quarta-feira, 31 de março de 2010

DOROTHY STANG

Narrativa da morte de Ir. Dorothy Stang, por Binka Le Brenton.
Dorothy se voltou para ir, e Eduardo acenou. Rayfran puxou a arma. “Irmã!”, ele gritou.

Dorothy se virou e viu a arma. Ficou ali parada um instante, paralisada. “Meu Deus!”, disse a si mesma. “Ele realmente quer me matar.”

“Bem, senhora, ela o ouviu dizer, se não resolvermos este assunto hoje, não resolveremos mais.”

[...]

“Não faça isso”, ela dizia para Rayfran. “Não atire em mim.”

Rayfran ficou tenso. “Tira a mão da sacola!”, ele gritou. “É uma arma o que você tem aí ou o quê?”

“Eu não tenho arma”, ela respondeu em sua voz suave. “Minha única arma é esta.” E ela tirou sua Bíblia e a abriu calmamente.

Rayfran e Eduardo a observavam, hipnotizados. Detrás da árvore, Cícero fechou os olhos e rezou uma breve oração. Aproveitando-se de reservas que ela nem sabia que tinha, Dorothy leu com uma voz equilibrada: “Abençoados são os puros de coração, pois eles verão a Deus. Abençoados sãos os dóceis, pois eles herdarão a terra. Abençoados são os que têm fome e sede de justiça...”

Ela fechou a Bíblia e olhou nos olhos de Rayfran. Eles estavam duros como uma rocha. “Bem, senhora”, ele lhe cuspiu, “chega disso.”

O silêncio da floresta foi rompido por um tiro e Dorothy caiu por terra. A última coisa que viu foram as botas de Rayfran, de pé, esvaziando o tambor de seu revólver. Tudo ficou preto.

Os dois matadores se viraram sem uma palavra e correram para dentro da floresta. Cícero segurou a respiração e os observou enquanto partiam, e então, soluçando, correu na direção oposta o mais depressa que seus pés podiam levá-lo.

Houve um silêncio absoluto e então começou a chover sobre o corpo de Dorothy deitado na estrada, misturando seu sangue com o barro vermelho do chão da floresta.


BRETON, Binka Le. A Dádiva Maior. São Paulo: Globo, 2008.
Fotos: CNBB

5 comentários:

Wanderley Elian Lima disse...

Que país é esse?Leis, normas, justiça não passam de meras belas palavras escritas numa Constituição que está sempre privilegiando os mais fortes economicamente. Os que sonham e lutam por uma sociedade mais igualitária são considerados inimigos da pátria. Lamentável.
Forte abraço

Unknown disse...

Nossa, o julgamento dos culpados pela morte da Irmã Dorothy foi uma vergonha...
Pior que nossas leis são frágeis, e muitos assassinatos continuam acontecendo, e as punições, cadê? Um horror!
Enquanto isso, crimes vão correndo soltos, e quem tem coragem de lutar contra os poderosos correm risco de morrer. Lamentável..

Manhosa LobaVirtual disse...

Meu Querido Amigo do Coração

O que a comentar... só que... Irmã Doroty cumpriu seu tempo neste mundo...

Bjs.

Trupe Família Clou disse...

Gostei do título do blog.Sou Talita Acrênea,nunca estive no Acre mas meu pai me deu este nome em homenagem a terra dele e de minha vó.
Sinto muito por todos os que tem que morrer para fazer -se ouvir .
Grande abraço,
Talita

marcioacordeiro disse...

Eu estou lendo esse texto em 2016, inconformado com essa injustiça. A vida humana perdeu totalmente o valor no mundo dos homens.