sexta-feira, 29 de agosto de 2014

FITZCARRALDO

Dirigida por Werner Herzog, Fitzcarraldo (1982) conta a história de Brian Sweeney Fitzgerald, um excêntrico empreendedor irlandês, grande fã do tenor italiano Enrico Caruso, que sonha em construir um teatro de ópera no meio da floresta amazônica, no século XIX, em pleno apogeu do ciclo da borracha.


A grandiosidade do projeto aproxima o personagem e o realizador, já que Herzog se recusou a gravar dentro de estúdios e não poupou esforços para levar, floresta adentro, um navio inteiro pesando cerca de trezentas toneladas. O Fitzcarraldo do título também é um sonhador, movido mais pela paixão que pelo lucro. E detalhe, a trama foi inspirada em fatos reais.

O papel principal coube ao ator polonês Klaus Kinski (o mesmo de Nosferatu – O Vampiro da Noite e Aguirre – A Cólera dos Deuses), com quem o diretor teve alguns conflitos. Filmagens longas, cansativas e muito arriscadas levaram Kinski à decisão de abandonar o trabalho e deixar a Amazônia. O ator mudou de ideia quando Herzog lhe apontou uma arma e lhe disse que, dali, só sairia se estivesse morto. A relação entre os dois resultou no documentário Meu Melhor Amigo (1999), idealizado por Kinski. Além de Grande Otelo, o filme ainda conta com a participação do ator brasileiro José Lewgoy e do músico Milton Nascimento. > futura.org
> Leia aqui um comentário do filme por Daniel Dalpizzolo

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

MOMENTOS INUSITADOS NA VIDA DE ALGUNS FILÓSOFOS

Inês Lacerda Araújo


Há certos momentos marcantes na vida dos filósofos, alguns típicos do que se espera deles, outros inusitados e até surpreendentes.

Sócrates cercado de alunos, Sócrates que abreviou sua morte com cicuta, episódios típicos de um filósofo. Mas imagine Sócrates no banquete em que o jovem e belo Alcebíades, embriagado como relata Platão, seduz pela juventude e beleza. Relata Alcebíades ter dormido sob o manto de Sócrates, e "pensava que logo ele iria tratar comigo o que um amante em segredo trataria com o bem amado, e me rejubilava", mas isso não aconteceu, Sócrates acordou e retirou-se.

Mudança de quadro: Agostinho no jardim de sua casa em Milão (ano 386), aos 32 anos busca um sentido para sua vida. Uma súbita iluminação lhe mostra o caminho da fé em Deus, a leitura de Paulo de Tarso muda por completo sua visão de mundo, ele se converte ao catolicismo, e encontra a paz depois do que chamou de "vida em pecado".

Bem diferente de Descartes, uma cena de intimidade, descrita pelo próprio filósofo na primeira Meditação: "Por exemplo, que eu esteja aqui, sentado junto ao fogo, vestido com um chambre, tendo este papel à mão...", quando analisa o grau de certeza proporcionado pelos sentidos. Por que será que ele mencionou o modo como se vestia?

E Nietzsche dançando? Em Ecce Homo ele recorda dos passeios em Nice, onde terminou "Assim Falou Zaratustra": "Muitas alturas silentes da paisagem de Nice são sagradas para mim devido a momentos indeléveis que ali passei ...; a agilidade muscular foi sempre tanto maior em mim quanto a força criadora mais fluentemente me inundou o espírito. O corpo é entusiasmo: não nos ocupemos da 'alma' ... Frequentemente viram-me dançar."

Entre as muitas "esquisitices" de Wittgenstein, mania por limpeza, comida frugal, acessos de violência (o famoso puxão de orelha em uma menina, sua aluna quando professor de matemática em uma aldeia; discutindo com B. Russell e o ameaçando com um atiçador de lareira), há uma pouco conhecida, mas marcante cena passada na Irlanda. "Seus vizinhos mais próximos, a família Mortimer, consideravam-no completamente louco... Chegaram a proibi-lo de passar por seu terreno, afirmando que ele assustaria os carneiros". Assim, Wittgenstein tinha que desviar, e "num desses passeios, os Mortimer viram-no parar de repente e, servindo-se de um bastão, desenhar uma figura (um pato-lebre?) no chão da trilha, a qual ficou contemplando por um longo tempo, inteiramente absorto, antes de retomar a caminhada" (cf biografia "O dever do gênio", Ray Monk).

Se permanecer absorto é algo que até se espera de um filósofo, comprar um Jaguar e dirigir em disparada, fere nossa imagem do pensador (a da estátua de Rodin, por exemplo). Trata-se de Foucault em Uppsala (Suécia). "Um dia vai com Jean-Christophe a Estocolmo comprar um carro. Voltam com um suntuoso Jaguar bege que surpreende a boa sociedade local", gostava de comer bem, bebia de vez em quando até cair de bêbado, "também gostava de se vestir de chofer para levar Dani (uma amiga) a suas compras na cidade. Seu Jaguar se tornou lenda entre todos que o conheceram em Uppsala. Todo mundo conta que ele dirigia como um louco" (cf biografia de Didier Eribon). Temiam que se acidentasse, o que, felizmente para a filosofia, não aconteceu.

Decididamente, filósofos não andam com a cabeça nas nuvens...


*Inês Lacerda Araújo - Professora de Filosofia durante 40 anos, na UFPR, e nos últimos anos na PUCPR. Autora de livros sobre Epistemologia, História da Filosofia e Teoria do Conhecimento. Atualmente aposentada.

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

O ELEFANTE FUGIU DO CIRCO

Cassiano Ricardo (1895-1974)


(...)
Teu lugar, elefante, não é mais
na selva da África, nem na rua 15.
É no circo, onde, atualmente, moras.
No circo de onde, ludibriando o guarda –
fugiste para a rua; é lá, no circo,
onde demora o último vestígio
do mudo mágico, onde és qualquer coisa
de tragicômico, de maravilhoso,
entre os necessitados de alegria.
Os que procuram coisas diferentes
das que encheram de tédio as próprias flores.
Algo que lhes pareça fabuloso.
Não aquilo que, à custa de ser visto,
o olhar se prostituiu de tanto olhar;
mas algo acima do seu horizonte
de agora e que – embora muito feio, –
seja, como tu és, gentil de ver.

Volta ao circo, elefante; tem piedade
do pouco que nos resta de criança,
neste planeta, sujo fim de terra.
Volta ao circo, elefante... Sê obediente
como a força que crê em si; e deixa-me,
deixa-me, desde logo, azuis, na tromba
amarrar-te, de novo, os laçarotes
de fita, e fulvos, pendurar-te, aos pulsos,
os guizos de ouro, tilintantes de ouro.
Além de tudo, este é o maior segredo,
que eu queria contar-te, bem no ouvido.

A hora é de morrermos todos; todos.
Vem aí o dilúvio, e o circo é a arca
de Noé, ancorada, já no asfalto,
para salvar apenas as crianças
e os poucos a quem Deus ofereceu
a graça de se parecer com elas... 


RICARDO, Cassiano. Melhores Poemas. Seleção Luiza Franco Moreira. São Paulo: Global, 2003. p.129-130

terça-feira, 26 de agosto de 2014

CONTRA A PERFEIÇÃO

Michel J. Sandel


É tentador pensar que projetar nossos filhos e nós mesmos para o sucesso por meio da bioengenharia é um exercício de liberdade numa sociedade competitiva. Porém modificar nossa natureza para nos encaixar no mundo, e, não o contrário, é, na verdade, a forma mais profunda de enfraquecimento da autonomia. Em vez de empregar nossos novos conhecimentos genéticos para endireitar “a madeira torta da humanidade”, deveríamos fazer o possível para criar arranjos políticos e sociais mais tolerantes com as dádivas e limitações dos seres humanos imperfeitos. 


SANDEL, MICHAEL J.. Contra a perfeição: ética na era da engenharia genética. Tradução Ana Carolina Mesquita. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p.106-107

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

ISSO É BONITO DE SUA PARTE, SENHOR DOUTOR!

Theodor W. Adorno (1903-1969)


Não há mais nada de inofensivo. As pequenas alegrias, as manifestações da vida que parecem excluídas da responsabilidade do pensamento não possuem só o aspecto de teimosa tolice, de um impiedoso não querer ver, mas se colocam de imediato a serviço do que lhes é mais contrário. Até a árvore que floresce é mentirosa no momento em que se percebe seu florescer sem sombra de sobressalto; até o inocente “Que beleza!” torna-se expressão para a ignomínia da existência que é diversa, e não há mais beleza nem consolo algum fora do olhar que se volta para o horrível, a ele resiste e diante dele sustenta, com implacável consciência da negatividade, a possibilidade de algo melhor. É de bom alvitre desconfiar de condescendência em relação à prepotência do que existe. O maldoso sentido oculto do aconchego, que antigamente se limitava à íntima e afável ação de brindar, há muito apossou-se de impulsos mais amenos. A conversa casual com o homem no trem, com quem manifestamos acordo através de um par de frases de modo a evitar discussão e das quais sabemos que, no fim das contas, chegam a ser um crime, já é até certo ponto traição; nenhum pensamento é imune à sua comunicação e já é suficiente dizê-lo no lugar errado e num consenso falso para minar sua verdade. De cada ida ao cinema, apesar de todo cuidado e atenção, saio mais estúpido e pior. A própria sociabilidade é participação na injustiça, na medida em que finge ser este mundo morto um mundo no qual ainda podemos conversar uns com os outros, e a palavra solta, sociável, contribui para perpetuar o silêncio, na medida em que as concessões feitas ao interlocutor o humilham de novo na pessoa que fala. O princípio mau, que sempre esteve escondido na afabilidade, desenvolve-se, no espírito igualitário, em direção à sua plena bestialidades. Condescendência e falta de presunção são o mesmo. Ajustando-nos à fraqueza dos oprimidos, confirmamos nesta fraqueza o pressuposto da dominação e desenvolvemos nos próprios a medida da grosseria, obtusidade e brutalidade que é necessária para o exercício da dominação. Quando, na fase mais recente, o gesto de condescendência desaparece e só o ajustamento se torna visível, é então precisamente, nesta completa ofuscação do poder, que a relação de classe disfarçada se impõe da maneira mais implacável. Para o intelectual, a solidão inviolável é a única forma em que ele ainda é capaz de dar provas de solidariedade. Toda colaboração, todo humanitarismo por trato e envolvimento é mera máscara para a aceitação tácita do que é desumano. É com o sofrimento dos homens que se deve ser solidário: o menor passo no sentido de diverti-los é um passo para enrijecer o sofrimento.

p.s. Herr Doktor, das ist schön Von Euch: título tomado de um verso de Fausto (I, 981), de Goethe, da cena do passeio do domingo de Páscoa. (N. do T.)

ADORNO, Theodor W. Minima Moralia: reflexões a partir da vida danificada. Tradução Luiz Eduardo Bicca. São Paulo: Ática, 1993. p.10-21

domingo, 24 de agosto de 2014

VOLVER A LOS 17

Canção da cantora, compositora, poeta, artesã, artista plástica e folclorista chilena, Violeta Parra (1917-1967).


VOLVER A LOS 17
Violeta Parra

Volver a los diecisiete
después de vivir un siglo
Es como descifrar signos sin ser sabio competente,
Volver a ser de repente tan frágil como un segundo
Volver a sentir profundo como un niño frente a dios
Eso es lo que siento yo en este instante fecundo.

Se va enredando, enredando
Como en el muro la hiedra
Y va brotando, brotando
Como el musguito en la piedra
Como el musguito en la piedra, ay si, si, si.

Mi paso retrocedido cuando el de usted es avance
El arca de las alianzas ha penetrado en mi nido
Con todo su colorido se ha paseado por mis venas
Y hasta la dura cadena con que nos ata el destino
Es como un diamante fino que alumbra mi alma serena.

Se va enredando, enredando
Como en el muro la hiedra
Y va brotando, brotando
Como el musguito en la piedra
Como el musguito en la piedra, ay si, si, si.

Lo que puede el sentimiento no lo ha podido el saber
Ni el más claro proceder, ni el más ancho pensamiento
Todo lo cambia al momento cual mago condescendiente
Nos aleja dulcemente de rencores y violencias
Solo el amor con su ciencia nos vuelve tan inocentes.

Se va enredando, enredando
Como en el muro la hiedra
Y va brotando, brotando
Como el musguito en la piedra
Como el musguito en la piedra, ay si, si, si.

El amor es torbellino de pureza original
Hasta el feroz animal susurra su dulce trino
Detiene a los peregrinos, libera a los prisioneros,
El amor con sus esmeros al viejo lo vuelve niño
Y al malo sólo el cariño lo vuelve puro y sincero.

Se va enredando, enredando
Como en el muro la hiedra
Y va brotando, brotando
Como el musguito en la piedra
Como el musguito en la piedra, ay si, si, si.

De par en par la ventana se abrió como por encanto
Entró el amor con su manto como una tibia mañana
Al son de su bella diana hizo brotar el jazmín
Colando cual serafín al cielo le puso aretes
Mis años en diecisiete los convirtió el querubín.

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

OS VELHOS ADMIRANDO-SE NA ÁGUA

W. B. Yeats (1865-1939)


Ouvi os velhos, velhos, murmurando:
“Tudo se altera,
E um por um vamos passando.”
Tinham mãos como garras, e seus joelhos
Eram torcidos como os espinheiros velhos
Junto da água.
Ouvi os velhos, velhos, murmurando:
“Tudo o que é belo foge, deslizando
como as águas.” 


THE OLD MEN ADMIRING THEMSELVES IN THE WATER

I heard the old, old men say,
“Everything alters,
And one by one we drop away.”
They had hands like claws, and their knees
Were twisted like the old thorn-trees
By the waters.
“All that's beautiful drifts away
Like the waters.”


YEATS, W. B.. Poemas. Tradução e introdução Péricles Eugênio da Silva Ramos. São Paulo: Art Editora, 1987. p.61

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

MACHUCA

Filme de Andrés Wood (Chile, 2004), considerado um dos melhores filmes latino-americanos da última safra.
“Chile, 1973. Gonzalo Infante (Matías Quer) e Pedro Machuca (Ariel Mateluna) são dois garotos de 11 anos que vivem em Santiago. O primeiro, numa bela casa situada num bairro de classe média. O segundo, num humilde povoado ilegal instalado a poucos metros de distância da escola. Dois mundos separados por uma muralha invisível que alguns sonham em derrubar na intenção de construir uma sociedade mais justa, como o padre McEnroe (Ernesto Malbran), diretor de um colégio particular de elite onde Gonzalo estuda. Em meio à política comunista instalada por Salvador Allende no país, o diretor decide fazer uma integração entre estes dois universos, abrindo as portas do colégio para os filhos das famílias do povoado. É assim que Pedro Machuca vai parar na mesma sala de Gonzalo, ponto de partida para uma amizade cheia de descobertas e surpresas, que acontece paralelamente ao clima de enfrentamento que vive a sociedade chilena na violenta transição de Allende para Pinochet.”

MACHUCA
(Direção: Andrés Wood, Chile, 2004)

A história se passa em 1973, quando o país era governado pelo socialista Salvador Allende, marcado por um sensível acirramento da luta de classes. De um lado ocorriam passeatas organizadas pela esquerda – com intensa participação de trabalhadores e estudantes - do outro, passeatas contra o presidente eleito, lideradas pela direita nacionalista e anti-comunista.

Neste contexto, Gonzalo, um garoto de classe média-alta, estudante de um dos colégios de maior prestigio de Santiago, o Saint Patrick, conhece Pedro Machuca, menino pobre que estuda no colégio graças a uma política de concessão de bolsas a pessoas de baixa renda.

Em meio a uma briga na escola, Gonzalo e Pedro Machuca se aproximam, nasce então uma amizade entre os dois garotos. Esta amizade é o tema principal do filme que se desenrola com um pano de fundo que originou no golpe contra o governo de esquerda de Salvador Allende.

Porém, esta aproximação se esbarra na origem distinta dos dois garotos, o rico e o pobre, o conservador e o progressista, mundos diferentes e completamente antagônicos. Ambos são mal vistos pelos seus colegas e as questões de classe inevitavelmente aparecem na relação entre os meninos. É muito interessante a maneira como simples garotos reproduzem a mentalidade do círculo social em que vivem.

Machuca mistura doses de romance com intenso teor de política, configurando-se como um filme bonito e ao mesmo tempo indigesto. Esta dicotomia que nos revela quão contraditória é nossa sociedade.

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

MÁSCARA DA POLÍTICA EDUCACIONAL NO BRASIL

Luísa Lessa


Falam especialistas que o Brasil avançou nos últimos 20 anos, mas a educação freou o desenvolvimento desse período, segundo o IDHM 2013 (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal), divulgado na segunda-feira, 29/07/2014.

No Brasil, entra Governo e sai Governo e a conversa é sempre a mesma: “vamos investir em educação”. Em ano eleitoral, dizem os políticos: “o país avançou muito”. Talvez tenha avançado para o abismo, pois segundo índice divulgado pela Pearson Internacional, que faz parte do The Learning Curve (Curva do Aprendizado, em inglês) e mede os resultados de três testes internacionais aplicados em alunos do 5º e do 9º ano do ensino fundamental, o Brasil ficou em penúltimo lugar. Dão lições ao mundo a Finlândia e a Coreia do Sul, os dois primeiros lugares. O Brasil só ganhou da Indonésia. É um resultado vergonhoso.

Os dados não são invenção e não possuem coloração partidária. É a constatação de uma educadora que muito trabalha em prol de mudanças positivas. Uma educadora que contribuiu para composição dos livros didáticos do Estado de São Paulo. O Acre não quer ajuda nessa área, há, aqui, “medalhões nos salários”, mas que nada escrevem, falam bajulações. Isso não ajuda, prejudica o Estado, o sistema educacional como um todo.

Então, votando aos dados, eles saíram do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa, na sigla em inglês), do documento Tendências em Estudo Internacional de Matemática e Ciência (TIMSS) e do Progresso no Estudo Internacional de Alfabetização (PIRLS) que compreendem o aprendizado de matemática, leitura e ciência dos alunos.

Veja-se o Ranking Global de Habilidades Cognitivas e Realizações Educacionais:

1.Finlândia
2. Coreia do Sul
3. Hong Kong
4. Japão
5. Cingapura
6. Grã-Bretanha
7. Holanda
8.Nova Zelândia
9. Suíça
10. Canadá
11. Irlanda
12.Dinamarca
13. Austrália
14. Polônia
15. Alemanha
16. Bélgica
17. Estados Unidos
18. Hungria
19.Eslováquia
20. Rússia
21. Suécia
22.  República Tcheca
23. Áustria
24. Itália
25. França
26. Noruega
27. Portugal
28. Espanha
29. Israel
30. Bulgária
31. Grécia
32.Romênia
33. Chile
34.Turquia
35.Argentina
36.Colômbia
37. Tailândia
38. México
39.BRASIL
40.Indonésia

Fonte:Pearson/EIU

O desempenho de cada país mostra se ele está acima ou abaixo da média calculada a partir dos dados de todos os participantes. Segundo esses dados divulgados no último dia 27 de julho de 2014, 27 dos 40 países ficaram acima da média, enquanto 13 estão abaixo do valor mediano. O Brasil, que teve pontuação de -1.65, foi incluído no grupo 5, onde estão as sete nações com a maior variação negativa em relação à média global. É um dado assustador, fruto do descaso e do pouco compromisso com a educação brasileira.

A ONU, em 14/07/2014, por meio do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), diz que o Brasil deve investir em "políticas educacionais ambiciosas", para mudar a sua demografia.Todos os dados apontam que o Brasil vai mal, muito mal nas políticas educacionais.

E como é um sistema educacional eficaz? É aquele em que os alunos aprendem, passam de ano e concluem a educação básica. Esta é uma afirmação de que poucos vão discordar. Entretanto, a maioria dos sistemas educacionais no Brasil não cumpre essa missão. Há descaso, desvio de recursos, investimentos pífios, salários aviltantes pagos aos professores, escolas sem segurança, mal aparelhadas, sem infraestrutura, que pouco ou nada atraem os jovens, que preferem as ruas, as drogas, a violência, os furtos. Quando não, ficam em casa e quando saem para a escola procuram ir para lugares mais agradáveis.

O governo brasileiro, por meio do INEP, definiu metas para os sistemas educacionais e as escolas aperfeiçoarem a qualidade da educação oferecida, criando um índice de qualidade, chamado IDEB, para cada um dos três segmentos da educação básica. Mas de tudo que se diz, fica a pergunta: essas metas no INEP são suficientes para o país sair do atraso educacional?

Há medidas urgentes: escolas em tempo integral; professores motivados; escolas aparelhadas para que as pessoas nelas desejem permanecer com alegria, satisfação. Então, qualquer política de melhoria da qualidade dos sistemas escolares devem contemplar os três aspectos simultaneamente: o professor deve ensinar; o aluno deve aprender e passar de ano.

Finaliza-se com a frase memorável de Eduardo Campos: “ O Brasil tem jeito”. Devemos exigir prioridade à Educação, sem ela NUNCA avançamos, exceto para cair no abismo.

*Luísa Lessa é da Academia Brasileira de Filologia e da Academia Acreana de Letras.

terça-feira, 19 de agosto de 2014

SERENATA SINTÉTICA

Cassiano Ricardo (1895-1974)


                        Rua
                        Torta.

                        Lua
Morta.

Tua
Porta. 


RICARDO, Cassiano. Melhores Poemas. Seleção Luiza Franco Moreira. São Paulo: Global, 2003. p.70

ODE À MARINA

Mário Maia (1925-2000)
















Do mulateiro tem a mesma cor,
encerras n’alma pura de menina
a beleza das estrelas diamantinas
e, de um céu enluarada, o esplendor.

Sim, ninfa selvagem. Sim Marina,
tu és a selva virgem viridente;
o fruto fecundado e a semente;
a água pura de fonte  cristalina.

Anjo encantado e encantamento,
raro exemplar de vida; um destino.
Das novas gerações, um novo hino...
Verbo de fé, fiel ao juramento.

És tu Marina, lutadora altiva;
brava guerreira pela liberdade
do homem do campo e da cidade;
a mais autêntica dessa força viva.

Por isso te tomamos por bandeira;
estandarte de esperança renovada...
Archote clareando a nossa estrada
no pélago, a estrela timoneira...

És para nós o exemplo verdadeiro
de política sem corrupção.
És paradigma dessa geração
que não vende seu voto por dinheiro.

Assim, Marina, na oportunidade
do lançamento de candidaturas,
entre todas aquelas que são puras
teu nome nasce como uma claridade
após um temporal de noite escura.

Marina, permita que a nossa voz,
dos veteranos e da mocidade,
se ajunte à tua, para a liberdade
abrir as suas asas sobre nós...


Rio Branco, 27.06.1990 – Recitado no lançamento da Candidatura de Marina.
Mário Maia em Sombras siderais e outras sombras (1990) p.103-104

domingo, 17 de agosto de 2014

ODE (II,10)

Horácio (65-8 a.C.)


Muito melhor, Licínio, viverás,
não buscando o mar alto, sempre afoito,
nem te ficando, cauto, junto à praia,
            rábido o mar.

À áurea mediocridade, se alguém a ama,
da velha casa o desasseio evita;
mas, também, sóbrio, foge aos ricos tectos,
            causa de inveja.

O vento agita sempre altos pinheiros,
fragorosas, desabam altas torres
e o raio fulminante o pico fere
            de altas montanhas.

No dia aziago, espera; no bom, teme,
preparado o teu peito à sorte adversa.
Se Jove hoje nos dá duros invernos,
            Leva-os depois.

Se vais, agora, mal, nem sempre o irás.
Desperta Apolo, em sua lira, às vezes,
a silenciosa musa, pois nem sempre
            o arco distende.

Sê animoso, sê forte, na desgraça:
sábio, saibas, porém, quando te é muito
próspero o vento, contrair a tua
            túrgida vela. 


HORÁCIO. Odes e epodos. Tradução de Bento Prado de Almeida Ferraz. São Paulo: Martins Fontes, 2003. p.105-107

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

A MAÇÃ

Samira Makhmalbaf dirigiu o filme “A maçã” (Sib, 1998, Irã / França) quando tinha apenas 17 anos, sendo a mais jovem cineasta até hoje a concorrer a prêmio no Festival de Cannes. “A maçã” narra a história verídica de duas irmãs, Massoumeh e Zahra, trancafiadas em casa pelos pais - uma senhora cega e um senhor desempregado - durante 11 anos, o que as levou a um processo de retardo mental. A prisão domiciliar era justificada por uma passagem de um texto religioso segundo o qual as jovens são como pétalas, que fenecem ao contato do sol. 
> Leia aqui o comentário completo do professor e escritor Wanderson Lima.


A MAÇÃ

O primeiro plano do filme não poderia ser mais revelador de todo contexto do filme. Uma flor precisa ser regada, e uma mão do alto do plano tenta jogar água de uma caneca, mas há algum impedimento (fora de campo) que faz com que apenas um bocadinho de água consiga realmente chegar a seu objetivo. De fato, A Maçã será a tentativa de fazer com que essa flor possa ser regada livremente, que a mão que rega a planta possa ter toda a liberdade. Um filme contra os entraves da liberdade? Também. O primeiro filme de Samira Makhmalbaf surpreende menos pelo formato (mistura documentário-ficção comum nos filmes do seu pai, Mohsen Makhmalbaf, mas originalmente criada por Abbas Kiarostami a propósito do pouco conhecido Close-Up) do que pela sutileza com que ela mostra seus personagens, com o intrincado e um tanto insólito desenrolar dos acontecimentos.

A história da qual o filme parte nos é dita logo no começo do filme: um pai prende suas duas filhas em casa porque a mãe é cega. A partir de um abaixo-assinado organizado pelos vizinhos, o assunto passa a ser conhecido pelos jornais e pelas autoridades. Uma assistente social é designada para fazer com que os pais respeitem as definições da justiça: que às meninas seja dada a liberdade. O que no começo parece pura idiossincrasia paterna vai aos poucos se revelando como uma complicada teia de preconceitos, fanatismo e jogos de poder. Primeiro vemos a justificação filosófica para mantê-las presas: diz o Livro que as meninas são como pétalas de flor que se desmancham em contato com o Sol. Depois, mais tarde, o verdadeiro motivo: o domínio da mulher, cega, mas que aparece como a verdadeira força (do mal) oculta no filme, uma força sem cara (ela aparece sempre encapuzada), para defender o antigo modelo, em contraposição ao novo modelo, defendido pela assistente social. Poderia-se dizer que A Maçã é um filme feminista? Parece que não. O filme é, isso podemos dizer, um assunto de mulheres. De fato, elas são tudo que move o filme, e os homens (o pai e o vendedor de sorvetes) estão na história apenas como atualizadores de um sistema.

Mas há em A Maçã uma beleza bruta, desconhecida. Beleza documental, uma função-Freaks (o filme de Tod Browning): vemos as meninas embrutecidas pelo tempo de clausura — elas não falam direito (quase uivam!), se movimentam estranhamente, não sabem utilizar o dinheiro... Mas há algo que humaniza-as em primeira instância (e aí a função parece se confirmar), imediatamente. É o sorriso delas, o gosto de conseguir sair pela rua, de brincar selvagemente com as meninas mais ricas, de comer as maçãs resultantes de sua primeira compra...

Fala-se muito de uma suposta ingenuidade do cinema iraniano, de uma suposta sinceridade documental que é comum a todos os filmes iranianos. Não se poderia imaginar mais bobagem! Se certos filmes do Irã realmente assumem a forma lógica e estética de certos filmes do neo-realismo (Ladrões de Bicicleta, por exemplo), como O Jarro e Gabbeh, o grosso dos cineastas iranianos trabalha com o contrário da verdade, com a mentira. A reconstituição, figura clichê do cinema americano, torna-se no cinema do Irã um escalonamento de planos de interpretação possíveis (em A Maçã, os fatos realmente ocorreram e os protagonistas são os mesmos na realidade e na ficção), o cinema iraniano pode tornar-se um cinema da crueldade (Salve o Cinema) ou um cinema nitidamente voltado para a mentira como principal modelo para chegar à verdade (Kiarostami).

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

CANTIGA SEM REGRESSO

Cassiano Ricardo (1895-1974)


Um cacto me pergunta: quando?
O horizonte me interroga: onde?
Só o meu coração é quem sabe...
E este bate, mas não responde.

A paisagem se torna escassa
quanto mais longo é o meu caminho.
O céu é que vai aumentando
as suas tardes de ouro e vinho.

De quando em quando, de onde em onde,
paro: Só para quem duvida.
O que é rápido vai-se embora.
Passa sem pensar na vida.

O desencontro desta viagem,
por onde passo, fica impresso.
Não há esperança de chegada
e muito menos de regresso.

De quando em quando, de onde em onde,
faço do cacto a minha prece.
Do horizonte faço o meu leito
ensanguentado, se anoitece.

Regressar? já não é possível.
Seguir? já não é necessário.
Resta-me, no último horizonte,
o último cacto solitário.

O destino que me vence
é aquele de que sou oriundo.
Não é amar o que me pertence,
mas o que pertence ao mundo.

A viagem sem querer da vida,
pontilhada de agrestes luas,
me reduziu a duas palavras
espectrais, totalmente nuas:

Uma de pé, como um cacto: quando?
(a que ninguém me responde)
Outra, deitada no chão duro,
como um horizonte: onde?


RICARDO, Cassiano. Melhores Poemas. Seleção Luiza Franco Moreira. São Paulo: Global, 2003. p.75-76