Isaac Melo
Em 1930, pela Imprensa Nacional, do Rio de
Janeiro, o então juiz municipal do 1o termo da comarca de Cruzeiro
do Sul (AC), José Moreira Brandão Castello Branco Sobrinho, publicava o livro O
JURUÁ FEDERAL (Território do Acre). Livro interessantíssimo do ponto de vista histórico
da região do Juruá. Nessa obra há, dentre as 14 estampas, uma que me chamou
muito a atenção. É a fotografia de uma índia, que segundo o autor, era a última
sobrevivente da tribo do Náuas. Mariruni era seu nome indígena. Mariana, o cristão.
A sapatilha, a saia e a blusa de mangas longas nos permitem intuir o anseio do
colonizador de “civilizar” os povos nativos. Civilizar, é claro, para servir de
mão de obra para suas empresas desbravadoras. Assim, os que não foram “civilizados”,
foram mortos, boa parte fisicamente, outra, culturalmente.
Os Náuas ou capanáuas (mati-púrus) era uma tribo
guerreira. Habitavam o estirão (longo trecho de rio a estirar-se, prolongar-se
sem curva) conhecido como Estirão do Náuas, nas proximidades do que hodiernamente é Cruzeiro do
Sul.
Castello Branco narra uma cena curiosa de
como fora uma das primeiras tentativas do colonizador com os Náuas. Diz ele que
em princípios de 1884, o pernambucano Antônio Marques de Menezes, vulgo
“Pernambuco”, acompanhado de Antônio Torres, Pedro Motta, José Vieira, Manoel
Menezes, Jacintho de tal, e Joaquim Nascimento, aportaram ao estirão dos Náuas,
donde voltaram, sem demora, por terem sido atacados pelos Nauás, que lhe deram
uma surra. Já em 1867 os Náuas haviam feito retroceder a expedição do cientista
inglês William Chandless.
Mas o destino dos Náuas seria marcado um ano
depois por um grupo de italianos. Henrique Cani, Antonio Brozzo, Domingos
Stulzer, que, em 1885, haviam aportado a Manaus, e a convite de seus
compatriotas Antonio Marcilio e Luiz Paschoal, sócios e proprietários do
seringal New York, no Baixo Juruá, vieram para este aludido seringal, seguindo
depois para o Alto Juruá, em viagem de exploração, trazendo consigo dois
cearenses, que exploraram em junho seguinte, o pedaço do Juruá que ia do
Estirão dos Náuas à embocadura do Juruá-mirim. Esses excursionistas, segundo
Castello Branco, foram os primeiros que exploraram o rio, com o fim de o
povoarem.
Ali, nas proximidades do rio Moa, onde hoje
se acha implantada a cidade de Cruzeiro do Sul, os italianos encontraram “extensos
bananais” e “grande número de índios”. “No meio do estirão dos Náuas”, diz o
autor, “justamente no local em que, hoje, se encontra o barracão do Seringal Burityzal,
foram os viajores à terra, deparando com uma enorme maloca dos silvícolas
chamados “Náuas”, os quais deram nome ao dito estirão, e após uma certa demora,
necessária, apenas, para oferecerem aos aborígenes alguns brinquedos e outros
objetos que lhes despertassem a curiosidade...”. E foi assim que os italianos
exploraram a parte do rio que ia do seringal Treze de Maio ao Paraná dos
Mouras, e os brasileiros de Tatajuba ao Juruá-mirim.
Os Náuas, conforme ainda narra Castello
Branco, foram praticamente dizimados por um “catarrão” (epidemia de gripe). Os sobreviventes
retiraram-se para muito longe, pois intuiam que essa doença vinha dos brancos. Em
1900, eles reapareceram no Rio Bregueço ou Sungaru, donde sairam em 1902 ou
1903, devido à perseguição, indo refugiar-se em terras da república vizinha
(Peru), pela altura do rio Tapiche (nome da época, não sei dizer a que rio ou
igarapé equivale hoje). Depois, nunca mais soube-se ao certo dos Náuas, o povo
guerreiro, sucumbido pela sanha dos brancos: civilizados e bons cristãos.
Referência
SOBRINHO, José Moreira Brandão Castello Branco. O Juruá Federal: Território do Acre. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1930.
NOTA
Referência
SOBRINHO, José Moreira Brandão Castello Branco. O Juruá Federal: Território do Acre. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1930.
NOTA
Em 2002, o Jornal do Brasil
noticiava que “a Fundação Nacional do Índio (Funai) estava
na expectativa de confirmar uma das descobertas antropológicas e étnicas mais
importantes no país: a de que a tribo Naua, considerada extinta há mais de 70
anos, poderia ter sido localizada dentro do Parque Nacional do Divisor”. Dois
anos antes, (veja aqui)
cerca de 250 índios ressurgiram da floresta dizendo ser da tribo
Naua, e exigiam a criação de um parque nacional de suas terras. Por sua
vez, o Wikipédia (nem
sempre confiável) com informações do Conselho Missionário Indigenista diz haver
300 indivíduos mestiços remanescentes da tribo dos Náuas que vivem em Mâncio
Lima.
* Quanto à grafia encontrei Náuas, Nawas e
Naua.
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