terça-feira, 16 de abril de 2013

HEGEL E A DIALÉTICA

Profa. Inês Lacerda Araújo 
Filosofia de todo dia 


Hegel é considerado um dos filósofos mais "difíceis" de toda a história da filosofia, como disse em postagem anterior. Ele não faz concessões, não há nenhuma tentativa de ser claro (como Descartes preconizava) e nem de dialogar ou de ensinar (como Sócrates e Platão).

Pode-se dizer, inclusive, que Hegel já não é mais o filósofo preferido, como há algumas décadas, para ser o intérprete de toda a história da filosofia. Lia-se Hegel, em especial o jovem Hegel, a fim de melhor compreender Marx. Resultado: não se compreendia nem um nem outro.

Vejamos algumas facetas do pensamento de Hegel, o que vale a pena resgatar para a história da filosofia.

Importância da história: todas as contribuições culturais, como arte, filosofia e religião, são o estofo de que a razão se vale para caminhar e, ao mesmo tempo, superar ideias e conceitos. Desde as experiências com o material sensível, até o mundo inteligível de conceitos cada vez mais precisos, o pensamento se realiza. Para se realizar, ele precisa do discurso, da linguagem, que possibilitam determinações, isto é, dizer o que são as coisas e como elas são. As significações.

Uma nova ontologia: como e o que as coisas são? Impossível determiná-las sem, ao mesmo tempo, determinar o que elas não são. Ser e não ser se determinam reciprocamente. O senso comum não percebe que todo ser é o que é, por não ser outro. É assim que todos os seres se transformam, assim se modificam as ideias e os projetos. Essas passagens ou mudanças constituem o vir a ser, o devir. Esse movimento de conservação do ser, de negação e de ultrapassagem é o que Hegel chama de dialética.

A natureza, os seres e a história vivem desse movimento. Esse movimento é direcional, progressivo, tem em vista um fim (teleológico). As realizações das obras humanas aprimoram certas ideias, certos ideais. O mais precioso é o ideal da liberdade, da conciliação da ideia de sociedade com a plena realização do racional.Um otimismo, portanto. Para Hegel, há luz no fim do túnel e essa luz é plena, é o absoluto, é a conciliação final de todas as dificuldades, de todas as contradições.

O idealismo objetivo: ideias e conceitos não abstração vazia. Eles se concretizam em autores, livros, no variado discurso humano. Mas não de forma solta, há uma lógica interna, uma lógica com três momentos, todos eles necessários (afirmação, negação e síntese). Entre pensamento e ser não há um abismo. Ser externo ao pensamento e ser pensado se conciliam. Quando alguém emite um juízo, afirma que algo é assim, mas pode também corrigir, confrontar ideia e realidade. Por isso o idealismo é objetivo. É com relação à realidade objetiva (desaparece a dificuldade que Kant tinha com o ser em si, para ele inatingível) que ideias, conceitos e o pensamento se formam. Não há um vazio entre a representação e o representado.

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Perguntas e dúvidas surgem. Ao mesmo tempo em que Hegel enfatizou a história, ele a fechou em um movimento ascendente, com etapas obrigatórias e com um fim/finalidade. O que garante que haverá essa progressão em termos de liberdade e de realização?

Apenas a força ou fraqueza humana, as quais, aliás, nada garantem.

A lógica do devir precisa do jogo entre ser e nada. E se desse jogo nada surgir? Ou se ele surpreender?

Em nome da liberdade e do ideal a história tem sido, pelo contrário, de luta, transgressão, anomias.

Se a lógica dialética fosse inevitável, bastaria embarcar nela e nos deixar levar. Ora, isso anularia a propalada liberdade. Logo, a concepção de dialética hegeliana.


* INÊS LACERDA ARAÚJO - filósofa, escritora e professora aposentada da UFPR e PUCPR.

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