José Augusto de Castro e Costa*
Denomino-me Estado do Acre, sou parte integrante da República do Brasil, exerço em meu território os poderes decorrentes de minha autonomia e regulo-me por minha própria Constituição.
Meus limites são definidos no Tratado de Petrópolis de 17.11.1903, no Tratado do Rio de Janeiro de 1909 e reconhecidos no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal.
O processo que me integrou ao Brasil é, verdadeiramente, um dos mais sugestivos ocorridos neste continente. Pensavam transformar-me em colônia, da mesma forma que a Ásia e a África, não fosse a firmeza e tino político de Assis Brasil, ministro brasileiro em Washington, em não aceitar veementemente o "Bolivian Syndicate". Aliás, devo salientar, que todas as questões de fronteiras que o Brasil sustentou com seus vizinhos foram limpas - por isso é que as venceu com dignidade.
Para conquistar-me os brasileiros travaram uma verdadeira odisseia contra os bolivianos. É bem verdade que estes vizinhos enfrentaram capítulos mais dramáticos da História Sul Americana que os brasileiros. Sacrifício, estoicismo, desgraça... marcaram, em grau elevado, as expedições militares saídas de La Paz. E não foi somente a guerra a causadora de tantos males. O impaludismo, as disenterias e o beribéri também fizeram muitas vítimas. Os brasileiros de igual modo sofreram muito os efeitos letais da região nova e agressivamente selvagem. O diferencial residia em lutar na sua própria casa, já adaptados às implacáveis condições do meio-ambiente.
Como por dádiva, sou significativo exemplo da unidade que orientou a formação social do Brasil, isto talvez pela afluência de amazonenses, cearenses, pernambucanos, gaúchos, sírios e libaneses que a mim acorreram. Não obstante as distâncias imensas do sul e ainda ser vizinho de peruanos e bolivianos, mantenho-me integralmente brasileiro na língua, nos costumes e nos sentimentos. Todas as populações que para mim se dirigiram permaneceram brasileiríssimas.
Logo após conquistar-me, o governo brasileiro organizou-me em três Departamentos Autônomos: Alto Acre, Alto Purus e Alto Juruá.
Encerrada a odisseia da conquista e consequentemente após ingressar-me em vida nova, o Cel. Plácido de Castro, meu conquistador, viajou a capital da República, objetivando prestar contas de seus atos enquanto Governador do Acre Medidional, passando às mãos do estadista que promovera a paz e alargara as fronteiras físicas da Nação, Barão de Rio Branco, o relatório referente ao seu governo, durante a vigência do "modus vivendi".
Ao final da segunda década do século XX, as revoltas, as lutas por autonomia e até muitos desmandos, intrigas, perseguições, atentados e assassinatos atingiram níveis absurdamente acentuados em todas as prefeituras acreanas. Servindo-se da Reforma Política de 1920, tais repartições foram unificadas, tendo sido escolhida a cidade de Rio Branco (antiga Empresa) para sediar a minha capital.
Minha História é uma das mais bonitas e tenho sentido orgulho de muitos filhos que têm-se destacado e elevado meu nome. A propósito, percebo que há um traço de psicologia social que caracteriza alguns filhos meus: são um tanto quanto esquecidos - displicentes. Quero dizer que meus maiores filhos e benfeitores mortos têm suas ações heroicas e lucubrações intelectuais, os seus rasgos de caráter, as suas valentias morais e cívicas e as suas grandezas de corações deslembrados e olvidados com uma rapidez inacreditável e indesculpável apreço. Não lhes importa se esses grandes ausentes lhes tenham assegurado o prestígio nas ciências e nas letras, na música, no magistério, na justiça, na política e na administração, levando meu nome, majestosa e alvissareiramente, pelo futuro adiante.
Dr. Epaminondas Jácome |
Poucos sabem que após a minha unificação como Território, meu primeiro Governador foi Dr. Epaminondas Jácome. Quase ninguém sabe que foi o advogado e ex-intendente de Manaus, Dr. Hugo Ribeiro Carneiro, meu quarto Governador, quem construiu em Rio Branco as primeiras edificações em alvenaria, quais sejam: o Palácio do Governo, os três blocos do Quartel da Policia Militar e o primeiro Mercado Municipal, além de trazer-me a primeira agência do Banco do Brasil. Em Xapuri, a primeira Maternidade.
Pouquíssimos sabem que foi o Cel. José Guiomard dos Santos que começou a promover a minha modernidade ao providenciar a pavimentação das ruas de minha capital e dos meus municípios, concluiu obras inacabadas em Rio Branco e no interior, deu início à pesquisa e a plantação das primeiras monoculturas na Fazenda Sobral, na Estação Experimental e Aviário, como também, impulsionou a educação e a saúde construindo escolas e hospitais para atender à população. Foi dele o Projeto de Lei que assegurou à Elevação do Acre a Estado, em 15 de junho de 1962.
Estação Experimental Agrícola Governador José Guiomard Rio Branco - AC |
Quartel da Guarda Territorial de Rio Branco Os três pavilhões do quartel da Guarda Territorial |
Deputado Federal Guiomard Santos em cerimônia de assinatura da Lei 4.070 que eleva o território do Acre em Estado (Foto: Acervo Histórico do Estado).
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Poucos sabem que foi o último governador do Território do Acre, o Eng. Agrônomo José Rui da Silveira Lino quem promoveu o Enquadramento dos Funcionários Públicos do ex-Território do Acre, efetivando-os e garantindo-lhes honrosa estabilidade, assegurando-lhes todos os direitos oferecidos aos Funcionários Públicos Civis da União (Lei nº 1.711 de 28.10.52) e outorgando-lhes dignidade e cidadania.
José Augusto de Araújo Acervo Digital: Memorial dos Autonomistas. |
São poucos os que têm conhecimento de que foi o primeiro governador eleito do Estado do Acre, o Prof. José Augusto de Araújo, possuindo um eficiente Programa de Governo que dava prioridades para a educação, para o desenvolvimento econômico e energético e para a minha integração nacional através de rodovias. Poucos sabem que José Augusto foi atingido pelo golpe militar de 1964, com apenas um ano e dois meses de mandato, em razão de intrigas, invejas, injúrias, mentiras e falsidades, adicionadas a indecisões e vacilações. Esse jovem de 32 anos foi compelido a renunciar, abortando um governo promissor, diante de uma parcela de pessoas pávidas e trépidas, auxiliares contristados e o povo acreano atônito e surpreso.
Finalizando, manifesto até certas dúvidas acerca de quantos são aqueles que lembram que foi o atual senador Jorge Viana quando meu governador, que projetou-me com relevante destaque no cenário nacional, devolvendo-me o respeito e auto-estima, salientando-me os dotes do progresso eminente, com notado desenvolvimento em todos os prismas, trocando-me a roupagem ao inserir-me na modernidade arquitetônica, na urbanização das minhas cidades, sobretudo na minha capital, conservando-me o espírito, refletido no cotidiano do meu povo simpático, bem humorado e hospitaleiro.
Eu, de minha parte, espero sinceramente, que cada acreano tenha o peito repleto de "nobreza, constância e valor", como sugere desde 1903, o honroso jovem médico, ex-combatente de Plácido de Castro e poeta baiano Francisco Mangabeira, num dia de repouso no Seringal Capatará.
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* José Augusto de Castro e Costa é acreano, natural de Rio Branco. Reside em Brasília, e trabalha no Senado Federal, lotado no Instituto Legislativo Brasileiro – ILB.
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