Eduardo Alves da Costa
Os poetas pululam feito moscas
Os poetas pululam feito moscas
neste verão. O que não falta, por aqui,
é inspiração. Qualquer pingo de gente,
ainda nos cueiros, ensaia os primeiros passos
na gramática, faz uma leitura ligeira
dos clássicos, e, após meio ano de prática,
sai aos trambolhões, num voo rasante
sobre a arte de Camões.
Alguns se estatelam, dão com os cornos
no ridículo; outros voam em círculo,
à espera de uma corrente ascendente;
muitos desaparecem na bruma ou se tornam
prosadores, juízes, balconistas, vendedores
de enciclopédia, fazedores de média
junto à mídia, ou, em casos extremos
- veja que delícia -, agentes de polícia.
E ao final da safra,
depois de pisadas as uvas pelas patas
da vida, fermentado os humores,
concedidos os favores das musas
e concluído o trabalho de alimentar
o lagar, talvez nos fique algo
para guardar nos tonéis de carvalho.
Aos mais afoitos não agrada tal submissão
ao tempo, o estarem destinados a outra
geração.
Desejam ser tragados sem demora,
mesmo que depois os deitem fora
num revirar de tripas.
Enfim, isso de repousar, em tom dourado,
num copo de cristal, a ser saboreado
pelo gourmet,
é coisa, já se vê,
para uvas de fina cepa, a derradeira
armadilha na qual a matilha
aventureira se
estrepa.
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