Grande vai e vem no porto
Quando cheguei com a bagagem
Uns chamando passageiros
Outros vendendo passagem
Na manhã daquele dia
Meu navio partiria
Praquela longa viagem
Era manhã de estiagem
O sol sorria brilhante
Logo embarquei no navio
Confortável e aconchegante
Porém contudo eu sabia
Que na sequência viria
Um desafio constante
Não banquei o itinerante
Comprei logo um camarote
Pequenino apertadinho
Para mim e meu consorte
Gastei um pouquinho além
Mas logo vi que fiz bem
Em não contar com a sorte
Barco de pequeno porte
Lotado até no porão
Abarrotado de redes
Gente sentada no chão
É assim que o povo enfrenta
Mil seiscentos e cinquenta
Quilômetros de extensão
Aquela tripulação
Incrivelmente adestrada
Auxilia e dá suporte
A quem possui pouca estrada
No vão que não tem parede
Cada um ata sua rede
Logo a barca está lotada
São doze horas e nada
Ás onze era a saída
Os amigos lá do porto
Prontos para a despedida
Eu já tinha vistoriado
Meu dormitório apertado
Estava feliz da vida
Desatracaram em seguida
O navio San Diego
Era uma hora da tarde
Mas pro meu desassossego
Frustrando a expectativa
Nós ficamos à deriva
No meio do Rio Negro
Dessa maneira eu não chego
Pensei cá com meus botões
Em seguida se ouviu
O barulho dos porões
Roncou a casa de máquinas
Afastando as problemáticas
E aliviando as tensões
Grupo cantando canções
Se ouviu no segundo piso
Me emocionei com Manaus
Vista assim de improviso
Fiquei ali até quando
O navio acelerando
Me afastou do paraíso
Logo me veio o aviso
Por alguém desconhecido
Disse ele que o almoço
Estava sendo servido
Emburaquei lá pra dentro
Em busca do alimento
Tracei um belo cozido
Achei muito divertido
E aprendi muitas lições
Quanta coisa diferente
Várias novas emoções
Vê banzeiros se formando
De barcaças se encontrando
Dispensam comparações
Rio Negro e Solimões
Aqui não são dois cantores
São dois rios que sustentam
Famílias de pescadores
Do baixo e alto amazonas
Duas vertentes patronas
De grandes navegadores
Subo pra ver os cantores
Já no escurecer do dia
A coisa vai esquentando
Em grandeza e poesia
Mansões e lindas pousadas
Cidades iluminadas
Aumentam minha alegria
A brisa toca macia
Minha tez arrepiada
Disfarço e peço ao garçom
Uma loira bem gelada
A mulher chega e me chama
É hora de ir pra cama
Não quero beber mais nada
De manhã ouço a zuada
Do som que já começou
Já são quase nove horas
Bença mamãe que eu já vou
Posso até não ir beber
Mas subo pra espairecer
Porque é assim que eu sou
Mais um dia se passou
Mais uma noite jeitosa
Regrada a som de primeira
E uma dose caprichosa
De whisky doze anos
Que nem estava nos planos
Êta! noite prazerosa
Tem coisa que é tão gostosa
Que não dá pra explicar
Essa viagem foi tudo
Que você imaginar
E eu ainda acho pouco
Acrescento mais um toco
No bom que você achar
Pra alguém desembarcar
Paramos em Parintins
Não tinha festa de bois
Pouco pisei nos capins
Não se parecia em nada
Com o chão da marujada
De garantido e afins
Dali daqueles confins
Continuemos viagem
Numa das noites fiquei
Observando a paisagem
Vinha balseiro constante
Vi que pra ser comandante
Tem que ter pulso e coragem
Mesmo distante da margem
Pilotar é uma aventura
Porque além do balseiro
Tem que ser na noite escura
Se no meio do entrançado
Vier um pau apontado
E pegar no casco fura
Eu louvo a desenvoltura
De quem trafega nos rios
Em baleeiras canoas
Em batelões ou navios
Ubada ou motor de popa
Por que sei que não é sopa
Desenrolar esses fios
Às vezes causa arrepios
Imaginar uma nau
Vagueando à deriva
No meio de um temporal
O gosto amargo eu não sei
Até hoje não provei
E nem desejo afinal
Basta-me o fato anormal
De cruzar uma baia
Onde não se avista terra
Nem casas nem rodovia
Ali você vê a morte
E se o vento estiver forte
Credo em cruz Ave Maria!
Atravessei nesse dia
Graças a Deus tudo bem
Já não nos faltava muito
Para chegar a Belém
É só mais uma vitória
Para prendar minha estória
De lauréis vindos do bem
Passamos em Santarém
Gostei daquele mercado
Ainda lembro até hoje
Do cardápio variado
Piracui de bodó
Filé, frango e mocotó
E todo tipo de pescado
Já é outro o musicado
E eu já sabia de cor
Tudo que até hoje ouvimos
Mudou para o carimbó
Bom mesmo é jogar sinuca
Beber ouvindo Pinduca
E suar no Sirimbó
Outra vez estou no pó
E em Belém com certeza
A viagem foi tranquila
Recheada de beleza
Aqui termina esta estória
Vou pro terminal agora
Embarcar pra
Fortaleza
Nenhum comentário:
Postar um comentário