terça-feira, 29 de dezembro de 2015

NÃO DESPERDICEM UM SÓ PENSAMENTO

Bertolt Brecht (1898-1956)


1

Não desperdicem um só pensamento
Com o que não pode mudar!
Não levantem um dedo
Para o que não pode ser melhorado!
Com o que não pode ser salvo
Não vertam uma lágrima! Mas
O que existe distribuam aos famintos
Façam realizar-se o possível e esmaguem
Esmaguem o patife egoísta que lhes atrapalha os movimentos
Quando retiram do poço seu irmão, com as cordas que existem em abundância.
Não desperdicem um só pensamento com o que não muda!
Mas retirem toda a humanidade sofredora do poço
Com as cordas que existem em abundância!

2

Que triunfo significa ser útil!
Mesmo o alpinista sem amarras, que nada prometeu a ninguém,
somente a si mesmo
Alegra-se ao alcançar o topo e triunfar
Porque sua força lhe foi útil ali, e portanto também o seria
Em outro lugar. E depois dele vêm os homens
Arrastando seus instrumentos e suas medidas ao pico agora escalável
Instrumentos que avaliam o tempo para os camponeses e para os aviões.

3

Aquele sentimento de participação e triunfo
De que somos tomados ante as imagens da revolta no encouraçado Potemkin
No instante em que os marinheiros jogam seus algozes na água
É o mesmo sentimento de participação e triunfo
Ante as imagens que nos mostram o primeiro voo sobre o Pólo Sul.

Eu presenciei como
Mesmo os exploradores foram tomados por aquele sentimento
Diante da ação dos marinheiros revolucionários: assim
Até mesmo a escória participou
Da irresistível sedução do Possível, e das severas alegrias da Lógica.

Assim como os técnicos desejam por fim dirigir na velocidade máxima
O carro sempre aperfeiçoado e construído com tamanho esforço
Para dele extrair tudo o que possui, e o camponês deseja
Retalhar a terra com o arado novo, assim como os construtores de ponte
Querem largar a draga gigante sobre o cascalho do rio
Também nós desejamos dirigir ao máximo e levar ao fim
A obra de aperfeiçoamento desde planeta 
Para toda a humanidade vivente. 


BRECHT, Bertolt. Poemas 1913-1956. Seleção e tradução de Paulo César de Souza. São Paulo: Ed. 34, 2000. p.89-90

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