terça-feira, 28 de maio de 2024

CUIA PITINGA: POEMAS DE JACQUES FLORES

O jornalista, poeta e cronista Jaques Flores (Luiz Teixeira Gomes) nasceu em Belém, a 10 de julho de 1898 e faleceu em 12 de dezembro de 1962. Publicou, entre outros, Berimbau e Gaita (1925), Cuia Pitinga (1936) e Panela de Barro (1947).

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NA BORDA DA CUIA

 

Caboclo bom, papa-chibé de peso,

desses que sabem como se gapuia,

na terra firme meu andar é teso

e na água sempre eu fico de bubuia.

 

Si contra a panemice eu tenho veso,

e tomo banho só usando cuia,

isso é porque, graças a Deus, aceso,

tenho, nas veias, sangue de tapuia.

 

Sangue que enche de luz minha cabeça;

faz que eu esprema o murici do Sonho

e o sumo dele a todos ofereça...

 

Sumo que tira azar, tira caninga,

e que podem beber, pois eu o ponho

nesta puranga-été CUIA PITINGA! p. 9

 

 

XI

 

Sol a pino. Meio dia.

Ferve a panela de peixe,

sem que a mãe-velha Maria

de estar vigiando a deixe.

 

O Juca o terçado afia

e de lenha faz um feixe.

Isso para que a nhá tia

não reclame, não se queixe.

 

Estando o peixe cozido,

um prato de barro escolho

num paneiro assim metido.

 

No prato faço um pirão

de farinha d’água e molho

de sal, pimenta e limão. p. 23

 

 

XIII

 

Estamos no copiá.

É noite. O Remundo ensina

como se faz aturá

ao filho da nhá Sabina.

 

O Libório bebe um chá

de casas de louro e quina.

Com a tosse, que, após, lhe dá,

quase apaga a lamparina.

 

De dentro dum velho saco,

tiro uma faca de ponta

para migar meu tabaco.

 

Aí, então, o Remundo

se faz sabido e nos conta

casos de bichos do fundo. p. 25

 

 

XXV

 

É uma choça de palha de inajá,

de onde se avista, perto, o igarapé.

Nela, sempre, se bebe tacacá,

e, manhãzinha, é certo, o caribé.

 

Beijú, batata doce, mel, cará,

tudo se come na hora do café.

Às vezes, peixe assado também há,

com pimenta, limão e com chibé.

 

Depois do almoço, a cuia de açaí.

No copiá a rede de cipó,

onde me deito com o pensar em ti...

 

Camisa aberta, mostro o peito nu.

Feliz, ali, nada me aflige. Só

Acho que alguém me falta. Alguém que és tu. p. 37


FLORES, Jacques. Cuia pitinga: humorismo da Amazônia. Rio de Janeiro: Adersen-Editores, 1936.

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