quinta-feira, 1 de maio de 2014

OS SEMEADORES

Machado de Assis (1839-1908)

...Eis aí saiu o que semeia a semear...
Mt. 13, 3


Vós os que hoje colheis, por esses campos largos,
O doce fruto e a flor,
Acaso esquecereis os ásperos e amargos 
Tempos do semeador? 

Rude era o chão; agreste e longo aquele dia;
Contudo, esses heróis
Souberam resistir na afanosa porfia 
Aos temporais e aos sóis.

Poucos; mas a vontade os poucos multiplica, 
E a fé, e as orações 
Fizeram transformar a terra pobre em rica 
E os centos em milhões. 

Nem somente o labor, mas o perigo, a fome, 
O frio, a descalcez, 
O morrer cada dia uma morte sem nome, 
O morrê-la, talvez, 

Entre bárbaras mãos, como se fora crime, 
Como se fora réu 
Quem lhe ensinara aquela ação pura e sublime 
De as levantar ao céu! 

Ó Paulos do sertão! Que dia e que batalha! 
Venceste-a; e podeis 
Entre as dobras dormir da secular mortalha;
Vivereis, vivereis!


ASSIS, Machado de. Poesias Completas. Rio de Janeiro: W. M. Jackson Inc. Editores, 1962. p.330-331

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