segunda-feira, 5 de novembro de 2012

NUVENS DO ENTARDECER

Hermann Hesse
O que um poeta imagina e burila,
e anota num livrinho, em verso e rima,
a alguns pode sem nexo parecer;
mas Deus entende e acata com prazer.

Também ele, que cuida do universo,
de vez em vez é poeta também:
quando repicam os sinos da tarde,
como em sonho, toma nas mãos o ar
e, para a festa do final do dia,
faz lindas nuvens de ouro tênues, muitas,
a debruar o perfil das montanhas
– espuma carmesim na pompa do crepúsculo.
Uma e outra, que lhe saem melhores,
por algum tempo ele conduz e guarda,
a fim de que, feitas de quase nada,
pairem no céu em contente sorrir.
A que parece um vão jogo de rima
logo tem algo de magia e imã
a atrair a alma humana
em nostalgia e oração a Deus.
Então a rir o Criador desperta
do breve sonho, a brincadeira esfria,
e da fresca distância desabrocha
plena de paz a noite.
Assim é que da pura mão de Deus,
mesmo de brincadeira, toda imagem
brota perfeita, formosa e feliz
como poeta algum imaginou jamais.
Possa o teu canto terrenal valer
como um acorde musical de sinos,
e que das mãos de Deus, cheias de luz,
brotem nuvens lá em cima.



HESSE, Hermann. Andares: antologia poética (trad. Geir Campos). Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1976.

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Um amigo uma vez me dissera: “Hesse é um dos únicos autores que qualquer livro que você ‘pegar’ é bom”. Comecei por Lobo da Estepe, depois Sidarta... e quanto mais lia mais ficava fascinado, impactado. Meu amigo estava coberto de razão. Desde então Hesse tem sido um amigo inseparável. Por minhas vez, não custa nada deixar uma sugestão aos amigos do Alma Acreana.

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