GESTA DO PANTEMPO
“Quero é perder-me no mundo
Para fugir do mundo.”
Augusto Frederico Schmidt
No fundo,
é tédio.
O desespero
como companheiro,
a tarde desata
os seus tons
de róseo
e cinza.
Morre
dentro de mim,
o velho poeta passadista,
que padece
da dor
dos precipícios amargos
e demasiadamente
violentos.
A vertigem
do tempo
é uma
sombra
paralítica
a rir dos frágeis
gestos
da testemunha
irrevelada.
Trago nos olhos,
a tristeza
das voragens,
uma certa melancolia
acesa,
travada
nos arreios adormecidos
da infância,
que ultrapassa
a existência,
por ser repositório
de saudades
e eternidades
infindas.
O sonho
é uma bile negra,
o rastro das descobertas
sem propósitos aparentes.
Digo muito
das telhas
despencadas,
dos mistérios
que dormem
nos anseios
dos pássaros
insulares.
Comovo-me
com palavras felizes:
girassol, campo, andorinha,
céu, riacho, relva,
cavalo, boi, arado…
E mais alguma
procela
de pantempo
que move
o presságio.
O corcel
do universo
é amarelo
e vagueia
em seu abismo
de imagens.
O que tenho?
Miro a fonte
dos segredos.
A poesia é fuga…
Um partir desorientado
a seguir o rumo
do desencontro…
Correm fantasmas
nas noites
que clareiam
a alma
pé ante pé
na arribação
do cosmos
na agonia
que transcende
as velas
espantadas
do passado…
Cruzeiro do Sul (AC), Amazônia, 05 de abril de 2020.
ISOLAMENTO
“vamos dar vazão a toda essa dor,
porque se o fizermos juntos,
poderemos suportá-la.”
Concita de Gregorio
palavra nenhuma
suporta
a dor da solidão.
declaro o nome
dos meus mortos
no tempo
e trago para mim
a sílaba etérea
dos seus sonhos.
isolo os cravos
no crepúsculo,
porque sei
da porta
escura
da hora
seguinte.
só morrerei
na noite
em que estacado,
o meu coração
desistir de mim.
não posso
coexistir
mitigado
e desprovido
de amor.
quem poderá?
quem sobreviverá
ao fogo solitário
da vida
que preserva
o mistério
e a ironia
do não ser?
à distância,
prego o que sofro,
já que
no sofrimento
posso alegrar
o meu próprio fim.
ao norte do mar
da minha vida,
longe das areias
que perfuraram
os meus pés,
choro às escondidas.
poeta, pretérito do futuro,
o futuro no passado largo,
quem poderá
unir a alma
aos sussurros inaudíveis
do tempo?
quem poderá
escutar a beleza de um poema
quando tudo
for escuridão?
quem ainda terá rosto
para exprimir o atônito
negrume de uma
desesperança?
Cruzeiro do Sul (AC), Amazônia, 31 de março de 2020.
Poemas extraídos do livro Rosa numinosa (2022), de Diego Mendes Sousa.
Diego Mendes Sousa é natural de Parnaíba, no litoral
do Piauí. Poeta, jornalista, advogado, indigenista, com atuação em Cruzeiro do
Sul, vale do Juruá, Acre. É autor de Divagações (2006); Metafísica do
Encanto (2008); 50 Poemas Escolhidos pelo Autor (2010); Fogo de
Alabastro (2011); Candelabro de Álamo (2012); Alma Litorânea
(2014); Coração Costeiro (2016); O Viajor de Altaíba (2019); Gravidade
das Xananas (2019); Tinteiros da Casa e do Coração Desertos (2019); Velas
Náufragas (2019); Fanais dos Verdes Luzeiros (2019) e Rosa Numinosa
(2022).
Para adquirir os livros, acesse:
https://www.editorapenalux.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário