quarta-feira, 12 de abril de 2023

QUATRO POEMAS DE MAX MARTINS (1926-2009)

 
Max, magro poeta

 

Max, magro poeta

na paz dos prados de aquarela

acaso amaste o lírio

colhido às pressas

entre os teus sapatos?

Será que encontraste

em contraste com a flor

a ponta do punhal

dentro da flor?

 

Procura no teu bolso a bússula

e a âncora no teu peito

deste barco prestes a partir

de tua garganta.

Na quilha enferrujada,

na popa ressequida

descobrirás a ilha.

 

Magro poeta, o sol dos muros

ainda anotas

mas, e o sal que escorre

dentro das pedras?

 

Ao pouso inesperado duma asa,

contempla a mosca:

no seu ventre ferve-lhe o poema. p. 31

 

 

Apelo

 

Alma dos que amei trazei

neste minuto de sombra e lodo

o que vos dei no sangue de meus sonhos mortos.

Conjugai – almas que teci – as flores brutas

dos cantos e dos gestos que vos dei.

Almas dos que ergui do chão partido

tais como pedras fecundadas

alimentai o incontido espasmo duma chama

translúcida, azul-vermelha.

Sombras que já pousaram em minha boca,

como se num lago – chegai. p. 43

 

 

Variação do tema A

 

Meiodia entre o macho

a pino

e a fêmea tensa

ao meio

o sol crispa seus raios

                                   estica-os

enlaça

e torce

o torso todo

do colo ao ventre

entre peles-pelos

corta a corda

última

que vibrava

partida agora

a bolha efêmera cresce

na sombra e

                    sobra. p. 56

 

 

O amor ardendo em mel

 

Morder! morder o

hímen adocicado

– frêmito de lâmina

entre duas coxas

do polo ao pólen.

E o apolo laminar morder

Morder os bicos dos figos

antes que murchos

antes dos dentes

sempre morder

e jamais sugar

da lua a sua ferrugem.

Morder somente a sua semente

antes de agora

antes da aurora

morder

e arder em mel

o amor. p. 57

 

 

MARTINS, Max. Anti-retrato: poesia. Belém: ed.ufpa, 2018.

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