Inês Lacerda Araújo
Como em geral se inicia um curso de
Filosofia, seja para alunos do Ensino Médio, seja para universitários?
Com a definição do termo, "amigo da
sabedoria" (philos = amigo; sophos = sabedoria), os primeiros filósofos
(desde Tales até Sócrates, Platão e Aristóteles); em seguida entram os temas ou
a divisão da filosofia em suas sub-especialidades:
- o Ser = Metafísica, Ontologia, Teodiceia
- o Conhecer = Teoria do Conhecimento, Epistemologia
(ou Filosofia da Ciência), Lógica, Filosofia da Linguagem, Filosofia Social,
Filosofia da História
- o Valor (ou o Agir) = Ética, Estética,
Teoria dos Valores
Alguns professores iniciam com a História da
Filosofia antiga, mas como levar os alunos a compreender noções básicas como a
de “ideia” para Platão? E que dizer, mais adiante, de filósofos complexos como
Kant? ou Hegel?
A tentação é ir logo para a chamada filosofia
prática, engajada, para plantar na cabeça dos alunos uma linha, a da dialética,
a da luta social, a do poder à classe oprimida, aos camponeses, aos pobres em
geral. Insufla-se a ideia de que a injustiça social é um problema básico do
capitalismo, que este é basicamente o mal social maior. Visa o lucro.
Ora, é fácil e perigoso instilar esse tipo de
ideologia, evidentemente não se trata de Filosofia... Trata-se de desonestidade
intelectual, pura e simples.
Por outro lado, o ensino tradicional requer o
uso de muitos conceitos abstratos, aos quais os alunos não estão habituados. E,
nessa altura, com tanta nomenclatura, o interesse dos alunos se esvazia...
Como contornar o problema didático (ensinar
temas e conteúdos, e também História da Filosofia) e despertar o interesse,
levar os alunos à compreensão do que seja Filosofia e filosofar?!
Sugestão: sem deixar de lado o compromisso
didático com os temas e conteúdos, a cada vez que se introduzir um tema (por
exemplo, em Metafísica, o tema do ser, da existência, das causas), entraria um
filósofo para ilustrar o conceito em questão, e, importantíssimo, o professor
começa a levantar dúvidas, a fazer perguntas. O meio para atingir o interesse é
estimular a curiosidade, levar a reflexão à experiência pessoal, à vida, aos
interesses, ao modo de agir e de pensar dos adolescentes e dos jovens.
Tomando o exemplo da questão do ser (que é
das mais abstratas), o professor pode indagar sobre tudo o que existe, como
existe, e que todos os seres vivos fatalmente acabarão, morrerão. Se alguém
teve a dolorosa experiência da morte de alguém próximo, que é “fim”, “não ser
mais”, pedir que o aluno tente expor como é não ser mais, a ausência, a
sensação de nada, de vazio. Na medida do possível, o professor deve usar
vocabulário do dia a dia para facilitar a reflexão.
***
Moore, um filósofo contemporâneo, intrigado
com a experiência de que seria pai, perguntou a sua esposa:
“Como é carregar em você um ser que não é o
seu ser?” E indagações como essa podem levar a insights filosóficos. O
professor pode pedir para que seus alunos escrevam respostas a esses
questionamentos do cotidiano.
Quando o mestre menos esperar, seus alunos
estarão se iniciando no caminho filosófico.
* Inês Lacerda Araújo - Professora de Filosofia durante 40 anos, na UFPR, e nos últimos anos na PUCPR. Autora de livros sobre Epistemologia, História da Filosofia e Teoria do Conhecimento. Atualmente aposentada.
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