Humberto de Campos (1886-1934)
Na furna áspera e fria, onde, à noite, uivam
feras,
Aos doutores do mundo abrindo o coração,
Ensina o seu saber, com palavras severas,
Nos confins do deserto, entre eremitas, João.
– “Monge, – diz-lhe um doutor, – que
recompensa esperas
Transmitindo, tão franco, a ciência a teu
irmão?
Guarda, como um tesouro, as verdades
austeras;
Não disperses teu verbo. O teu verbo é o teu
pão”.
O eremita sorri e, em vez de responder:
– “A candeia sem luz, traze-a, que é noite,
filho;
Nesta, que já acendi, vem a tua acender”.
A candeia acendeu-se, e ficou a brilhar.
E aquela que a acendeu continuou com o seu
brilho.
E o eremita, no chão, pôs-se, de novo, a
orar...
CAMPOS, Humberto de.
Poesias Completas. São Paulo: Opus, 1983. p.391
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