Cassiano Ricardo (1895-1974)
Um cacto me pergunta: quando?
O horizonte me interroga: onde?
Só o meu coração é quem sabe...
E este bate, mas não responde.
A paisagem se torna escassa
quanto mais longo é o meu caminho.
O céu é que vai aumentando
as suas tardes de ouro e vinho.
De quando em quando, de onde em onde,
paro: Só para quem duvida.
O que é rápido vai-se embora.
Passa sem pensar na vida.
O desencontro desta viagem,
por onde passo, fica impresso.
Não há esperança de chegada
e muito menos de regresso.
De quando em quando, de onde em onde,
faço do cacto a minha prece.
Do horizonte faço o meu leito
ensanguentado, se anoitece.
Regressar? já não é possível.
Seguir? já não é necessário.
Resta-me, no último horizonte,
o último cacto solitário.
O destino que me vence
é aquele de que sou oriundo.
Não é amar o que me pertence,
mas o que pertence ao mundo.
A viagem sem querer da vida,
pontilhada de agrestes luas,
me reduziu a duas palavras
espectrais, totalmente nuas:
Uma de pé, como um cacto: quando?
(a que ninguém me responde)
Outra, deitada no chão duro,
como um horizonte: onde?
RICARDO, Cassiano. Melhores Poemas. Seleção Luiza Franco Moreira. São
Paulo: Global, 2003. p.75-76
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