quinta-feira, 29 de outubro de 2015

CANÇÃO PARA O MEU TEMPO

Eduardo Alves da Costa


Não peças ao poeta
uma canção discreta
num tempo de conquistas
e loucuras.
Para a liberdade
ou para a morte:
é que o mundo caminha:
e isto requer estrutura.

Quando te aproximas
segurando o copo, em pose estudada,
tenho vontade de te dar um murro
para que acordes no século vindouro
com a tua problemática suspirante.

Ah, meu pequeno, a tua vida!
Tua amada te traiu com teu melhor amigo,
não suportas o professor de estética
e teu pai não te deu o carro prometido.
Já não vais à Europa?
Tua vida é lixo
e teus dias se acrescentam à História
como o pipi que as crianças fazem na praia.
Queres um minuto de atenção para o teu soluço
e me agarras o braço
e insistes
e te aborreces quando não escuto.

Espera... na tua agitação
deixaste cair uma gota de licor
na tua calça de flanela.
Aceitas um conselho?
Abandona de vez as festinhas de sábado
e lança teus nervos distendidos
até a outra margem
para que os outros,
os que vêm depois de ti,
encontrem passagem.


COSTA, Eduardo Alves da. No caminho com Maiakósvki: poesia reunida. São Paulo: Geração Editorial, 2003.p.40-41

terça-feira, 27 de outubro de 2015

FOSFOETANOLAMINA SINTÉTICA: GLÓRIA OU DRAMA? (*)

Evandro Ferreira


Nestas últimas semanas o debate sobre o uso da substância fosfoetanolamina sintética em tratamentos de câncer foi intenso nos sites de notícias e nas mídias sociais. E a polêmica aumentou desde que o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu, no dia 08/10, decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que impedia o fornecimento da substância produzida pelo Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP), em Rio Claro, para uma paciente com câncer do Rio de Janeiro.

Mas qual a razão para tanta discussão e debate? Que milagres contra o câncer a fosfoetanolamina sintética pode operar?

Quem se detém nas notas generalistas dos sites de notícias e em postagens inflamadas nas mídias sociais tem a impressão que a substância é ‘tiro certo’ para a cura do câncer. E vou além. Postagens nas mídias sociais conseguiram transformar os responsáveis pela produção da fosfoetanolamina na USP em quase ‘heróis nacionais’. Segundo alguns, os pesquisadores brasileiros são ‘cientistas tupiniquins que lutam bravamente contra a manipulação de multinacionais que querem, a todo custo, impedir a produção da substância milagrosa’. Tem até quem afirme que ela, a fosfoetanolamina, foi invenção desses ‘Dom Quixotes’ brasileiros.

O primeiro aspecto que contribuiu para a grande visibilidade adquirida pela fosfoetanolamina foi, obviamente, o seu potencial de uso contra o câncer, uma doença com alta taxa de mortalidade que não discrimina sexo, idade e classe social e que afeta anualmente aproximadamente 14 milhões de pessoas no mundo, causando, direta ou indiretamente, a morte de mais de 8 milhões delas. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), nos próximos 20 anos espera-se que o número de casos anuais da doença aumente 70%, para mais de 23 milhões.

Apesar de ser uma doença antiga, reportada desde 2500 anos antes de Cristo, e dos avanços fabulosos da medicina nas últimas décadas, a busca da cura para a maioria dos tipos de câncer não produziu resultados tão espetaculares como nos casos de numerosas doenças infecciosas como a AIDS, tuberculose, poliomielite, meningite e malária. Por isso, novidades no tratamento da mesma tem a capacidade de atrair tanta atenção.

No caso da fosfoetanolamina sintética, um fator contribui sobremaneira para a sua popularidade: a divulgação irresponsável de que a mesma pode aliviar, fazer rescindir ou mesmo curar alguns tipos de câncer em humanos sem que testes clínicos rigorosos tenham sido realizados.

A substância não é nova para a ciência e foi isolada pela primeira vez há quase 80 anos (1936). Desde então centenas de estudos já foram realizados e se descobriu, entre outros aspectos, que ela está relacionada com a ocorrência de convulsões epiléticas e Alzheimer. Em sua forma orgânica foi verificado que apresentava concentração 10 vezes acima do normal em tumores, levantando-se a hipótese de um possível papel na defesa celular.

Diante do seu potencial, um grupo de pesquisadores da USP, liderados pelo químico Gilberto Chierice, conseguiu sintetizar a fosfoetanolamina em laboratório e resolveu testar a mesma em células cancerígenas. Os ensaios efetuados até agora foram in vitro e in vivo. No primeiro, células cancerosas são tratadas em garrafas de vidro ou plástico e no segundo os estudos são feitos em animais vivos (in vivo). Neste caso tumores humanos são colocados em ratos e a substância é aplicada para avaliar o potencial de reduzir os tumores sem ser tóxica a ponto de causar a morte dos animais.

Os resultados alcançados na USP foram promissores. A fosfoetanolamina se mostrou eficaz contra o melanoma, câncer de mama, leucemia e como inibidor da metástase de alguns tipos de câncer. Entretanto, o fato de uma substância ser capaz de matar células cancerosas in vitro ou em animais de laboratório não é o suficiente para que possa ser considerada eficaz em humanos. A água sanitária, por exemplo, pode matar células cancerosas, mas sua injeção no corpo humano tem o poder de matar o seu receptor. Por isso, depois das fases experimentais in vitro e in vivo em animais de laboratório, é indispensável realizar testes clínicos em humanos para conhecer sua eficácia e toxicidade.

Anualmente dezenas de substâncias promissoras contra o câncer são testadas em condições de laboratório, muitas delas mais promissoras que a fosfoetanolamina. Entretanto, em média apenas uma de cada 25 substâncias promissoras mostram-se eficientes no tratamento do câncer em humanos.

A fosfoetanolamina sintética estudada pelos pesquisadores da USP nunca chegou a ser testada em humanos e está sendo distribuída de forma irresponsável– já faz alguns anos – para ‘voluntários’ que se apresentam na porta do laboratório de química que o produz. Esta situação é uma aberração ética e científica indescritível para a qual cabe perfeitamente a abertura de investigação policial por charlatanismo.

A situação, entretanto, ganhou notoriedade apenas quando a USP proibiu a distribuição do ‘remédio’. Pessoas desesperadas apelaram para a justiça e, acreditem ou não, nossa maior instância judicial, o STF, ‘liberou’ para a população uma substância que sequer pode ser chamada de remédio, pois nem licença de venda possui.

Isso foi suficiente para a imprensa investigar o caso. Questionado, o professor Gilberto Chierice fez declarações que só pioraram a situação, afirmando à revista ÉPOCA que achava que a fosfoetanolamina ‘é uma cura para o câncer’. Ao portal de notícias G1 ele declarou que o ‘remédio’ ainda não chegou ao mercado por ‘má vontade’ das autoridades e afirmou, laconicamente que ‘se não for possível aqui – a produção da forma medicinal da fosfoetanolamina – a melhor coisa é outro país fazer porque beneficiar pessoas não é por bandeira. A humanidade precisa de alguém que faça alguma coisa para curar os seus males’.

Alguém discorda disso? Eu não. Mas confesso que não consigo entender porque, com uma substância tão promissora, o professor e seus colegas da USP não formam uma equipe multidisciplinar para realizar os testes clínicos e desenvolver o produto no Brasil. Um médico pesquisador brasileiro se propôs a ajuda-lo e foi, discretamente, recusado. Afinal o que ele quer fazer? Quer ir avante e desenvolver o remédio ou não?

Tinha que ser no Brasil! Um enredo tão promissor para contar de forma gloriosa os passos de um avanço científico grandioso para a ciência brasileira corre o risco de se transformar em um enredo para descrever o drama de um fracasso.


Para saber mais:
Ferreira, A. K.; Santana-Lemos, B. A. A.; Rego, E. M.; Filho, O. M. R.; Chierice, G. O.; Maria, D. A. Synthetic phosphoethanolamine has in vitro and in vivo anti-leukemia effects. British Journal Of Cancer, v. 109, n. 11, p. 2819-2828, nov 26 2013.

Ferreira, A. K.; Meneguelo, R.; Pereira, A.; Filho, O. M. R.; Chierice, G. O.; Maria, D. A. Synthetic phosphoethanolamine induces cell cycle arrest andapoptosis in human breast cancer MCF-7 cells through the mitochondrial pathway.Biomedicine & Pharmacotherapy, v. 67, n. 6, p. 481-487, jul 2013.

Ferreira, A. K.; Freitas, Vanessa M.; Levy, D.; Maria Ruiz, J. L.; Bydlowski, S. P.; Grassi Rici, R. E.; Filho, O. M. R.; Chierice, G. O.; Maria, D. A. Anti-Angiogenic and Anti-Metastatic Activity of Synthetic Phosphoethanolamine. PLoS One, v. 8, n. 3 mar 14 2013.

Ferreira, A. K.;  Meneguelo, R.; Navarro Marques, F. L.; Radin, A.; Filho, O. M. R.; Claro Neto, S.; Chierice, G. O.; Maria, D. A.  Syntheticphosphoethanolamine a precursor of membrane phospholipids reduce tumor growthin mice bearing melanoma B16-F10 and in vitro induce apoptosis and arrest inG2/M phase. Biomedicine & Pharmacotherapy, v. 66, n. 7, p. 541-548, oct 2012.

Ferreira, A. K.; Meneguelo, R.; Pereira, A.; Filho, O. M. R.; Chierice, G. O.; Maria, D. A. Anticancer Effects of Synthetic Phosphoethanolamine onEhrlich Ascites Tumor: An Experimental Study. Anticancer Research, v. 32, n. 1, p. 95-104, jan 2012.

*Artigo originalmente publicado no diário 'A Gazeta', n. 8.805, p.2, de 20/10/2015.

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

TENTATIVA PARA SALVAR A POESIA

Eduardo Alves da Costa


A poesia agoniza e eu choro
com medo de perder a vaga
de poeta.
Os mais velhos recomendam
cautela com a emoção,
repouso,
caldo de galinha
e linguagem à antiga.
Os fatalistas lamentam o cinema
e chamam ao nosso sáculo
o das artes visuais.

A televisão é a culpada
– sentencia um jornalista
versado em filatelia,
enquanto uma equipe
de cirurgiões estetas
luta para livrar o coração da enferma
de adiposidades românticas.
E eu, que havia programado
uma carreira nas letras,
seguro a caneta
“como um boi a olhar para um palácio”.

Cruzo na sala de espera
com médicos anestesistas
concretistas
praxistas
e derrubo uma bandeja
de letrinhas coloridas,
espaços em branco,
ideogramas chineses,
balas
        belas
                 bílis
                        bolas
                                  bulas
e seringas.
Quando dou por mim
estou chutando um caranguejo
e comendo bala de goma
e limpando um cisco na dragona
enquanto o dragão não vem.
Quero ver quem tem
coragem para contestar
leva rasteira quem se levantar
e toma golpe de caratê
e cotovelo na cotovia
e samba de breque
teleco-teco
peteleco na orelha
– segura meu chapa! –
e é só esteta voando
contra a parede
com nariz de sangue
e olho inchado de levar porrada.

Abro a porta
e mando a doente
sair pela tangente
com um tapa no traseiro
e outros babados.

A menina não tem nada, minha gente.
Vai, morena, pega teu rumo
e toma tento
que essa frescura
te mata.


COSTA, Eduardo Alves da. No caminho com Maiakósvki: poesia reunida. São Paulo: Geração Editorial, 2003. p.38-39

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

EDUCAÇÃO NÃO É MERCADORIA

Luísa Karlberg
Linguagem e Cultura


Pesquisa realizada pela Economist Intelligence Unit, um dos sistemas de consultoria mais respeitados do mundo, coloca o Brasil em situação humilhante: penúltimo lugar numa lista de 40 países. A Finlândia e a Coréia do Sul aparecem nos primeiros lugares. O Brasil e a Indonésia em últimos lugares.

Como se isso fosse pouco, o último relatório elaborado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), sobre o índice de desenvolvimento da Educação, feito em 128 países, o Brasil aparece na 88ª posição. Países menos desenvolvidos apresentam uma posição melhor, como Honduras (87ª), Equador (81ª), Bolívia (79ª). Ainda, o Brasil está aquém de nossos vizinhos e parceiros comerciais como Argentina (38ª), Uruguai (39ª) e Chile (51ª). Esses dados demonstram que as políticas pedagógicas que norteiam a educação no Brasil são equivocadas.

Percebe-se, nos últimos anos, um ensino fortemente influenciado pela reestruturação produtiva, pelas inovações tecnológicas, pela nova organização do trabalho, pelo modelo de globalização dos mercados, a exigir novos perfis profissionais. Criou-se, assim, uma educação voltada ao mercado de trabalho, entendida pela lógica do capital, visando contribuir para o projeto político pedagógico da burguesia. A classe trabalhadora foi abandonada.

Educação, no Brasil, é tratada como mercadoria. Tanto isso é verdadeiro que professores brasileiros entram e saem das greves de mãos e bolsos vazios. Nada conseguem dos governantes. Esquecem-se os políticos (ou lembram-se, o que é mais grave) que a educação é a única forma de criar indivíduos pensantes e autônomos, pois ela desenvolve a capacidade de reflexão e julgamento da realidade. Ou seja, a educação desenvolve a capacidade de informação e entendimento para uma análise e avaliação da sociedade em que vivemos.

Ademais, a educação prepara os indivíduos para a não aceitação, a manifestação, o afrontamento e a revolta; ensina-os a romper com as maneiras de ver, sentir e compreender as coisas. Por isso as escolas devem ser sempre consideradas um espaço de exercício da liberdade e da cidadania, pois ali se adquire atitudes, valores, orientações e espírito crítico.

É, assim, a escola, um espaço eminentemente político que deveria fomentar a liberdade individual e coletiva, possibilitando as mudanças sociais necessárias para a felicidade humana. Contudo, em nossa época, a escola reproduz os valores, o imaginário e as condições sociais dominantes do sistema cultural. A educação tornou-se, apenas, o meio pela qual o sistema de domínio social está constituído, como se mantêm e como se perpetua.

Portanto, se há um culpado pela má qualidade do ensino, isso se deve as políticas públicas de educação implantadas nos governos neoliberais que tira de si essa responsabilidade e a debita aos brasileiros. Cada família cuide dos seus filhos. Cada pessoa torna-se responsável por sua educação formal.

A chamada era da globalização e o desenvolvimento do Estado Neoliberal, grosso modo, diminuíram o papel do estado na economia e reduziram o investimento e alcance das políticas públicas. A partir de então o trabalhador se viu inserido em um novo mundo, onde teve que enfrentar o desemprego estrutural, o subemprego, o baixo nível das condições de ensino, a exigência de muitas qualificações e a grande concorrência do mercado de trabalho.

Nesse contexto, cada trabalhador depende de si mesmo para se educar, para conhecer as novas tecnologias, atualizar-se e acompanhar as mudanças do mundo globalizado. Hoje, tornou-se difícil manter-se empregado quando o mundo está em constante transformação. A responsabilidade pela formação profissional e cultural não compete mais ao Estado, mas aos próprios indivíduos. As exigências são muitas e demandam um profissional que invista nele mesmo, pois o mundo globalizado espera que os indivíduos se esforcem e adquiram múltiplas competências, sejam multifuncionais, criativos e comprometidos com as exigências do mercado capitalista.

Finaliza-se a reflexão dizendo que as experiências têm demonstrado que os países que conseguiram resolver as desigualdades educacionais também conseguiram resolver as desigualdades sociais e tornaram-se mais democráticos. A educação produz autonomia de pensamento e, em consequência disso, produz a opinião, o livre julgamento e a participação política, que são os fundamentos da democracia. Vamos avançar, Brasil! Um caminho? Mudar a direção política, votar em pessoas preparadas para a transformação desse cenário caótico. É urgente que em 2016 façamos melhores escolhas. O Brasil transformou-se num mau exemplo ao mundo moderno.

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

CANTO CXX (excerto)

Ezra Pound (1885-1972)


Tentei escrever o PARAÍSO

Não se mova
            Deixe falar o vento
                        esse é o paraíso.

Deixe os deuses perdoarem
            o que eu fiz
Deixe aqueles que eu amo tentarem perdoar
            O que eu fiz. 

POUND, Ezra. Os cantos. trad. José Lino Grunewald. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006. p.797

HOMEM

Jorge Tufic


Trajetória de sombra dispersada
Das mãos lhe escorre o tempo que sonhou.
Quantas almas possui na alma pisada?
Qual dentre todas a que mais amou?

Seus passos abrem sulcos de alvorada.
Por estrelas errantes se enredou.
Onde a sua face ausente procurada
E as ilhas de além-mares que fundou?

Máscara leve lhe recobre a fronte.
(O silêncio por trás constrói o mito)
Traz nos ombros a sombra do horizonte.

De fundas cicatrizes cava o mundo.
E, sendo humano, um pouco de infinito
Guarda no peito como em céu profundo.


TUFIC, Jorge. Varanda de Pássaros. Manaus: Valer, 2005. p.21

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

ADRIANO DA GAMA KURY

Grande filólogo brasileiro, nascido em Sena Madureira (AC), em 25 de abril de 1924, e falecido no Rio de Janeiro, em 01 de agosto de 2012. Era membro da Academia Brasileira de Filologia e da Academia Brasileira da Língua Portuguesa. Licenciado em Letras Neolatinas pela antiga Faculdade Nacional de Filosofia, em 1953, fez aperfeiçoamento em linguística com o Prof. Matoso Câmara Jr. (1954) e livre-docência em língua portuguesa pela Universidade Federal Fluminense, em 1974.

Foi professor de língua portuguesa na Universidade de Brasília, de 1964 e 1970 e na Universidade Federal Fluminense, de 1972 a 1976. Chefe do Setor de Filologia da Fundação Casa de Rui Barbosa desde agosto de 1976, professor de filologia românica na Universidade Santa Úrsula desde setembro de 1976, e membro do Círculo Linguístico do Rio de Janeiro até a sua extinção.

Foi também assessor pedagógico da TVE (hoje TV Brasil), responsável pela parte de língua portuguesa das novelas educativas “João da Silva” e “A Conquista” (1973-77).  Trabalhou com o Mestre Aurélio Buarque de Holanda. Foi homenageado com a Medalha Aurélio Buarque de Holanda de Filologia, concedida pela União dos Escritores do Rio de Janeiro, tendo recebido também a Medalha Rui Barbosa, entregue a personalidades que se destacaram na prestação de serviços à cultura do país.

Entre suas obras, encontramos:
Pequena Gramática para a Explicação da Nomenclatura Grama-tical Brasileira (1ª ed. 1959; teve 12 edições).
Português Básico (Gramática, antologia, exercícios). 16ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1961. (A 1ª ed. é de 1960 e tem edição de 2008 pela Lexikon).
Minidicionário Gama Kury da Língua Portuguesa. FTD, 2008.
Lições de Análise Sintática, 6ª ed., SP, LISA, 1972. (1ª ed.: 1961; há edição de 2000 pela Ática).
Manual Prático de Ortografia, Rio, Livr. Agir Ed., 1968.
Gramática Fundamental da Língua Portuguesa, 2ª ed., SP, ed. Li-sa, 1991.
Meu Livro de Português (4 vols.), SP, Ed. Lisa, 1991. (A 1ª ed. é de 1971).
Curso Supletivo “João da Silva”, (5 vols.), Rio, MEC, 1974.
Gramática Objetiva (em colaboração), (2 vols.), 6ª ed., SP, Ed. Atlas.

domingo, 11 de outubro de 2015

IMPORTÂNCIA DA FILOSOFIA NA VIDA PESSOAL

Inês Lacerda Araújo


Em geral a Filosofia, tanto como disciplina acadêmica e como parte essencial da cultura e da história da humanidade, fica distante da vida pessoal. Mesmo quem tem um grau apurado de informação e educação formal, não consegue atinar com os conceitos, os termos, o tipo de pensamento abstrato próprios da Filosofia.

Entretanto, a reflexão filosófica cumpre uma função educacional, pedagógica e criativa na vida humana.

Como conciliar a dificuldade inerente ao pensamento filosófico com sua necessidade e importância?

A narrativa filosófica se aproxima da arte e da ciência, mas delas se distingue por não ser fantasiosa, não apelar para a pura imaginação ficcional dos artistas que representam um mundo de cores, sons, performances, e mesmo entretenimento. Distingue-se da ciência por prescindir de testes, experimentos, leis, generalizações e obtenção de resultados práticos como os da tecnologia.

Ao mesmo tempo a Filosofia depende de uma mente aberta e criativa de um lado, e da busca da verdade o que também pauta a ciência, de outro lado.

Se você é professor de Filosofia, ou se é alguém com vontade de aprender com os mestres do pensamento, pode começar com perguntas a seus alunos no primeiro caso, ou com reflexões pessoais no segundo caso: indagações que partem de situações banais do cotidiano, das vivências pessoais para em seguida generalizar com questões mais abrangentes e fundamentais.

Quem sou eu? O que faço de relevante em minha vida? Quais são os valores nos quais me baseio para decidir e julgar minhas ações e o mundo ao meu redor?

Aproveite o conceito de "mundo", por exemplo, para raciocinar, para abstrair. Como os primeiros filósofos, pergunte sobre esse "mundo". O cosmo, o universo? E vá além: como veio a ser tudo o que há? O homem em sua caminhada na face da Terra, o que isso representa para a humanidade? E o sofrimento, a dor, a humilhação, são absurdas, fazem sentido, como interpretar a morte, a morte de inocentes especialmente?

Ao atingir esse grau de abstração, eis aí o filosofar despontando. É preciso despertar a curiosidade, com filósofos que atinjam a mente e o coração.

***

Pessoas há que andam em círculos, o caminhar contínuo desgasta o percurso, não saem do próprio ninho construído, aliás, por elas mesmas. São prisioneiras de seus preconceitos e ignorância.

Outras há que ziguezagueiam, parecem chegar a um resultado gratificante, mas voltam atrás, sua perplexidade as impede de seguir em frente.

E outras há que cumprem metas, se transformam, modificam seu modo de pensar em busca de melhoria, de novos valores, de indagações que alargam e iluminam seu reto caminhar.

O papel da Filosofia seria trazer para este último caminhar um número maior de pessoas cada vez mais livres, mais reflexivas, que ponderam e abrem seu pensamento. Isso impede que ideologias, credos, partidos ceguem e fechem cabeças e corações. Que elas não precisem de um comando, de um chefe, de alguém que diga o que devem fazer, o que pensar, como viver.


* Inês Lacerda Araújo - Professora de Filosofia durante 40 anos, na UFPR, e nos últimos anos na PUCPR. Autora de livros sobre Epistemologia, História da Filosofia e Teoria do Conhecimento. Atualmente aposentada.

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

O COMUNISTA TEATRAL

Bertolt Brecht (1898-1956)


Um jacinto na lapela
Na Kurfürstehdamm*
O jovem sente
O vazio do mundo.
Na latrina
Isto lhe parece claro: ele
Caga no vazio.

Cansado do trabalho
De seu pai
Ele mancha os cafés
Por trás dos jornais
Sorri perigosamente.
É ele que
Vai pisotear este mundo
Como uma bosta de vaca.

Por 3.000 marcos ao mês
Ele está disposto
A encenar a miséria das massas
Por 100 marcos ao dia
Ele mostra
A injustiça do mundo. 

* Principal rua de Berlim. (N. do T.)


BRECHT, Bertolt. Poemas 1913-1956. Seleção e tradução de Paulo César de Souza. São Paulo: Ed. 34, 2000. p.33