REINALDO JOSÉ LOPES
Os tiranossauros podem até ostentar a fama de
rex ("rei", em latim) em seu nome científico, mas paleontólogos
brasileiros acabam de ajudar um rival a destroná-los.
O usurpador vitorioso é um gigantesco jacaré
do Acre, cuja mordida era uma das mais poderosas de todos os tempos, duas vezes
mais devastadora que a do temido T. rex.
Trata-se do Purussaurus brasiliensis, monstro que vivia nas vizinhanças dos
atuais rios Purus, Juruá e Acre na época do Mioceno, há 8 milhões de anos.
A espécie já era conhecida dos cientistas há
tempos. No novo trabalho, porém, os pesquisadores fizeram as primeiras
estimativas detalhadas de seu tamanho, do peso, da força da mordida e do
consumo diário de comida, com base em modelos matemáticos e comparações do
bicho com todas as espécies atuais de crocodilos e jacarés.
Após muitas contas, a equipe concluiu que uma
bocada do P. brasiliensis exercia, em
média, uma força de 70 mil newtons – o equivalente a 7 toneladas de pressão. O
valor corresponde a mais de dez vezes a potência da mordida de um leão, e a
mais de 20 vezes a de um tubarão-branco.
Os cálculos indicam ainda que o monstro
alcançava 12,5 m e 8,5 toneladas, consumindo 40 kg de alimentos por dia.
SÓ FILÉ
“Alimentos”, no caso, significa carne. “Os
dentes relativamente mais achatados e serrilhados dele são típicos de
hipercarnívoros, como certos dinossauros. É dentição especializada em fatiar a
presa”, diz Aline Ghilardi, paleontóloga da UFRJ (Universidade Federal do Rio
de Janeiro) que é coautora do estudo ao lado do marido, Tito Aureliano, da
UFPE, de Pernambuco.
Não faltavam opções para os carnívoros do
Mioceno no Acre. Do ponto de vista do P. brasiliensis, a região talvez
parecesse um imenso açougue a céu aberto.
Isso porque essa parte da Amazônia na época
era um superpantanal, com vastas áreas alagadas e uma rica biodiversidade que
incluía tartarugas gigantes, aves aquáticas, roedores de até 700 kg
(megacapivaras, digamos) e outros mamíferos grandes.
A estrutura da mandíbula e do crânio do bicho
ajuda a entender por que ele conseguia morder com tanta violência. “O formato
da cabeça ajuda o animal a sustentar o estresse de uma mordida mais forte”,
explica Ghilardi. No caso, a carona curta e larga do P. brasiliensis, bem como
o focinho alto, eram cruciais para essa tarefa. Além disso, as narinas
peculiares, de grande tamanho, também ajudavam a dissipar as tremendas forças
geradas pelas bocadas, evitando fraturas.
O principal espécime usado no estudo foi
coletado por Jonas Pereira de Souza Filho, ex-reitor da Universidade Federal do
Acre. Segundo Douglas Riff, outro coautor da pesquisa e um dos principais
especialistas em jacarés e crocodilos fósseis do país, os acrianos têm feito um
trabalho de primeira na região.
“Eles são os grandes descobridores e
guardiões dos fósseis”, diz Riff, que trabalha na Universidade Federal de
Uberlândia (MG).
Acredita-se que as características
superlativas do P. brasiliensis
tenham sido também as razões de sua queda.
Com tanto tamanho, a criatura provavelmente
dependia de um ambiente rico em presas de grande porte para prosperar. No
entanto, as transformações geológicas na Amazônia, ligadas ao aparecimento das
grandes montanhas dos Andes, destruíram o superpantanal da região, eliminando o
jacarezão e várias outras espécies contemporâneas.
A pesquisa foi publicada na revista “PLoS ONE”.
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