domingo, 30 de janeiro de 2022

ERIYA - Álbum Completo

Álbum de estreia de Eriya Yawanawá, interpretando canções Yawanawá (Saitys Yawa) e Ashaninka.

Eriya é natural da aldeia Mutum, Terra Indígena Rio Gregório - Acre/Brasil. Filha da união matrimonial entre lideranças dos povos Yawanawá e Ashaninka, herdando dos pais a riqueza cultural desses povos.

Performance gravada no estúdio Sananga Records.

Produção: Jairo Lima & Cristiane De Bortoli

Mixada e masterizada por Jairo Lima.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2022

TRÍPTICO DO ESPANTO

Alencar e Silva (1930-2011)

 

I

 

Tudo traz sob a pele a sua morte:

a rosa e o sonho dançam sobre o abismo

as formas de uma só fatalidade

trabalhada em equívocos. Sereno,

contudo, é o meu semblante: este e o mesmo

que passeio entre as gentes. A amargura

é disposta em murais pelas paredes

do eu profundo – e me espia. Duro é vê-la

contemplando os meus gestos: de seus olhos

flui um rio de sono, um rio sem barcos,

onde bóia meu rosto repartido

em cartazes de espanto... Chove cinzas

sobre as asas de uma ave: e o canto, ausente,

talvez mudo se cumpra eternamente.

 

II

 

Amargar o teu peso e nunca mais

o sorriso que vem de não saber-te,

de ignorar teu mistério, de sentir-te

no que apenas supomos e não és.

Ah! o riso não cabe – e é vão o gesto

para colher o sonho decepado:

a mão ergue-se fria contra o vácuo

onde as sombras tropeçam seus enganos.

Nunca mais – e nos olhos e nas mãos

uma calma de angústias concentradas

ante barcos inúteis que se vão

sobre as águas do Letes... Resta apenas

a invenção de outros mitos: como um fruto

que um dia secará sobre um chão bruto.

 

III

 

Um rio corre surdo sob as horas

com seu lastro de cinzas e agonias.

Pesa-lhe sobre o curso um astro doido

que governa suicídios e naufrágios.

Uma lua também, por noite funda,

pende a face amarela sobre as águas

onde boiam pesados de silêncio

restos do que já foi – coisas que dormem

ou só derivam na corrente muda

seus corpos, ora belos, ora corpos

de mágoa e medo – sombras penduradas

em vértices de espantos... Nada conta

nesse rio que rola irreversível

carregado de sonho e de impossível.

 

SILVA, Alencar e. Lunamarga. 4ª ed. Manaus: Editora Valer, Governo do Estado do Amazonas, Edua, UniNorte, 2005. p.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

ACRE: FOTOGRAFIAS DO ARQUIVO NACIONAL

Vista de Cruzeiro do Sul, Acre, início do século XX. Fotógrafo Leonel. Arquivo Nacional. Fundo Afonso Pena.

Ponte 17 de novembro, Cruzeiro do Sul, Acre, início do século XX. Arquivo Nacional.

Vista de Cruzeiro do Sul, Acre, 1906. Arquivo Nacional. Afonso Pena. 

Acre, início do século XX. Arquivo Nacional.

Vista de Cruzeiro do Sul (AC), início do século XX. Fotografia de Leonel. Arquivo Nacional. Fundo Afonso Pena.

Ponte 15 de Novembro, Cruzeiro do Sul, Acre, início do século XX. Arquivo Nacional.

Edificação que abrigava a Prefeitura de Sena Madureira, início do século XX. 

Rua Amazonas, Departamento do Alto Purus, Sena Madureira (AC), entre 1905 e 1911. Arquivo Nacional.

Mercado Público de Senna Madureira, Território do Acre, início do século XX. Arquivo Nacional.

Casa comercial em Sena Madureira, Acre, início do século XX. Arquivo Nacional.

Sena Madureira, Acre, início do século XX. Arquivo Nacional.

Igreja de Nossa Senhora da Conceição, antes da delimitação da Avenida Aureliano Chaves, Sena Madureira (AC), 1940. À esquerda vê-se a atual Escola Eliziario Távora. Arquivo Nacional.

Sena Madureira (AC), no início do século XX. Arquivo Nacional.

Instalações da Companhia Regional do Tarauacá, Território do Acre, início do século XX. Arquivo Nacional.

Casa comercial na rua Yaco, Senna Madureira, Acre, início do século XX. Arquivo Nacional. 

Serra circular. Obras federais em Cruzeiro do Sul, Acre, início do século XX. Arquivo Nacional.

Lançamento da pedra fundamental da igreja de Senna Madureira, no então território do Acre, no início do século XX.

Rio Branco (AC), 1940. Arquivo Nacional. Fundo Agência Nacional.

Quartel da Guarda Territorial (atual Quartel-General da Polícia Militar do Acre), Rio Branco (AC), 1940. Arquivo Nacional. Fundo Agência Nacional. 

Instituto Getúlio Vargas (atual Colégio Acreano), Rio Branco (AC), 1940. Arquivo Nacional. Fundo Agência Nacional.

Calçadão da Gameleira, Rio Branco (AC), 1940. Arquivo Nacional. Fundo Agência Nacional.

Palácio Rio Branco, sede do Governo do Acre, em 1940. Rio Branco (AC). Arquivo Nacional.

Companhia regional em preparativos para a parada de 7 de Setembro, Alto Acre, Rio Branco, 1908. Arquivo Nacional.

Farmácia Brasil, em Sena Madureira, "a Princesinha do Acre", no antigo Departamento do Alto Purus, no início do século XX.

Mercado Municipal de Rio Branco (Mercado Velho), Rio Branco (AC), 1940. Arquivo Nacional. Fundo Agência Nacional.

Crianças e professores em frente ao Instituto Santa Juliana, em Sena Madureira, Acre, em 4 de março de 1940. Arquivo Nacional.

Inauguração do hospital de Sena Madureira, Acre, início do século XX. Arquivo Nacional.

Escola Senador Pompeu e obras públicas, Alto Acre, Rio Branco, 1908. Arquivo Nacional.

Escola Pimentel Gomes, Rio Branco (AC), 1940. Arquivo Nacional. Fundo Agência Nacional.

Avenida Getúlio Vargas, Rio Branco (AC), 1940. À esquerda, ao fundo, vê-se o Palácio Rio Branco. Arquivo Nacional.

Militares da Companhia Regional do Tarauacá, Território do Acre, década de 1910. Arquivo Nacional. 

Garotos próximos a uma máquina de cortar aço. Cruzeiro do Sul, Acre, início do século XX. Arquivo Nacional.

Escola Pimentel Gomes, Rio Branco (AC), 1940. Arquivo Nacional. Fundo Agência Nacional.

AMAZONIDADES: gesta das águas, de Marta Cortezão

Zemaria Pinto

palavradofingidor.blogspot.com



Amazonidades: gesta das águas
passa por um livro de poesia, mas é muito mais que isso: é um compêndio de Amazônia, uma súmula do imaginário dessa região que se espraia por nove países e, no Brasil, por nove estados, e agora, em domínios de Castela e Leão, funda um virtual território independente, representado pela poesia de Marta Cortezão.

Ler as trovas de Marta é como remexer uma biblioteca de sonhos, o imaginário amazônico, onde todo o conhecimento do “povo das doces águas” está reunido: os acesumes, as comilanças, as leseiras, as caboquices, os encantados – nossos mitos ancestrais. Marta inventa palavras e, como Drummond, torna outras mais belas: “Apeixono-me de escama / em noite de virar bicho”; “canoei todo um rio-mar”; “O que assaranha uma vida?”; “Sevava palavras cruas”; “e na cólera das horas”; “pois janeirava à tardinha”. São apenas amostras. O leitor poderá “caniçar” outras dezenas de exemplos brilhantes.

Duas linhas de pensamento são recorrentes: a sensualidade e a metalinguagem. Às vezes, elas vêm juntas: “A traquinagem do verso / faz vaginar pensamentos; / então me entrego, de certo, / ao falo afoito do vento.”  As metáforas são sempre construídas com elementos do imaginário: “Pensamentos escamei, / aparei todas as abas, / as cicatrizes limpei / e salmourei as palavras.” E observem o domínio da métrica e das rimas – toantes, inclusive.

Senhora de seus elementos, Marta Cortezão revela-se, sobretudo, senhora de seu ofício.

 

(Orelha de Amazonidades: gesta das águas, de Marta Cortezão)

Disponível para compra  na loja da Editora Penalux

domingo, 9 de janeiro de 2022

TRÊS POEMAS DE TENÓRIO TELLES


ANICCA

 

A qualquer momento

a vida pode se perder

            as certezas podem se desfazer

            o amor pode acabar

 

A qualquer momento

            o pai pode partir

            o filho silenciar

            o amigo seguir

 

A qualquer momento

            o que era certo

            o que era fixo

            o que era belo

 

– Tudo pode acabar

 

A qualquer momento do dia

A qualquer momento da noite

            um sonho morre

            um coração se quebra

            uma promessa se desfaz

 

A qualquer momento

            num instante

            um homem salta no vazio

            uma mulher descobre-se sozinha

            uma jovem sonha-se cinderela

 

A qualquer momento

            um botão

            uma flor

            : pétalas ao vento

 

A qualquer momento

            uma borboleta

            um gafanhoto

            um pequeno inseto

            : caem no ardil da aranha

 

A qualquer momento

            uma ilha desaparece sob as águas

            um barco naufraga

            um trem não chega à estação

 

A qualquer momento

            uma estrela explode

            um cometa salta da escuridão

            um terremoto

 

– Tudo: um hiato --- lapso de tempo

 

A qualquer momento

            o tempo chega

            o corpo fenece

            a esperança falta

            a cortina cai

 

A qualquer momento

 

A qualquer momento

            do dia

            da noite

            da vida

Tudo pode acabar

Tudo pode ruir

 

Tudo pode perder-se

            o amor

            os sonhos

            a ambição

            as certezas

 

Tudo

Tudo

 

A qualquer momento

                                        Pode   não ser

 

A qualquer momento

            tudo

                        tudo

tudo pode recomeçar

 

TELLES, Tenório. Prelúdio Coral. Manaus: Editora valer, 2020. p. 108-115

 

SOLO DISSONANTE

 

vou ao mundo

            laborar os dias

            apascentar os ventos

            respigar os frutos

 

vou ao texto

            aprender as senhas

                                    as veredas do sertão

                                    a fulguração das estrelas

 

a travessia do mundo------enigma impressentido

 

desse barco entrevisto

nas entrelinhas dos teus versos

            sou marujo

            sou tripulante de ulisses

            sou capitão de longo curso

 

navegante dessas águas

            conheço   os arquipélagos

            os cabos   as enseadas

            do teu verbo liquefeito

 

nesse mar------------------céu presentificado

            conheci o promontório

                           onde cantavam as sereias

conheci a ilha

               onde crusoé fundou seu reino

conheci os portos fenícios

                seus piratas e aventureiros

 

voltei ao porto em que menino

            te vi    ao partir

            e

            me acenaste

            com lencinho azul

 

fui ao mundo: nesse grande mar

                                    me perdi       me encontrei

 

                        nessas águas

                                                   contigo

                                                                   naveguei

 

                        nossas falas

                        nossos cantos

 

                                   espumas

 

                                         o        d        s

                                              n        a

 

                        inscrevi teu nome nessa

                                                           página líquida

 

                        pressenti    talvez   a cura

                                    nessa morte

                                                           impressentida

                                    nessa dor

                                    nessa transparência

                                               que prefigura

                                                                       o ser

                                                                       o sendo

 

TELLES, Tenório. Prelúdio Coral. Manaus: Editora valer, 2020. p. 35-37

 

BUSCA

 

Navegante de mim mesmo:

– mar inconsútil de lembranças

            do que fui

            do que poderia ter sido

            : desse sendo que sou

 

Tudo o que perdi:

            os sonhos da infância

            o pai que não chegou ao porto

            as primeiras dores

            a descoberta da vida

            a descoberta da morte

 

os seres lendários das matas

os encantados do rio

os amores que não se cumpriram

as flores que não se abriram

os poemas, os livros que sonhei

a esperança que não floresceu

os amigos que partiram

 

[– Tantas promessas perdidas:]

 

O que não fui e perdi

renasceu no que sou

– matéria do meu canto

– flores do meu jardim

 

Sou essas pedras

            essas flores caídas

            esses sonhos inconclusos

            esses amores partidos

            esses poemas sem voz

            esses livros sem história

 

Sou esse mar e seus náufragos

            esse céu sem estrelas

            esse deserto florido.

 

TELLES, Tenório. Canção da esperança & outros poemas. 3ª ed. Manaus: Editora valer, 2020. p. 53-61