sábado, 25 de agosto de 2018

O ARCO-ÍRIS

Eduardo Galeano (1940-2015)

Os anões da selva tinham surpreendido Yobuёnahuaboshka em uma emboscada e tinham cortado sua cabeça.
Aos tropeços, a cabeça regressou à região dos cashinahua.
Embora tivesse aprendido a saltar e a balançar com graça, ninguém queria uma cabeça sem corpo.
– Mão, irmãos meus, vizinhos – se lamentava. – Por que me rejeitam? Por que têm vergonha de mim?
Para acabar com aquela ladainha e livrar-se da cabeça, a mãe lhe propôs que se transformasse em alguma coisa, mas a cabeça se negava a transformar-se no que já existia. A cabeça pensou, sonhou, inventou. A lua não existia. O arco-íris não existia.
Pediu sete novelos de lã, de todas as cores.
Fez pontaria e lançou os novelos ao céu, um atrás do outro. Os novelos ficaram enganchados além das nuvens. Se desenrolaram os fios, suavemente, para a terra.
Antes de subir, a cabeça advertiu:
– Quem não me reconheça, será castigado. Quando me vejam lá em cima, digam: “Lá está o alto e belo Yobuёnahuaboshka!”
Então trançou sete fios que estavam pendurados e subiu pela corda até o céu.
Nessa noite, um talho branco apareceu pela primeira vez entre as estrelas. Uma moça ergueu os olhos e perguntou, maravilhada: “O que é isso?”
Imediatamente uma arara vermelha lançou-se sobre ela, deu uma súbita volta e picou-a entre as pernas com seu rabo pontiagudo. A moça sangrou. Desde este momento, as mulheres sangram quando a lua quer.
Na manhã seguinte, resplandeceu no céu a corda de sete cores.
Um homem apontou com o dedo:
– Olhem, olhem! Que estranho!
Disse isso e caiu.
E essa foi a primeira vez em que alguém morreu.

GALEANO, Eduardo. Memória do fogo, 1: nascimentos. Tradução Eric Nepomuceno. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. p.28

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