sábado, 26 de fevereiro de 2011

CRÔNICA DA MINHA FILOSOFIA BARATA: O LOBO SEMPRE VENCE NO FINAL

Jairo Nolasco
Ontem tive a oportunidade, diria não muito desejada, de receber a visita do dono do alheio. Ele veio na madrugada no melhor do meu sono, aproveitando a noite de chuva invernosa _ só quando as nossas choupanas amazônicas ficam refrigeradas e deixam nossos sentidos mais dormentes _ para me aliviar de alguns bens adquirido pelo ofício. Quando despertei, repentino, do meu descanso já era sem jeito, o convidado non grata já se tinha ido. Restava apenas o latido agoniado do cachorro e o forte cheiro de enxofre deixado pela fumaça que encobria seus rastros.

Queria eu tê-lo encontrado? Não sei ao certo. A arma artesanal deixada na fuga, apresentada na imagem acima, demonstra que ele não estava muito a fim de papo. Queria, porém, parabenizá-lo pela empreitada. Ele é sortudo porque a lei e a moral não o restringe. Ele pode quebrar o Contrato Social de Rousseau. Ele não está preso ao que restou do compêndio do Richard Baxter e da ética puritana. Aliás, minha Visita Secreta não está preso a nada. Não é preciso da dedução ou da inferição "sherloqueana" para saber que aprendeu fazer aquele tipo de arma em uma alguma dessas unidades de recuperação social. E que recuperação!!

Gabaria sua condição privilegiada. Ele sempre estará um passo na frente. Eu nunca saberei quando virá novamente. Esperarei dias, meses, perdendo o sono. Ele dormirá tranquilo, me matará no cansaço da espera. Quando decidir, voltará a carga quando eu estiver novamente dormindo. E o seu lucro financeiro será grande. Cada coisa que ele levou, paguei os impostos nela's contidos. Ele conseguiu livre. Tudo é franqueado no furto. Sorte minha e burrice dele que só eram velhos cacarecos.

Enquanto cumpria minha carga horária escolar e de trabalho , me impunham a lei Draconiana, a moral e a ascese Calvinista e Capitalista, ele, coitado, era vítima de um tal de "sistema". Por isso aprendeu a manusear e fabricar armas, dilacerar a pele e espetar os órgãos internos dos corpos alheios. Seu porte de arma é garantido, a lei não o alcança. Está preparado para a batalha corporal, eis mais uma vantagem. O seu único horário é à noite. Ele está pouco preocupado se é o velho ou é o novo horário. Tanto faz ser às 03 ou às 02 da manhã. Só torce pela fina e fria chuva da madrugada. Há engenhosidade no plano.

Tenho por minha minha propriedade o direito fundamental garantido pela nossa misericordiosa Constituição Federal, desde que _ claro_ pague o IPTU. Mas o direito não é absoluto. Se sem cautela abro a porta que dá para a área de serviço onde o pobre coitado estava fazendo seu trabalho e ele revoltado me desferisse uma, duas estocadas com essa arma artesanal atingindo minha jugular ou carótida interna _ que ele aprendeu onde ficam, nas lições sobre a anatomia humana nas suas aulas de recuperação social _ seria eu só mais um pai de família, no lugar errado na hora errada a atrapalhar o serviço alheio. Será que dei sorte ?

Em espírito, não necessariamente em verdade, desejaria a ele que não voltasse mais vezes. Fosse procurar outras oferendas em outras propriedades, senão a dele mesmo. Vai homem livre das propriedades alheias, enquanto eu me preocupo em reforçar as grades e contratar um cão mais feroz que não tenha medo de água para vigiar melhor minha reclusão. O desvalido, se cair, ainda tem direito ao Auxílio Reclusão. Eu pago os impostos. Os defensores dos direitos humanos pensaram e pensam nele, em mim não. Quem mesmo leva vantagem no fim?

E no ocaso ficaria, como fiquei, com a rústica arma dele. Pediria que não me processasse. Diria: Sei que não foi uma troca justa. Vossa Senhoria trabalhou pesado para fabricá-la; as coisas das quais se apossou, eu já as recebi prontas, a minha mais- valia não estava ali posta. Peço desculpas pelo susto. Bom furto.

Já disseram que o homem é o lobo do homem? Pois, bem por via de dúvidas, eu não sendo o cordeiro da dupla _ me recuso a semelhante papel, trataria de dá-lhe no mínimo dois tiros, um de defesa e outro de garantia, quer ser lobo? Então que vá ser lá onde os raios o partam! Fez bem em fugir antes da minha chegada, o filhote das teorias humanistas. Da próxima vez não farei tanto barulho (proposital), para ter dar a chance de fugir, escravo do mal...

***

*JAIRO NOLASCO vive em Cruzeiro do Sul - AC. Dono de uma ironia-sarcástica requintada, que nos faz pensar num Machado de Assis, é impossível findar um texto seu sem aquele sentimento de incômodo e/ou deslumbramento. Fugindo da crítica fácil e medíocre, tão comum nessa nova onda blogueira acreana, Jairo Nolasco se diferencia de tudo o mais que se tem escrito  no Acre, pelo seu estilo próprio de contar-denunciar, em escrachar o verbo de forma poética, literária, profunda. Jurubeba é planta que amarga, cheia de espinhos... incomoda. Não é por acaso que seu blog se chama JURUBEBA JURUAENSIS.

2 comentários:

Luciane Moraes disse...

Bom dia! Amigo

Passei pra dizer que meu blog mudou de endereço:
http://olharacreano.blogspot.com/

E desejar um final de semana abençoado pra vc*

Depois eu volto para ler o texto com calma.

Abraços,
Lu

Maria Adriana disse...

Good afternoonnnnnn,

I enjoy "Alma Acreana". I love Jurubeba's, too. Good luck and congatulations.