Guilherme de Almeida (1890-1969)
A L.S.A.
Aquela carta cor-de-rosa, que me veio
da mão sentimental de uma desconhecida,
tornou-me tão feliz e deixou-me tão cheio
de um desejo tão bom de achar boa esta vida!
Chegou pelo Natal. Eu não sei o que existe
nas festas de Natal de tão simples e humano,
que tudo me enternece... E eu estava tão
triste!
Foi ela que Papai Noel me trouxe este ano.
Aquela carta! Quanta coisa ela contou-me!
que há uma mulher que pensa em mim nas horas
quietas
e que sabe de cor meus versos e meu nome...
Mas, ainda existe alguém que acredite nos
poetas?
Ainda existe quem sinta essa necessidade
De sofrer um pouquinho a dor dos outros?
Ainda
há quem ache que, enquanto houver lágrimas,
há de
haver poetas na terra – e a terra há de ser
linda?
Ainda há quem não hesite em ferir a mão
langue
para plantar um lírio entre cardos perversos?
E, ferida, regar com gotas do seu sangue
o pobre coração de um homem que faz
versos?...
Ignorada, distante mão, muito obrigado!
Tu me fizeste crer, suave e desconhecida,
numa coisa em que eu nunca havia acreditado:
– que este mundo ainda é bom e ainda é boa
esta vida!
ALMEIDA, Guilherme
de. Encantamento, Acaso, Você: seguidos dos haicais completos. Campinas:
Unicamp, 2002. p.138-139
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