sexta-feira, 14 de julho de 2023

VIAGEM PELO BRASIL 1817-1820: Spix e Martius

VIAGEM PELO BRASIL 1817-1820

Edição, em 3 volumes, capa dura

Prefácio de Mário Guimarães Ferri

Tradução Lúcia Furquim Lahmeyer

Revisão B. F. Ramiz Galvão, Basílio de Magalhães e Ernst Winkler

Anotações de Basílio de Magalhães

Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo; Edusp, 1981

Entre as obras de viajantes estrangeiros que percorreram o Brasil colonial, o livro deixado por Spix e Martius goza de reputação especial em face de seus atributos como narrativa de viagem, como inventário científico da Natureza local e como depoimento fiel, colorido e vivo, sobre o homem da época e sua complexa atividade social, econômica, cultural e política. Trata-se, pois, de uma das maiores contribuições ao conhecimento do Brasil dos princípios do século XIX, com os valores culturais do século XVIII e já às vésperas da Independência. Valoriza a edição a consagrada tradução de Lúcia Furquim Lahmeyer revista por B. F. Ramiz Galvão e por Basílio de Magalhães, este último também anotador da obra.

Na viagem, que durou três anos e meio (1817-1820), o botânico Martius e o zoólogo Spix, não obstante sua missão estritamente científica, deixaram-se fascinar pela sociedade brasileira na sua aventura de criar uma nação nos trópicos baseada na multiplicidade de raças e na tolerância cultural de suas correntes tributárias. Embora colônia, já os autores vislumbraram a nação futura. O convívio com negros, brancos, indígenas, mestiços, enfim, em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Maranhão, Pará e Amazonas, amenizou o rigor científico da missão, do que resultou um livro de raro interesse do ponto de vista humano.

No primeiro volume, a riqueza da obra de Spix e Martius, como observação, como constatação e como compreensão dos problemas registrados na sociedade brasileira de então, põe a manifesto imensa simpatia pela terra, pelo homem e pela Natureza. A visão é universal, abrangendo Geologia, Botânica, Zoologia, Climatologia, Etnologia, Música, Política, Economia, diversões, alimentação, técnicas, transportes, condições sociais e, sociologicamente, as culturais. As regiões agora abrangidas pela narrativa incluem o Rio de Janeiro, São Paulo, São João de Ipanema e Vila Rica dos primórdios do século XIX, além da viagem marítima até o Rio de Janeiro. À Medida que aprofundam pelo interior do país ressaltam os autores, na complexidade geográfica e cultural brasileira, os contrastes com o litoral.

No segundo volume da obra, Spix e Martius narram a continuação da viagem partindo de Vila Rica em direção a Belém do Pará através das vastas regiões do Distrito Diamantino, Salvador, Ilhéus, Juazeiro, Oeiras e São Luís do Maranhão. Da mesma forma que no primeiro volume, são aqui realçadas observações, não só do domínio puramente físico da paisagem (relevo, flora e fauna), como de suas possibilidades de riqueza. E, na constante dos apontamentos da grande viagem, os autores continuam a recolher curiosos dados sobre a paisagem humana.

Spix e Martius testemunharam na região aurífera de Minas Gerais os derradeiros esforços da produção de ouro e diamantes, tanto da zona de Sabará como no famoso Distrito Diamantino. Este último ainda conservava os rigores da fiscalização que vinham do século XVIII, onde ninguém poderia entrar ou sair sem ordem escrita do Intendente-Geral. Administração e as técnicas de extração do diamante em Curralinho, Linguiça, Mata-Mata e outras minas são descritas em minúcias, abrangendo inclusive aspectos sociais. No capítulo referente ao Distrito Diamantino encontra-se tabela de produção de diamantes, desde o princípio da administração real, do ano de 1772, até 1818, quando Spix e Martius estiveram na famosa zona diamantífera brasileira.

A viagem é continuada agora pelo sertão interior até o Rio São Francisco. A Natureza e o homem são as constantes da narrativa, elementos de uma simbiose dramática em tão afastadas regiões. Os autores revelam comovente simpatia pelo sertanejo, registrando seu modo de vida, suas alegrias e doenças. Do mesmo modo o Rio São Francisco, pela sua imponência e importância, não poderia deixar de impressionar Spix e Martius, e recolhem soma enorme de informações da vida ribeirinha. A cidade de Salvador é evocada da mesma forma que Ilhéus e algumas vilas do sertão baiano com a vida das caatingas, além de Oeiras, São Luís do Maranhão, até a chegada a Belém do Pará. As estatísticas de que dispunham os autores na época são carreadas para ilustração de suas observações sobre a vida econômica das regiões percorridas. Do ponto de vista histórico, são apresentados elementos da formação do Piauí, Pernambuco, Alagoas, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará.

No terceiro e último volume da obra, Spix e Martius focalizam, em páginas de grande realismo científico, com observações válidas até hoje, a surpreendente Amazônia. Toda sua geografia, ao lado da flora e fauna, em seus pormenores mais significativos, abrangendo a ilha de Marajó, as regiões do Tocantins, Xingu, Tapajós, Rio Negro e Madeira, além de outros cursos d’água de leste a oeste, perpassa aos olhos dos leitores com sua paisagem fantástica e seus fenômenos locais mais típicos, como o das “terras caídas” e o da pororoca. A descrição abrange as numerosas vilas das margens dos rios e do interior, como Fortaleza da Barra, Parintins, Vila de Ega, Tabatinga, Barcelos e outras tantas cujos nomes lembram as origens europeias e indígenas.

Ainda dentro das constantes generosas de sua viagem, Spix e Martius focalizam, com grande simpatia, a dramática aventura do homem nessa moldura de terra primitiva, aventura expressa em termos de moradias, de vida cotidiana, diversões, alimentação e higiene, todo um esforço humano para dominar a paisagem física adversa e sobreviver com seu destino de povoamento e conquista.

Trata-se de um quadro rico de informações e observações, tanto do ponto de vista da formação orogênica da Amazônia e do regime dos rios, como dos produtos naturais vegetais e minerais, da topografia, da etnografia e da economia política. Esta minúcia de dados de informação demonstra consciência de Spix e Martius sobre o trabalho que realizavam, “descrever nesta relação de viagem tanto a feição física do país como os costumes, a vida intelectual e burguesa dos habitantes, também as nossas impressões durante a estada ali, é tarefa cuja significação histórica tanto mais grandiosa parece quanto mais rápido o Brasil se vai antecipando no seu desenvolvimento”.

Ainda uma vez se põe em relevo, neste terceiro volume da importante narrativa de viagem de Spix e Martius pelo Brasil, a contribuição iconográfica dos autores, com desenhos originais de situações, paisagens, elementos humanos, que elucidam passagens do texto. Outrossim, as notas de Basílio de Magalhães valorizam o texto de Spix e Martius em suas implicações particularmente econômicas e históricas com a coleção de tabelas, dados estatísticos esclarecedores.

Continua também neste volume o anexo de peças musicais recolhidas entre os indígenas, principalmente indígenas remadores da Amazônia.

 

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Nota: texto retirado, respectivamente, da orelha dos três volumes.

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