruz Neto, Lélio Rodrigues da Cruz, Margareth Rodrigues da Cruz e Celeste Rodrigues da Cruz).

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