Foto: Marcus Vinicius Lameiras |
No teu corpo de flor trepida e estua
Todo o forte esplendor, toda a grandeza
Desta
terra, que é tua.
Sempre que te vejo, creio
Sempre que te vejo, creio
Que
esta gloriosa Natureza
Da Amazônia, a enciumar terras e espaços,
Te
acalentou em seus braços,
Deu-te
o leite do seu seio.
No mundo heleno,
Em um mito qualquer, tão doce quão perfeito
Muitas vezes se viu a Terra pondo o peito
À
boca de um deus pequeno.
Assim, também, num símbolo plutônico,
Eu, numa lenda, te poria
Sobre o seio amazônico,
Para compor outra Mitologia.
Para compor outra Mitologia.
Copiaste
a esta terra
O que ela, quando expande
Sua alma e vigor, encerra
De
belo de grande.
*
* *
Exemplo:
Na
pompa egrégia
Do teu porte alto e risonho,
Tu és a Vitória-régia
Do lago azul do meu Sonho!
A água é muda e quieta...
Vida nenhuma seu dorso anima:
Nenhuma borboleta,
Nem uma asa, por cima...
Apenas,
Enquanto o lago, num mistério, sonha,
Voga, cheia de sol, pelas águas serenas,
A ninfeácea tristonha...
É somente uma folha.
É, apenas, a lembrar uma selva redonda,
Um círculo que ninguém olha,
Uma folha sem flor que à luz lhe corresponda.
Chega, porém, o dia
Chega, porém, o dia
Fatal;
Chega o momento em que a monotonia
Foge e em que, forte e mortal,
A Natureza vem, e lenta,
Babuja a equórea planície
A espantar muda e mágoa:
E logo uma flor rebenta
À superfície
D’água!
Rebenta... Porém, rebenta
Rugando do lago a face,
Dando à Solidão,
Com a mesma força violenta
Do amor sincero que nasce
Do fundo de um coração!
E logo por todo lago
Há um forte estremecimento;
No mais amoroso afago,
– A asa do Vento
Macio,
Leva a branda água encrespada,
Num sonoro arrepio,
Às canaranas frágeis da beirada...
E a flor emerge, alva e nua,
No seu esplendor estranho,
Sem que haja outra que possua
Seu perfume e seu tamanho!
E domina, em roda,
Tudo.
A imperar sobre a água toda,
Aberto o seio alvo e mudo
À carícia materna do luar,
Sabendo que, em si, resume
A pátria onde floresce, enche com o seu
perfume
As margens, a água, a terra, a lua, as
folhas, o ar...
*
* *
Já vês que, na pompa egrégia
Do teu porte alto e risonho,
Tu é a Vitória-régia
Do lago azul do meu
Sonho!
CAMPOS, Humberto de. Poesias Completas. São Paulo: Opus, 1983. p.285-288
CAMPOS, Humberto de. Poesias Completas. São Paulo: Opus, 1983. p.285-288
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