Sentei-me
no despenhadeiro e ali fiquei,
deixando
vagar a Imaginação.
A manhã
era tão fria
que a
própria Natureza recolhera
sua
costumeira alegria. Nenhum pássaro
ou
vento, nenhum ramo se punha
em
movimento. E assim, aplacados
meus
instintos, deixei que indistintos
vultos
emergidos da bruma tomassem
minha
mão e me conduzissem ao recesso
no
qual, solitário, pulsa o coração.
Inclinei-me
sobre ele, apurei
os
ouvidos, e, dentre o espesso rumor
que a
vida faz ecoar nas veias,
chegaram-me
alguns aulidos
distantes,
quase irreais.
Mas,
ainda assim, por tê-lo há tanto
tempo
aprisionado em mim,
pude
entender o que dizia.
“Aonde
vais?” – perguntou,
num tom
angustiado de quem mais quer
indagar
do que saber.
“Vou
para a morte” – respondi, com ironia.
Calou-se,
por um instante, e eu,
assustado,
pensei que de fato morria.
“Mas é
para a vida que nasceste” – disse ele,
pulsando
mais forte. “Não permitas
que a
tristeza, o desânimo, a descrença,
te
desviem do caminho.
Vive
com alegria, assume teu destino
como um
guerreiro soberano.
Que a
Beleza seja teu guia e a Esperança
a tua Luz,
que acendi quando
eras
uma criança. Não ouças o que diz
a gente
que amaldiçoa a vida.
Sua
alma é mesquinha
e dela
só nos chegam medos.
Abandona
esses frutos azedos e busca
a
essência do teu Ser.
A vida
não passa de ilusão, sim, mas foi essa
a
missão que te deu o Universo.
Quanto
à morte, não te preocupes
em
buscá-la, pois anda sempre contigo,
desde
que te viu nascer. Ela te arrebatará
um dia
mas o que fizeres
pela
vida há de permanecer.”
Levantei-me
então e segui meu caminho,
abençoando
esse vulto esguio
que me
serve de companhia. E quando
ele ri,
com descarnadas gengivas,
eu sei
que exerce o seu papel, a fim
de me
tornar ainda mais desperto
e
espanar de mim os meus pesares.
Pois se
eu estou no centro da ampulheta
e a
vida é ilusão, antes que o chão se abra
sob mim
quero brilhar intensamente
e
consumir o último vestígio do meu Ser.
Já que
a morte me tem suspenso
sobre o
abismo, por um fio, que leve
de mim
apenas o casulo vazio.
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