terça-feira, 29 de novembro de 2011

MAQUIAVEL: O DIREITO E A FORÇA

Profª. Luísa Lessa*


Folha de rosto da edição de 1580,
do Príncipe de Maquiavel
Vive-se um período de incertezas, conturbado por escândalos políticos. E em meio aos fatos veiculados, sente-se temor pelo que possa acontecer ao Brasil. E nesse mar de incertezas, especialmente no que tange ao poder dos homens sobre outros, um caminho é ler “O Príncipe”, onde Maquiavel fornece explicações para muitas indagações atuais.

A primeira indagação: o que é governar? “O Príncipe” responde: Governar é optar. E esse ato de escolha necessariamente favorece alguns e prejudica outros. Todo segredo da arte política consiste nisso: inventar um mecanismo de decisão que gere mais favorecidos do que prejudicados. Esta constatação remete a outra: política é conflito, luta, antagonismos, enfrentamentos. Numa palavra, política é guerra, violência. Pode até ser pacifista, mas não pacífica. Isto é, pode ter a paz como objetivo, mas não como meio.

Maquiavel ver a política como uma guerra, não porque as pessoas vivem se matando umas às outras, mas porque vivem num constante enfrentamento de interesses. Esses interesses são agrupados por partidos. Os partidos têm “militantes”. A guerra tem ‘militares’. Nos dois casos, a luta é comandada por uma “milícia”, isto é, por combatentes. Uma vez que a política se rege pela lógica da guerra, tem em vista destruir os interesses do outro e dominá-lo.

Em face do que se disse, até então, mais uma pergunta: O que é política? A política é uma singular relação humana na qual uma parcela de pessoas exerce o poder sobre e contra outra parcela. Logo, poder político é violência e opressão, sempre. Vêm-se fatos violentos e opressores todos os dias. Não há como fugir deles no atual sistema, quando uns oprimem outros.

O que determina o poder de um sobre outros, a força de uns sobre outros? Novamente ‘O Príncipe” responde: o que determina o poder que um indivíduo exerce sobre o outro, o poder que um partido exerce sobre a sociedade, o poder que o Estado exerce sobre a coletividade, é a força relativa de cada um. O Estado é mais violento do que o indivíduo, porque reivindica o monopólio da força legítima. “Legítima”, eis o problema do “direito” de oprimir. A violência praticada por um indivíduo sobre outro é punida pelo Estado em base ao “direito”.

Onde se funda o direito do Estado? Unicamente no fato de monopolizar a força. O que limita esse direito? A força de fato dos indivíduos. Do mesmo modo, os direitos dos cidadãos são determinados por suas próprias forças e limitados pela força do Estado. Isso significa que o poder do Estado é absoluto de direito, mas não de fato, pois é limitado pela força dos indivíduos. Igualmente, o poder político é opressor, mas a opressão é finita.

Maquiavel traduz essa luta por meio de uma metáfora. Segundo ele, “existem dois gêneros de combates: um com as leis e outro com a força. O primeiro é próprio do homem, o segundo dos animais” (O Príncipe, cap. XVIII). As leis, isto é, o “direito”, se fundamenta na força. O homem se assegura no animal. O racional é sustentado pelo irracional.

Uma vez que é imprescindível o emprego da força, isto é, da natureza animal, Maquiavel sugere “escolher a raposa e o leão, porque o leão não tem defesa contra os laços, nem a raposa contra os lobos. Precisa, portanto, ser raposa para conhecer os laços e leão para aterrorizar os lobos. Os que fizerem simplesmente a parte do leão não serão bem-sucedidos” (O Príncipe, cap. XVIII). A força não é bruta. A verdadeira força é aquela que vem somada à astúcia. O poder do Estado não está no número de militares ou de armas. Está nos ardis que emprega para universalizar as escolhas parciais que toma. A verdadeira força está na raposa, não no leão.

Entenda, pois, o leitor, que a metáfora do leão e da raposa quer dizer o seguinte: Tendo, portanto necessidade de proceder como animal, deve um príncipe adotar a índole ao mesmo tempo do leão e da raposa; porque o leão não sabe fugir das armadilhas e a raposa não sabe defender-se dos lobos. Assim, cumpre ser raposa para conhecer as armadilhas e leão para usar a força. Logo, um príncipe deve usar mais a cabeça do que a força, ou seja tem que usar mais a esperteza da raposa do que a força do leão.

Ainda, para Maquiavel, a violência política é dissimulada. A raposa disfarça, aparenta estar morta. Soldados e tanques escancaram a opressão. Revelam a face odiosa da violência e alimenta a revolta. A ostensiva demonstração de força acaba por mostrar-se fraqueza. O leão fica preso nos laços. É preciso a raposa para soltá-los. É necessário habilidade para dissimular a violência da força bruta.

***

* Pós-Doutora em Lexicologia e Lexicografia pela Université de Montreal, Canadá; Doutora em Língua Portuguesa pela Universidade Federal do Rio de Janeiro; Mestra em Letras pela Universidade Federal Fluminense; Membro da Academia Brasileira de Filologia; Membro da Academia Acreana de Letras.

** Publicado originalmente no Site Gosto de Ler.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

RIO BRANCO – UMA DOCE CIDADE

José Augusto de Castro e Costa*
Pensei que a possibilidade
De rever minha cidade
Já estivesse lá pras bandas do nunca mais!!!

Seria demais!
Para ser franco,
Jamais rever Rio Branco
Seria mais um castigo a mais.

A sina revogou, no entanto:
Rodou à acreana
Pisou no tamanco...
E cá estou eu,
Trazendo comigo um montão de saudade!
Uma tremenda saudade
Que Rio Branco jamais havia visto,
Ou mesmo previsto
Que nos reveríamos de verdade.

Onde estão as catraias?
As cansadas catraias
A levar em seu bojo
Um cravo ligado nas saias
Das moças da terra...
Belezas das praias,
Das águas geladas.

Da doce Judia,
Ressacas curadas
Com encanto e alegria
E muita magia...
E bote magia!

E onde as serestas...
E onde as festas
E seus doces finais?
Um ortopedista a cantar
Um coelho galã a dançar...
Isto já não se vê mais!

Nem só viola ia à festa,
Mas pra fazer uma seresta
Na casa de algum fulano,
Ia Zé Paulo e o banjo, Crescencio no trombone,
O Deca no saxofone,
Ia até eu no piano!!!

Mas hoje a cidade é outra, está linda !
De cidade até tem mais pinta,
Não se anda mais a esmo.
Teu romantismo acabou
Minha querida Rio Branco.
A tua roupagem mudou,
Mas teu espírito é o mesmo.

***

*José Augusto de Castro e Costa reside em Brasília, e compôs esses versos impulsionado pelo seu primeiro reencontro, depois de mais de quatro décadas, com a cidade de Rio Branco, sua terra natal.