José Américo Augusto Olimpio Cavalcanti dos
Albuquerques MARANHÃO SOBRINHO nasceu em Barra do Corda, interior do Maranhão,
em 25 de dezembro de 1879, e morreu em 1915, no mesmo dia em que completava 36
anos, em Manaus-AM. Publicou apenas três livros: Estatuetas (1909); Papéis velhos...
roídos pela traça do Símbolo (1908) e Vitórias-régias
(1911). “É Reis Carvalho, com acerto, quem aponta
para o hibridismo do poeta e de sua geração, nascido na confluência dos séculos
e no remoer repetitivo da transição literária: “Mas se em Maranhão Sobrinho a
ideia é simbólica, o sentimento é romântico e a forma, parnasiana”. Um dos fundadores
da Oficina dos Novos e da Academia Maranhense de Letras, seus sonetos tiveram
por momentos grande popularidade no Maranhão.”, assinalou o crítico Assis
Brasil sobre o poeta.
SOROR TERESA
morta, da cor de um sonho de noivado,
silêncio cristão da estreita cela,
lábios nos lábios de um Crucificado...
somente a luz de uma piedosa vela
ungia, como um óleo derramado,
o aposento tristíssimo de aquela
que morrera num sonho, sem pecado...
Todo o mosteiro encheu-se de tristeza,
e ninguém soube de que dor escrava
morrera a divinal soror Teresa...
Não creio que, de amor, a morte venha,
mas, sei que a vida da soror boiava
dentro dos olhos do Senhor da Penha...
OLHOS DE AMOR
Maranhão Sobrinho (1879-1915)
Volve-me os olhos límpidos! que um raio,
Volve-me os olhos límpidos! que um raio,
vindo do sol dos teus olhares, canta
nos meus sonhos assim, como a garganta
de uma ave dentro do calor de Maio!
Há dos teus olhos sob os cílios, quanta
luz há nos céus em que te vendo, caio...
Vives em mim num límpido desmaio,
santa nos beijos e nos olhos santas!
Trazes no olhar, em milagrosos traços,
o rimance irial do meu passado
feito de beijos, lágrimas e abraços...
Volve-me os olhos de saudade cheios!
Brilha o meu sonho, em sonho, alcandorado
nas torres de marfim dos teus dois seios!
SARAH
SARAH
Maranhão Sobrinho (1879-1915)
Quando os seus olhos, flébeis de meiguice,
Quando os seus olhos, flébeis de meiguice,
fecharam-se e a mudez beijou-lhe a face,
não houve um ramo só que o não sentisse
nem um ninho, um sequer, que não chorasse...
Diria que a uma súbita velhice
voara minhalma em glacial trespasse,
naquele dia, quem meus olhos visse
e os meus cílios, de perto, contemplasse!
Fora melhor, melhor a toda a prova,
se, com o corpo de Sarah, descambasse
o corpo meu também na mesma cova!
Se com a sua a minhalma se esvaísse,
não havia um ninho só que não cantasse,
nem uma rosa, nos rosais, que não sorrisse!
TURRIS EBÚRNEA
Maranhão Sobrinho (1879-1915)
Quando meus olhos se cerrarem, quando
Quando meus olhos se cerrarem, quando
a mágoa me cerrar os olhos, certo,
irei aos céus, em lágrimas, sonhando
ver-te e beijar-te, em lágrimas, de perto...
Oh! mas a morte já me está tardando!
no entanto sinto-a no meu passo incerto...
E eu quero entrar no teu amor chorando,
no teu amor aos mártires aberto!
Quero, deixando os pélagos e abismos
do mundo, ver-te, lá nos céus, sagrada
na grande Páscoa azul dos Misticismos!
Dos beijos teus tenho saudade e fome...
Minhalma vive, em dor, crucificada
nas cinco luas cheias do teu nome!
VÊNUS
Maranhão Sobrinho (1879-1915)
Quando o seu corpo à flor das ondas veio,
Quando o seu corpo à flor das ondas veio,
guirlandado de espumas e sargaços,
de seduções a vaga encheu-lhe o seio
e, de traições, a sirte encheu-lhe os
braços...
Por todo o mar houve um supremo anseio,
quase humano de beijos e abraços...
O sol, de luz e de calor mais cheio,
vibrou mais alto, nos azuis espaços!
Algas e espumas, sem querer, tecerem,
juntas, um berço de ideal cambraia
e o seu corpo de aurora receberam!
... Nunca o mar vira tão celeste flor...
Quando o seu corpo foi beijar a praia
a própria rocha estremeceu de amor!
NO VALE AMAZÔNICO
Maranhão Sobrinho (1879-1915)
Sobre o ocaso de bronze os altos castanheiros
Sobre o ocaso de bronze os altos castanheiros
perfilam-se, espanando o céu com as frondes;
brilha
um segmento de sol, ao cocar dos guerreiros
comparável, de um rubro atroz, que maravilha...
Espirando, grimpa, em abraços feiticeiros,
os troncos jaldes, verde, em haustos, a
baunilha
cheirosa; os barcos vão, de asas pardas,
veleiros,
sobre as águas a voar, como uma flecha à
quilha...
Ilhas de mururés, flutuantes, povoadas
de ninhos e canções descem do rio a esteira
pela corrente azul, de opala em flor,
levadas!
Surdem da canarana ariscas embiaras
enquanto, da corrente em sol, fulgindo, à
beira
se banham, de olhar verde, as flácidas
niaras...
SOBRINHO, Maranhão. Papéis velhos... roídos pela traça do Símbolo. Manaus: Editora Valer, 1999. p.43, 59, 85, 88, 107 e 130
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