terça-feira, 10 de dezembro de 2013

A ENGANOSA IMAGEM

Rogel Samuel


Para muita gente, o Brasil ainda está em uma situação difícil, em crise, ameaçado pela inflação.

Até gente muito ilustre, como um grande maestro nacional, hoje na Europa, que disse no seu blog que o país era “bonitinho, mas ordinário”. Escrevi um comentário meio desaforado na postagem, mas ele não (claro) aprovou.

Um dos problemas brasileiros é a falta de auto-estima, de orgulho, de patriotismo.

“Às vezes tenho a impressão de que o Brasil é um homem rico, bonito e forte, na flor da idade,  que porém não sabe falar, não sabe se expressar com consciência. Bonitinho mas ordinário”, disse o maestro.

O que se vê é o preconceito: “ Pelo contrário, meus interlocutores começam sempre com um “Oh!” de admiração por um país pujante, cujas taxas de crescimento fazem babar de inveja os europeus, e cujos presidentes, seja um operário transformado em estadista “cult” ou uma Margareth Tatcher da esquerda, são objetos de desejo de quem está acostumado com Berlusconis e que tais”.

Ou quando diz: “Certamente não teremos do que nos orgulhar se no futuro formos os campeões mundiais de consumo de geladeiras, ou o celeiro de deputados como Tiririca, representando nossa população em comissões de educação”.

O que acho é que as Universidades brasileiras foram muito prejudicadas, inclusive a UFRJ, onde trabalho e de onde me aposentei, não por falta de investimento apenas, mas porque os seus pesquisadores saem do país (como é o caso do maestro), abandonam seus projetos por falta de incentivos. Na época do regime militar, há pouco tempo, foram arrasadas. Não acredito nessa lista das 100 “melhores” universidades onde não estamos. Quantas são públicas e gratuitas? Não concordo com o maestro neste ponto, foi arrogante e pouco patriótico. Ele mesmo sabe das dificuldades de lidar com os péssimos políticos da elite paulista. O Brasil não é a China (uma ditadura), nem a Índia (um país de grande complexidade política). O Brasil é a segunda maior Democracia do Ocidente, tem uma elite corrupta e atrasada, uma grande imprensa péssima, mas esperem para ver o que este país pode fazer. Não se pode ler o Brasil pela Globo, pela Folha, etc. O Brasil não é nem bonitinho nem ordinário. Temos uma tradição cultural de que podemos nos orgulhar. Mais do que carnaval e samba, temos uma cultura que vem desde o Barroco etc. A ignorância é de desconhecer isso.

Até os generais da “revolução” tinha isso de bom. Tinham patriotismo. Coisa que os americanos têm, o culto pela bandeira.

Recentemente postei um livro no meu blog LIVROS ONLINE. Um livro antigo. Fora de moda.

Mas muito importante, muito bem escrito: “Afonso Celso: Porque Me Ufano do Meu País”.

Ridículo? Pode ser. Mas leia essas linhas e o sinta: “Consiste a minha primordial ambição em vos dar exemplos e conselhos que vos façam úteis à vossa família, à vossa nação e à vossa espécie, tornando-vos fortes, bons, felizes. Se de meus ensinamentos colherdes algum fruto, descansarei satisfeito de haver cumprido a minha missão.

“Entre esses ensinamentos, avulta o do patriotismo. Quero que consagreis sempre ilimitado amor à região onde nascestes, servindo-a com dedicação absoluta, destinando-lhe o melhor da vossa inteligência, os primores do vosso sentimento, o mais fecundo da vossa atividade — dispostos a quaisquer sacrifícios por ela, inclusive o da vida.

“Embora padeçais por causa da Pátria, cumpre que lhe voteis alto, firme, desinteressado afeto, o qual, longe de esmorecer, — aumente, quando desconhecido, injustamente aquilatado, ou ingratamente retribuído, e, jamais, em circunstância nenhuma, vacile, descreia, ou se entibie.

“Consiste a minha primordial ambição em vos dar exemplos e conselhos que vos façam úteis à vossa família, à vossa nação e à vossa espécie, tornando-vos fortes, bons, felizes. Se de meus ensinamentos colherdes algum fruto, descançarei satisfeito de haver cumprido a minha missão”.

Assim disse o Conde de Afonso Celso.

O livro termina assim: “É verdade que a grandeza não deriva da simples posse de dons valiosos, mas do seu sábio aproveitamento. Porque, porém, deixaremos de pôr em ação os nossos prodigiosos recursos? Quando não o quiséssemos, seríamos forçados a isso pela ordem natural das cousas, à lei infalível do desenvolvimento das forças e das necessidades. Viveremos, cresceremos, prosperaremos. A educação, o aperfeiçoamento, hão de vir. Somos ainda uma aurora. Chegaremos necessariamente ao brilho e ao calor do meio dia. Ao terminar o século XIX, já constituímos a 2a. potência do Novo Mundo, a 1a. da América do Sul, a 1a. em extensão e a 3a. em população da raça latina. Seremos a 2ª. ou a 1ª. do orbe, quando a hegemonia se deslocar da Europa para a América, o que fatalmente sucederá. Encarnaremos então as qualidades, guardaremos as tradições, representaremos os serviços dos latinos no trabalho universal. Se tais qualidades, tradições e serviços são eminentes (e quem ousará negá-lo?) eminente será a nossa missão. Não temos o direito de desanimar nunca. Assiste-nos o dever de confiar sempre. Desanimar no Brasil equivale a uma injustiça, a uma ingratidão; é um crime. Cumpre que a esperança se torne entre nós, não uma virtude, mas estrita obrigação cívica. Desanimar, porque? quando nada nos falta que não possamos conseguir? Penosíssima embora a situação atual, é incomparavelmente mais auspiciosa que a da Grécia, a da Itália, a de Portugal, a da França mesmo. Quão menos grave que a dos Estados europeus! Neste, a população emigra; naquele decresce cada dia. Vive condenada em todos a não largar as armas, minada pela miséria, dividida por ódios implacáveis, explorada pelo argentarismo, ameaçada pelos anarquistas. Apesar de tudo, lá não desanimam. Havemos nós de desanimar?! Petrópolis, 8 de Setembro de 1900”.

> Rogel Samuel é poeta e escritor nascido no Amazonas. É professor aposentado da UFRJ. Autor, entre outros, de: Manual de Teoria Literária; O Amante das Amazonas; e Teatro Amazonas.

Um comentário:

ROGEL DE SOUZA SAMUEL disse...

Leio seu blog todos os dias...